Vai ressuscitar?
por A-24, em 06.04.13
Se a teologia da pobreza seria a primeira razão para me afastar do catolicismo, a segunda seria aquilo que eu chamo "o catolicismo de dicionário na mão".Em questões de doutrina, a Igreja é extremamente cuidadosa na utilização das palavras, e o Catecismo da Igreja Católica é um exemplo disso. Cada palavra tem um e apenas um significado, um significado único, e no Catecismo cada palavra é utilizada com toda a sua propriedade e no lugar próprio.
Não é assim quando a discussão desce o nível do povo. Aí cada um atribui a cada palavra um significado próprio e quase pessoal (talvez uma consequência do personalismo católico) e as discussões acabam todas a discutir o significado das palavras, cada um de dicionário na mão (talvez uma consequência do carácter feminino do catolicismo popular e da sua tendência para levar a discussão para as questões acessórias, esquecendo as principais).
Aconteceu assim quando o Papa Francisco pronunciou a célebre frase "Eu gostaria tanto de ter uma Igreja pobre e para os pobres". Não faltou logo quem se apressasse a esclarecer que, quando o Papa disse "pobres" ele não queria dizer pobres, tal como geralmente os entendemos, e que constitui p verdadeiro significado da palavra. Não, ele referia-se a "pobres de coração".
É caso para perguntar: mas se ele queria dizer "pobres de coração" em lugar de "pobres" porque é que não utilizou a expressão "pobres de coração" em lugar de "pobres"? O argumento cheira claramente a batota. Nos países de cultura protestante, os povos de cultura católica têm infelizmente esta reputação que eu julgo, em parte, merecida, que é a de não serem fiáveis, de serem batoteiros.
Aquilo que o Papa disse exprime claramente uma "opção preferencial pelos pobres" e isto sugere a teologia da libertação, na realidade, este é o seu lema. Se ele lhe vai dar realidade ou não, se ele lhe vai dar uma realidade extrema ou apenas moderada, é outra questão. Certo é que a teologia da libertação foi condenada pela Igreja Católica nos anos noventa, era o Cardeal Ratzinger Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.
Vai ressuscitar? Pelas palavras do Papa, eu diria que sim. Vamos ter um catolicismo latino-americano, terceiro-mundista, marxizante e populista, e voltado, em primeiro lugar, para a América Latina. Aliás, as duas primeiras viagens do Papa já estão anunciadas - Brasil e Argentina.
Pedro Arroja no Portugal Contemporâneo