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A-24

Entrevista ao sempre interessante e cáustico José Cid

por A-24, em 30.11.14
Sol


10 000 Anos Depois Entre Vénus e Marte é considerado pela revista americana Billboard um dos cem melhores discos de rock sinfónico e ajudou José Cid a recuperar a atenção do público nos últimos tempos. Aos 72 anos, o músico diz que canta melhor do que Roberto Carlos, acusa Tony Carreira de plagiador e repudia o programa apresentado por Teresa Guilherme. Monárquico convicto, fala ainda do partido recém criado Nós, Cidadãos e defende que D. Duarte daria um dos melhores reis da história de Portugal. 
"Os melhores sistemas políticos mundiais são as monarquias do Norte da Europa, onde a corrupção é quase nula, a cultura, a saúde e a educação são importantes"

No dia 15 vai revisitar, no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, o disco 10 000 Anos Depois Entre Vénus e Marte, de 1978. É o seu álbum mais importante?
É uma obra irrepetível, embora não o considere o meu melhor álbum de rock sinfónico. O Vida (Sons do Quotidiano) é o melhor e também vai ser tocado no Coliseu. Mas, instrumentalmente, o 10 000 Anos é muito complexo e, por isso, vou ter mais um elemento na banda, o meu sobrinho Gonçalo Tavares, que vai tocar teclas. Em vez de dois teclistas, vão ser três, com a vantagem ainda de que ele tem os instrumentos exactos do rock sinfónico que eu não tinha quando o gravei. 

Nos últimos anos o disco tem sido acarinhado, mas em 1978 não teve aceitação.
Aqui em Portugal nenhuma. Não vendeu. Mas, às vezes, ainda me aparecem com o disco original para autografar. 

Por que não vendeu?
Era um álbum muito à frente e as pessoas queriam ouvir-me em coisas comerciais como 'No dia em que o rei faz anos', 'A minha música', 'A cabana', 'Addio adieu auf wiedersehen goodbye', '20 anos'... 

Tinha noção do risco quando o compôs?
A minha obra é muito camaleónica, não se fixa por um género. Até fado gravei, em 1988, e foi um êxito. Vendi 40 mil vinis numa altura em que ninguém vendia 300. Quanto ao 10 000 Anos aquilo estava escrito e tinha que ser feito. Escrevi o álbum pouco a pouco, já estava no Quarteto 1111, mas achei que o grupo era para outro tipo de rock e guardei este álbum para mim. Agora sinto uma responsabilidade acrescida porque, no final do milénio, depois de o disco ser editado nos Estados Unidos, a crítica americana pegou nele e o disco ganhou uma dimensão mundial. Tornou-se um álbum de culto, com a Billboard a nomeá-lo como um dos 100 melhores álbuns de sempre. O Blitz também o colocou como o segundo melhor álbum nacional de todos os tempos, atrás de Cantigas de Maio, do Zeca. Recentemente foi a Sputnik Music a nomeá-lo como um dos cinco melhores álbuns de rock sinfónico. Portanto, o rock português tem aquilo que é apontado pela crítica mundial como um dos melhores álbuns mundiais de sempre. A França não tem, a Alemanha não tem, a Espanha muito menos. 

Este reconhecimento começou há dez anos, quando a Art Sublime o editou nos EUA. Houve ainda uma edição japonesa?
Os japoneses também estavam na jogada, mas optei pelos americanos e nitidamente foi o melhor que fiz. Mas o álbum está já de tal maneira relançado pelo mundo inteiro que para aí há dois meses recebi uma chamada de um sul-americano a dizer-me que há uma edição em vinil pirata do 10 000 Anos no Peru. De tal maneira pirata, que meteram o Vida (Sons do Quotidiano). Queriam vir entregar-me direitos de autor, mas não aceito dinheiro ilegal. 

Vai gravar o concerto e fazer um DVD para reforçar o projecto no mercado internacional? 
Sim, vou tentar finalmente fazer o DVD. É a altura para o fazer: amadurecemos o concerto e já que o álbum está tão bem cotado quero tentar fazer grandes concertos mundiais. No Rock in Rio Lisboa não, porque para eles eu sou mais rio do que rock. Em Portugal, há um lobby muito grande contra o José Cid porque tenho público. É impensável que tenha um álbum nomeado entre os melhores do mundo e nunca tenha ido cantar ao Rock in Rio, quando todo o gato sapato lá vai. 

Alguma vez abordou a Roberta Medina?
Já e não houve resposta. À volta dela há o tal lobby. E depois tinha de ser agressivo, tinha de lhe explicar que em Portugal sou o equivalente ao Roberto Carlos no Brasil. A diferença é que canto muito melhor do que o Roberto Carlos. 

Sente-se injustiçado pelo Rock in Rio?
Um palco é um palco e aquilo é um grande concerto. Alguns colegas meus completamente estilizados e decrépitos vão, porque não ir lá tocar também? É uma injustiça, mas o facto de não me levarem significa que têm uma grande dor de cotovelo de mim. E isso diverte-me. 

Enquanto não vai, continua a preparar o seu próximo disco de rock sinfónico, projecto que já se fala há anos?
Sim, estou a escrever um quarto álbum, e último, de rock sinfónico que se chama Vozes do Além. Poeticamente parte de uma estética mais à frente, com poesia de Natália Correia e Sophia de Mello Breyner ligado com algumas ideias poéticas minhas. Mas o próximo trabalho que vou lançar não é esse, mas sim Menino Prodígio. 

É sobre o quê?
É a minha história. Quando era pequenino tocava piano, cantava e as pessoas chamavam-me menino prodígio. É um álbum muito roqueiro, mas com textos, com opinião política e até objecção de consciência na própria poesia. 

Porque os tempos actuais o exigem? 
A publicidade do álbum vai ser assim: sem se aperceber ou querer, Portugal teve, nos anos 70, um dos maiores rockers do mundo. Quarenta anos depois, o menino prodígio vem provar isso mesmo. É uma bomba, tem tudo o que as minhas outras músicas têm, mais a originalidade de ser actual. 

Essa actualidade tem a ver com as suas convicções políticas e a recente criação do partido Nós, Cidadãos? 
Já fiz o hino e digo que é uma boa ideia, mas ainda não entrei definitivamente porque estou à espera do debate de ideias. Não assino cheques em branco. Acho que o Nós, Cidadãos tem de ser uma mesa redonda, de 12 pessoas, entre elas o D. Duarte, um homem interessantíssimo, que daria um rei melhor do que 90% dos reis que tivemos. Além de culto, tem uma visão estratosférica sobre o país. Se ele der a cara pelo partido, entro para se tomarem posições muito concretas. Uma delas é o voto obrigatório. As pessoas deviam sentir a votação como uma obrigação. Quem não vota deve ser multado pesadamente. 

Se não sentem, o Estado obriga?
Basta olhar para as percentagens de abstenção das eleições. Não é preciso uma lei se as pessoas sentirem o voto como uma obrigação cívica. É como nas rádios, não é preciso uma lei que obrigue a passar música portuguesa se os locutores se sentirem na obrigação de passar porque são portugueses. O voto é a mesma coisa. O Nós, Cidadãos não é um projecto à esquerda, nem à direita, nem ao centro. É estar por cima para idealizar e por baixo para proteger os mais necessitados.

É assumidamente monárquico. É o sistema que defende?
Os melhores sistemas políticos mundiais são as monarquias do Norte da Europa, onde a corrupção é quase nula, a cultura, a saúde e a educação são importantes. No fundo, as coisas que são importantes para as pessoas comuns. Pagam impostos, mas têm tudo facilitado. Aqui não, pagam-se impostos e ainda se é mal tratado. Neste país, politicamente não se consegue concretizar nada porque o sistema não presta, o 25 de Abril é um projecto adiado. Só aumentou consideravelmente a pobreza, destruiu a classe média e não soube controlar a classe rica, que pode criar empregos ou fazer offshores. Mas nem isso controla. Para que serve o 25 de Abril? Para termos liberdade para falar? Então é o que estou a fazer. O Presidente da República viu o país ir-se por aí abaixo, sabia o que estava a acontecer, mas não travou. Há oito anos, foi oferecido pelo Xanana [Gusmão], a custo zero, o pagamento da dívida externa de Portugal. O Sócrates não quis, este [Passos Coelho] também não e o PR está a par desta história. Timor está forrado de dinheiro por causa do petróleo e quis ajudar, mas nós não aceitámos a ajuda timorense para favorecer os interesses da Europa, da banca e dos políticos ligados ao processo da Europa que, se calhar, também recebem dinheiro por baixo da mesa. Qual é o resultado? Estamos nós, os nossos filhos, os nossos netos a sofrer consequências dramáticas por não nos ligarmos ao único país no planeta que gosta de nós. Aqui era preciso fazer como em Timor. 


Como?
Os timorenses contrataram uma polícia fiscal australiana e a ministra da Justiça e do Trabalho já foram presas. E Timor só tem dez anos de democracia. Aqui não, a classe rica age de forma escandalosa. Acredito que muita dela é honesta e trabalha para o bem do país, mas depois há as excepções que temos visto, algumas delas associadas ao poder político, que fabricam o dinheiro em Portugal e depois metem-no lá fora, sem impostos, com fugas. É por isso que digo que o 25 de Abril não é um projecto concretizado. Mas o problema vem de trás. Os últimos cem anos da nossa história são vergonhosos. Mataram um rei genial, o rei D. Carlos, um homem cultíssimo com prestigio a nível mundial, e impuseram uma República, que até já teve duas ditaduras - uma salazarista e outra marcelista. E mais recentemente teve outra, legalizada pelo voto do povo, em que o primeiro-ministro se achou no direito de fazer tudo o que queria e lhe apetecia porque tinha a maioria absoluta. Devia ter sido demitido. 

Se entrar para o Nós, Cidadãos vê-se como candidato?
Ministro da Cultura era capaz de ser, até porque tenho muito mais perfil do que o secretário de Estado que lá está. Como acho, por exemplo, que se o António Costa ganhar e puser o Carlos do Carmo como ministro da Cultura faz muitíssimo bem. 

O pelouro da Cultura deve estar entregue a um artista? 
Não se percebe como é que o Partido Socialista está anos e anos no poder e não tem uma pessoa como o Manuel Alegre na Cultura. Um homem tão brilhante a escrever. Há uma grande diferença entre pessoas cultas, que debitam frases finas, e pessoas criativas. O maestro Vitorino de Almeida é outro homem culto e criativo. 

Herdou convicções políticas de família?
Não, até era republicano ao princípio e depois percebi que os sistemas republicanos falham completamente. A minha família tinha um lado monárquico e outro republicano. O meu bisavô Albano Coutinho, um homem extraordinário, era maçom, mas rapidamente percebeu o que a República portuguesa queria fazer e saiu da maçonaria. Depois tenho um lado monárquico, com alguma ascendência. 

Aos 72 anos ainda se sente com energia para lutar pelos seus ideais? 
A idade já pesa, estou todo podre, mas a voz contínua impecável. A minha vida é escrever canções e agora que estou um pouco na recta final da minha carreira se puder armazenar alguns álbuns acho uma boa ideia. Sinto que continuo criativo e que tenho voz. Por isso, em Janeiro, lanço Menino Prodígio e durante o próximo ano vou gravar Vozes do Além. 

Está a armazenar projectos? Tem medo da velhice?
Já estou nela. Estou só a gerir a minha decadência. Além de Menino Prodígio e Vozes do Além já tenho praticamente acabado um álbum que se vai chamar Fados Fandangos, Chulas e Malhões, e tenho outros projectos que não posso dizer já para não me copiarem a ideia. 

Foi muito plagiado para ter esse medo?
Não, até porque vocalmente é muito complicado cantar José Cid. Mas é uma ideia estética muito concreta e seria dar de mão beijada uma ideia muito minha. 

Quando descobriu que podia cantar?
Comecei a cantar num grupo de jazz em Coimbra e, com 14 anos, criei com alguns amigos Os Babies, uma banda de covers que animava as festas de garagem. Primeiro tocava piano, mas um dia o vocalista não pôde cantar e substituiu-o. Aos poucos fui percebendo que podia cantar muita coisa. 

Teve aulas?
Não, tudo sozinho. Nunca tive uma aula na vida. 

Nem de piano?
Não, completamente autodidacta. 

Mas ganhou um concurso ainda muito novo…
Ganhei o primeiro prémio de canto coral no colégio de jesuítas em que andei em Santo Tirso. 

Era um colégio interno?
Sim, a casa dos meus pais ficava a 300 quilómetros. Nessa altura levava-se oito horas para lá chegar. Era quase clausura total. 

Com uma educação muito católica?
Sim, foi uma seca. Fiquei altamente traumatizado. Durante quatro anos tinha que ir todos os dias, às 8h da manhã, à missa. Isso é traumatizante para qualquer criança. Quando sai de lá passei a ir só ao domingo, mas chegava sempre atrasado e ficava no átrio à espera que as minhas amigas saíssem da missa. 

Hoje permanece desligado da Igreja?
Hoje sou capaz de parar para rezar, mas tenho outro Deus, mais antigo: o Endovélico, que é o deus que os portugueses deviam seguir. Antes de os romanos chegarem, o Endovélico era o nosso deus, mas foi silenciado pelo cristianismo. Ainda há um único altar endovélico em Portugal, no Monte da Lua, em Sintra. Só quem sabe é que lá vai e eu vou lá rezar de vez em quando. Aí e noutro sítio fantástico, que ainda tem resquícios do Endovélico, em São João da Pesqueira, na margem Sul do Douro, num promontório que se chama São Salvador do Mundo. Até escrevi uma música sobre este sítio. Não tenho nada contra Fátima, embora ache que aquilo seja um supermercado do rosário, mas São Salvador do Mundo é que devia ser o nosso Stonehenge. Se foi o colégio jesuíta que me fez procurar este outro Deus já não sei, mas fiquei traumatizado pelo isolamento. Também porque, naquela altura, tinha uma grande paixão pela minha preceptora francesa, a Monique, com quem aliás ainda hoje falo. Ela tem agora quase 90 anos e continua a ser uma mulher lindíssima. 

Como o marcou esta preceptora?
Foi ela que percebeu que era um miúdo que gostava de música, de letras, de artes. Que não era o miúdo que os meus pais queriam formar. Na Chamusca, onde cresci, a minha família era de uma classe social e económica bastante elevada, por isso não queriam que cantasse, mas sim que fosse advogado. 

Se tinha uma preceptora porque foi parar a um colégio interno?
Ela era uma mulher lindíssima, que despertou grandes paixões no Ribatejo. Os meus pais foram-na depositar a Paris porque ela e o meu primo Fernando Cid tinham uma grande paixão, uma espécie de Romeu e Julieta da época. Ela nunca mais voltou a Portugal e foi nessa altura que fui internado em Santo Tirso. Sofri imenso, os padres diziam que me fartava de chorar e chamar pela Monique. 

São as memórias de infância que guarda?
Também não me esqueço das brincadeiras com os meninos da minha rua. Era muito engraçado porque sabia que sempre que atirava um para dentro da piscina os meus pais davam-lhe roupa. Então fazia de propósito. Atirava-os e depois gritava: 'Mãe, o não sei quantos caiu para dentro da piscina. Tem de levar roupa e sapatos'. Era isso e as jangadas de canas que construíamos para andar nas cheias. A parte de trás do nosso jardim dava para uma horta a 500 metros do Tejo e, quando chovia, aquilo ficava tudo inundado e nós andávamos nas cheias de jangada. Uma vez íamos morrendo, foi preciso os bombeiros irem-nos salvar de barco. 

Ainda se dá com os amigos de infância?
A grande maioria sim, mas alguns deixei porque são meio insuportáveis, armados em snobes. Pessoas muito finas, todos engravatados, uma chatice.

E os irmãos não participavam nas brincadeiras? 
Não tinha irmãos, só duas irmãs, dez anos mais velhas. Eram como segundas mães. Vim muito mais tarde porque os meus pais sempre quiserem ter um rapaz. 

Um rapaz que lhes deu algumas dores de cabeça… 
Nunca quis estudar Direito, fui para lá empurrado pelos meus pais. Não tinha jeito nenhum, nem gostava daquilo. Fiz duas cadeiras em quatro anos. Só queria saber de desporto e de música. Eram os meus projectos de vida e isso provocou, naturalmente, muita guerra em casa. Mas desisti do curso de Direito, vim para Lisboa para o curso de Educação Física e continuei na música. 

É já em Lisboa que cria o Quarteto 1111.
Sim. Um dos meus colegas no Instituto Nacional de Educação Física era irmão do Michel que tocava no Conjunto Mistério. Juntei-me ao grupo e, pouco tempo depois, mudámos o nome para Quarteto 1111. Era o número de telefone da sala de ensaios, o que facilitava o contacto com as fãs. 

Tinham muitas groupies atrás de vocês?
Sempre odiei groupies. São ninfomaníacas deslumbradas que não ouvem música. Nunca namorei com uma fã. 
Com os 1111, já com Tozé Brito na formação, criaram uma banda paralela: os Green Windows. Porquê? 
Censura. Tenho 28 canções censuradas pelo antigo regime. Começámos a contar os tostões e pensámos numa forma de ganhar o mercado. Surgiu então a ideia de fazer uma banda comercial, com vozes femininas, com as nossas companheiras. A Maria Armanda, a minha segunda mulher, cantava connosco. 'No dia em que o rei fez anos' e '20 Anos' são dessa altura.

Apesar desse sucesso, anos depois a parte comercial já não corre tão bem. 
Depois do 25 de Abril, os estigmas do grupo Ary dos Santos, da pseudo-esquerda festivaleira, tudo isso. José Cid era o perigo porque era o homem que tinha êxito e achavam que estava contra eles. Muito mais tarde fiquei muito amigo do Paulo de Carvalho, do Carlos Mendes e do Carlos do Carmo. O Carlos do Carmo diz que tenho uma língua viperina e eu respondo-lhe sempre: 'eu não contesto, constato'. 

Na década de 1980, quando se dá o chamado boom do rock português, também é posto de lado. 
Logo. Não convinha ter um rapaz como eu, que cantava ao vivo muito mais do que aqueles roqueirinhos todos. Sou de outros campeonatos vocais. Era comparar a obra-prima do mestre com a prima do mestre-de-obras. E não se pode comparar. 

Revoltava-o?
Sorri e esperei pelo meu tempo, tive essa paciência. Sou muito cínico nesse aspecto. Nos anos 90 fiz álbuns brutais, que não venderam: Camões, as Descobertas e Nós, Ode a Federico Garcia Lorca, Cais do Sodré, de jazz, Pelos Direitos do Homem, dedicado à causa de Timor-Leste, e aquele álbum da fotografia despido de preconceitos. 

Está a falar da fotografia que fez em 1994, onde aparece nu, deitado num sofá, com um disco de ouro à frente?
Sim, despi-me de preconceitos e protestei contra as playlists das rádios. Quando as pessoas têm de sujeitar a sua criatividade e talento, com um sorriso de esgar e arrogância, aos 'donos' das playlists não posso fazer outra coisa. Com essa fotografia consegui separar o trigo do joio. As pessoas preconceituosas ficaram horrorizadas, as despreconceituosas acharam um piadão, acharam-me rebelde. 

Sabia que a imagem ia perdurar?
Claro que sim. O John Lennon despiu-se com a Yoko Ono pela paz no mundo e a imagem ficou para sempre, mesmo sendo a Yoko uma mulher horrorosa e o Lennon um lingrinhas do pior que há, com uma pilinha que ninguém queria pegar a não ser a medonha da Yoko. Eu, ao menos, sou ribatejano, de uma raça superior. O Lennon nu era o oposto do seu talento. A Yoko não percebeu que estava ao lado de um homem genial e quis manipulá-lo. Comigo a Yoko não tinha um dia de existência, comprava-lhe um par de patins e vinha do Castelo de São Jorge por aí abaixo. 

Nunca foi influenciado por uma mulher?
Não! Mulher que queira mandar em mim não tem hipótese. Também nunca quis mandar em nenhuma das mulheres com quem casei. Estou muito atento à manipulação das mulheres. É essa a grande vantagem que tenho com a Gabriela [a actual mulher]. É completamente independente, e dá-me a certeza de que sou verdadeiramente amado. 

É a sua quarta mulher. Como aconteceu?
Sou amigo de todas as minhas ex-mulheres, uma infelizmente já morreu, a Maria Armanda, mas tinha decidido não casar mais. Mas depois apareceu-me uma senhora interessantíssima, pintora, que não depende de mim economicamente, que tinha conhecido há muitos anos na Austrália. Ela tinha sido Miss Timor e era jornalista em Melbourne. Foi aí que nos conhecemos, quando me fez uma entrevista. Estivemos quase 30 anos sem nos falar. 

Como foi o reencontro?
Através destas coisas modernas da internet e Facebook. Gostei logo dela, foi tórrido... Depois estivemos 30 anos sem nos ver e há três veio a Portugal e encontrámo-nos. Ela foi a Timor resolver a sua vida e voltou para nos casarmos. 

Pediu-lhe logo em casamento?
Não, na minha idade já não se pede ninguém em casamento. Aos 72 anos era um disparate. Com esta idade o que se diz é: 'Damo-nos lindamente, temos tudo em comum, o mesmo sentido de humor, até somos os dois monárquicos progressistas, é uma boa ideia termos uma companhia na recta final das nossas vidas'. 

Usando a sua expressão, então agora já não é 'tórrido', já não há paixão, sexo… 
Damo-nos com Deus e os anjos. Cuidamos muito um do outro, dormirmos muito abraçadinhos, fartamo-nos de rir de manhã quando acordamos. Estamos sempre a rir, a dizer coisas engraçadas e a provocar. Com a minha idade as pessoas têm de se habituar a gostar de quem gosta delas. Quando gostamos das pessoas que gostam de nós levamos uma vida muito mais tranquila. A Curia [concelho de Anadia] dá-nos uma qualidade de vida bestial. A minha quinta também é muito bonita, passeamos com as nossas cadelas, ela pinta, eu escrevo os meus êxitos. 

É muito vaidoso da sua carreira. 
Eu? Nada. Gosto de escrever boas canções e de cantá-las. 

Então porque reforça várias vezes o reconhecimento internacional, o facto de cantar melhor do que o Roberto Carlos…
Mas isso é tão óbvio! É o mesmo que dizer que é mais bonita que a Teresa Guilherme. São coisas tão óbvias, que se pode dizer isto sem querer sublevar o ego [ri muito]. Aquela gente com quem a Teresa Guilherme está naquela Casa, que eu chamo de Casa dos Degredos, choca-me porque não tem representatividade em relação à juventude portuguesa. 

Se fizessem com celebridades e o convidassem entrava?
Está fora de questão. Não sou uma celebridade, sou um mito. E os mitos não se misturam com celebridades. Os mitos pairam a outros níveis. 

Isso não é contraditório com o que disse antes da sublevação do ego? 
Qual é o problema de as pessoas terem ego? Sou um mito porque, com 72 anos, tenho uma homenagem pública cada vez que dou um concerto, para salas completamente cheias, com gente a cantar comigo do princípio ao fim. Estou mitificado pelo público nacional. A Amália e o Zeca, injustamente, não tiveram uma homenagem destas. 

Nessa lógica o Tony Carreira também é um mito.
Não tenho a menor dúvida que sim. O Tony Carreira canta lindamente, tem poemas geniais, da mais alta qualidade poética, e tem músicas extremamente originais, basta ir à internet e ver. É um monstro de palco.

Está a ser irónico?
Não estou. Ele canta qualquer tipo de música: jazz, blues, rock. A voz dele presta-se a tudo. É do melhor que há. 

Continua a soar irónico.
Se pela negativa não vou lá, agora falo sempre pela positiva. Quem quiser que vá à internet e escreva ''L'Idiot' Herve Vilard', oiça e depois tire as suas conclusões. Como essa canção há mais 40. E as centenas de multas que já pagou por plágios na América do Sul e Central? O Marco Paulo, que cantava mesmo, tinha voz, e agora estou a falar a sério, punha poetas portugueses a fazer a tradução de letras e assumia-se como cantor de versões. A Sociedade Portuguesa de Autores paga-me a mim como paga aos plagiadores. Isso não é justo. Eu sou um criativo, um poeta, autor de toda a minha obra, não tenho nada que ser misturado com esta merda. 

Ser irónico e desbocado ajuda a construir o mito?
Não sou desbocado, é uma palavra sua. Eu não contesto, constato. Não sou malévolo a analisar as coisas. Obrigo é as pessoas a terem sentido de humor, se não têm nunca vão gostar do José Cid. 

Música para inteligentes e para pouco inteligentes

por A-24, em 01.11.14

O organograma que ditou a notícia da semana passada


Discos de vinil registam as maiores vendas em 20 anos

por A-24, em 24.10.14
No Reino Unido foram vendidas cerca de 800 mil unidades desde o início de 2014, superando as 780 mil vendidas em 2013.

As vendas de discos de vinil no Reino Unido estão prestes a atingir o seu melhor nível em quase 20 anos, impulsionadas pelos Arctic Monkeys e Jack White, segundo números do mercado apresentados pela Official Charts Company.
Cerca de 800 mil unidades foram vendidas desde o início de 2014, superando as 780 mil vendidas em 2013.
Se esta tendência for mantida até dezembro, as vendas podem passar de um milhão de exemplares, o melhor resultado anual desde 1996, quando 1.083.206 vinis foram vendidos. O vinil mais vendido daquele ano foi "The Score", do trio de hip hop norte-americano The Fugees.
Em 2014, o álbum "AM", dos Arctic Monkeys, que já tinha registado as melhores vendas do ano passado, manteve o primeiro lugar. O grupo também está na décima posição, com o álbum de estreia "Whatever People Say I Am That's What I'm Not".
O segundo lugar ficou com "Lazaretto", de Jack White, enquanto "Definitely Maybe", dos Oasis, levou o bronze. 
Os Led Zeppelin ocupam três dos dez primeiros lugares do ranking com os álbuns "Led Zeppelin" (5º), "Led Zeppelin III" (7º) e "Led Zeppelin II" (9º).
"Os discos de vinil podem ter sido considerados subprodutos de uma época superada, mas, na verdade, representam um formato em expansão que faz um verdadeiro regresso em plena era digital", declarou Lynne McDowell, a porta-voz do BPI, que representa a indústria musical britânica.
"Num mundo cada vez mais digital, parece que os amantes da música ainda procuram um produto tangível com desenhos originais, de alta qualidade de áudio e um som puro", acrescentou. Sapo música


Hoje é o dia… do Leitor de CDs

por A-24, em 01.10.14
Via ppl ware

Há quanto tempo não utiliza um CD?! Muito provavelmente já não se lembra sequer da última vez que o fez. Com o crescimento dos downloads digitais, a massificação dos dispositivos com capacidade para leitura do formato MP3 e toda a sua integração em casa ou no carro, fizeram do CD algo que brevemente pertencerá ao passado.
Hoje é o dia em que se pretende utilizar um pouco de tecnologia “old-fashioned” e celebrar o 32º aniversário do Leitor de CDs… sim, o leitor de CDs é de facto tecnologia antiga. Ligue o sistema de som da sala ou o leitor portátil e tire o pó às caixas de CDs!
Lembro-me dos CDs de música terem surgido em força em meados dos anos 90. Nessa altura era já interessante receber ou oferecer um CD de música como prenda e fazer algumas trocas com amigos.
O primeiro leitor de CDs comercial com tabuleiro deslocável foi lançado pela Sony no dia 1 de Outubro de 1982, no Japão, há precisamente 32 anos. O modelo lançado foi o Sony CDP-101 e, no mês seguinte, foi lançado o Philips CD100 que incluía alguns componentes da Sony. Devido a um acordo entre os dois fabricantes, o lançamento global da tecnologia ocorreu em Março de 1983.
Consequência do desuso desta tecnologia é também a grande queda nas vendas de CDs dos artistas, motivando a criação da Lei da Cópia Privada, mas que inevitavelmente não tem volta a dar. O panorama mudou e a utilização de CDs já pertence à década passada.

Há 45 anos, os Beatles estenderam a passadeira para a fama

por A-24, em 08.08.14
Observador

Londres, 8 de agosto de 1969. Iain Macmillan foi o fotógrafo escolhido para fazer a capa que imortalizou o último álbum gravado pelos Beatles, Abbey Road, com John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr a atravessarem a mítica passadeira londrina, por volta das 11h30.
Here comes the sun, uma das canções do disco, composta por Harrison, pode ser a banda sonora escolhida para este tema. Consta que foi uma sexta-feira quente, aquela em que o fotógrafo amigo de John Lennon e de Yoko Ono registou o momento em que a banda se despediu dos álbuns. Iain Macmillan teve dez minutos para conseguir concretizar a fotografia.
Na altura, ainda não se sabia que Abbey Road seria o último álbum a ser gravado pela banda britânica, a quem se devem clássicos como Let it Be, All My Loving ouYesterday. Mas a especulação sobre se os membros saberiam desta hipótese existe. Poucas semanas depois, John Lennon informou os outros membros da banda, que iria sair.
Iain Macmillan tirou seis fotografias. Em quatro, Paul McCartney atravessou a passadeira descalço. Noutras duas, usou sandálias. Das seis imagens que Macmillan captou na manhã de 8 de agosto, o ícone dos Beatles escolheu a quinta, a única em que os quatros membros da banda andavam sincronizados. Material utilizado: uma máquina Hasselblad com uma lente grande angular de 50 milímetros, diafragma fechado a 22 e tempo de exposição de 1/500 segundos.

Mais de 20 mil euros por uma imagem dos Beatles em Abbey Road
Linda McCartney, mulher de Paul McCartney, tirou várias fotografias durante a sessão, que contou com a colaboração da polícia britânica para parar o trânsito em Abbey Road. Em maio de 2012, uma das fotografias da sessão fotográfica de Iain Macmillan foi vendida num leilão, em Londres, por cerca de 20,15 mil euros.
A passadeira atravessada pelos quatro membros da banda já foi considerada Património Histórico de Londres e não faltam mitos e curiosidades associados à capa de Abbey Road. O próprio título do disco resultou de uma decisão de última hora. Esteve para se chamar Everest, em homenagem aos cigarros que o técnico de som Geoff Emerick fumava.
No pacote do maço de cigarros estava desenhada a silhueta da montanha mais elevada do Mundo e os Beatles chegaram mesmo a planear alugar um jacto particular para viajar até ao Everest e fazer a imagem da capa no local. Foi Paul McCartney que sugeriu que a fotografia fosse feita na rua onde estavam a gravar o disco, onde se situam os Abbey Road Studios, e que o álbum adotasse o nome da via do noroeste londrino, em St. John’s Wood.
A capa de Abbey Road sustentou a teoria de que Paul McCartney estava morto e que os Beatles tinham-no substituído por um sósia.
A capa do disco, que embora tenha sido o último a ser gravado pelos Beatles antecedeu o lançamento de Let It Be, alimentou o mito e a tese da conspiração sobre a suposta morte de Paul McCartney. A imagem, em que aparece descalço, serviu de base para alimentar a teoria de que Paul tinha falecido num acidente de viação em 1966 e sido secretamente substituído por um sósia.
A capa do álbum, de acordo com os teóricos, representaria o funeral de Paul McCartney: John Lennon, vestido de branco, simbolizava o padre, Ringo Starr, vestido de preto, simbolizava o enlutado, George Harrison, o coveiro e Paul, descalço, o cadáver. Depois de o álbum ter sido lançado, a matrícula do Volkswagen Beetle branco, que aparece à esquerda na imagem, foi roubada. Em 1986, o carro foi leiloado por 3.186 euros e, desde 2001, está em exibição num museu alemão.

Adeus, Ramones

por A-24, em 14.07.14
Miguel Esteves Cardoso


Morreram todos os Ramones. Já não há nenhum Ramone vivo. Eu gostava muito dos Ramones. Eles eram, sendo (ou apesar de serem?), americanos, ainda mais punks do que os gloriosos, primeiros, Sex Pistols.
Ambos eram rock n'roll. Mas os Ramones, sendo americanos, eram punks por preferência, sem ódio, enquanto os Pistols eram gloriosamente antagonísticos. Num artigo publicado em O Jornal em 27 de Novembro de 1981, fiz questão de lembrar que o primeiro álbum dos Ramones era anterior aos Sex Pistols. E eu estava lá, em 1976, em Londres, onde a minha mãe e a minha irmã viviam a dez passos da King's Road, em Chelsea, onde tudo começou.
Escrevi, com razão, que "o primeiro LP deles, surgido em 1976, quando o punk britânico não era mais do que um brilho ténue nos olhinhos verdes de Malcolm McLaren, foi uma revelação de inocência, de energia – do que os americanos chamam o 'trash aesthetic' (a estética do desperdício, do lixo)".
Concluía, vergonhosamente esperto, que "neste ano de 1981 nada têm a acrescentar". Mantenho essa opinião sobre o álbum Plesant Dreams, que saiu nesse ano.
Em 1981 já estavam acabados. Mas, enquanto começaram, eram uma excitação nunca antes ou depois ultrapassada: "One, two, three, four... hey ho, let's go..."
Agora estão todos mortos. Como é possível? Como é que as vidas se tornaram tão curtas como as canções?
Eram tão vivos os Ramones. A música deles continua a ser a vida feita música. Eles morreram. E nós? Continuamos vivos – e fãs.

Movimento punk em Portugal analisado em congresso no Porto

por A-24, em 28.06.14
The Clash
Na conferência internacional “Keep It Simple, Make It Fast – Underground Music Scenes and DIY Cultures” vão ser apresentadas as conclusões de uma série de investigações desenvolvidas nas ciências sociais, mas também nas artes, no design e na música.

O movimento punk e os fenómenos underground – “cada vez mais presentes na sociedade portuguesa” -vão ser analisados num congresso a partir do dia 8 de julho, no Porto, na presença de 150 investigadores de 30 países.
De acordo com a socióloga Paula Guerra, da Universidade do Porto, na conferência internacional “Keep It Simple, Make It Fast – Underground Music Scenes and DIY Cultures” vão ser apresentadas as conclusões de uma série de investigações desenvolvidas nas ciências sociais, mas também nas artes, no design e na música que permitem concluir que três décadas após o movimento punk as “formas de vida” alternativas estão cada vez mais presentes.
“Apesar da idade, fica sempre qualquer coisa de se ter sido punk e essa alguma coisa, se calhar, é o conceito ‘Do It Yourself’ (DIY, na sigla em inglês). Mas também as coisas que se fazem coletivamente: a questão da luta e da resistência, a participação social e política, alheada de partidos mas participativa. Pessoas que querem fazer a diferença e não querem ser uma ovelha no rebanho”, disse à Lusa Paula Guerra sublinhando as características originais do punk.
O movimento punk, a partir da segunda metade da década de 1970, inicialmente no Reino Unido e nos Estados Unidos, promoveu o conceito DIY, uma forma de criação independente, alheada das marcas e do sistema comercial na produção de música, roupa, adereços e publicações.
O fenómeno de “contracultura” reaparece e de acordo com a investigadora da Universidade do Porto está presente em Portugal, quer pelos mais jovens mas também pela geração mais velha.
“Há um interesse muito grande das pessoas em encontrarem formas de vida alternativas ainda que isso não tenha muito eco nos media mas vai acontecendo e transfere-se para a vida das pessoas e revela-se em modos de vida, práticas artísticas, práticas musicais”, disse Paula Guerra.
“Desde de 2012, em Portugal, há uma cena ‘underground’ dinâmica muito feita pelas próprias pessoas que participam, arranjam espaços, agendas e há muito dinamismo. Todas as semanas existem concertos e há coisas a acontecer só que todas essas coisas são de uma grande invisibilidade e muito micro”, sublinha a investigadora, autora do livro “A Instável Leveza do Rock” sobre o percurso do rock alternativo desde os anos 1980.
“Há casos de pessoas que têm empregos. Trabalham das ‘nove às cinco’ e paralelamente desenvolvem projetos em que reúnem amigos, gravam música em casa, fazem as capas dos discos e das cassetes e que são movidas por uma paixão. Acreditam em fazer coisas diferentes e sobretudo é muito interessante que estas coisas se verifiquem numa sociedade como a atual em que há uma banalização enorme das coisas, inclusivamente da participação cívica e da participação política”, explica a socióloga.
Paula Guerra destaca o conjunto de pessoas que se movem “nos circuitos alternativos” e cujas motivações não são o dinheiro mas a vontade de participação baseada em sentidos “estéticos e valorativos” e que procuram uma “resistência ao sistema e ao estado das coisas”.
“Estamos a falar de pessoas com várias idades mas o núcleo duro está na casa dos trinta e dos quarenta anos e outros, mais velhos, mantêm-se assim ao longo de toda a vida e não desistem”, diz Paula Guerra.
A investigação da socióloga entrevistou quase 200 pessoas para um trabalho sobre o punk em Portugal onde assume importância o envelhecimento e igualmente, entre outros pontos, o papel das mulheres nos movimentos alternativos em Portugal a partir dos anos 1980.
Dead Kennedies
“Elas são menos em número e existe uma certa desigualdade que se revela também um pouco neste segmento. Isto é uma das coisas que custa aceitar às pessoas: as mulheres têm um papel mas de retaguarda, de acompanhar a banda. São menos protagonistas mas são importantes e, por isso, estamos a entrevistar as mulheres participantes no punk desde os anos oitenta”, disse.
O congresso que vai decorrer no Porto vai igualmente apresentar os trabalhos do investigador australiano Andy Benett, do canadiano Will Straw e do sociólogo Augusto Santos Silva.
“Temos 160 pessoas de 30 países e que vêm de propósito para o congresso. São investigadores destas áreas e não só da parte do punk mas também investigadores de Heavy Metal, Hip Hop, Rap e da música eletrónica”, sublinhou Paula Guerra.
O congresso “Keep It Simple, Make It Fast – Underground Music Scenes and DIY Cultures”, sem precedentes em Portugal, vai decorrer entre os dias 8 e 11 de julho na Casa da Música, na Faculdade de Letras da Universidade do Porto e em outros espaços da cidade como a “Matéria Prima”, a “Dama Aflita” e o “Plano B” onde vão ser organizados exposições e concertos.
@Lusa

Gangnam Style sobe a parada com dois mil milhões de visualizações e bate recordes do YouTube

por A-24, em 01.06.14

O número foi atingido nas primeiras horas deste fim-de-semana e é uma entrada fulgurante de um single com dois anos (estreou-se online em Julho de 2012) nos registos de recordes não só da música, mas do vídeo online. “Dois mil milhões de visualizações é um número tanto honroso quanto esmagador”, disse o próprio Psy em comunicado, citado pela agência de notícias AFP, prometendo que este novo sucesso o levará a produzir novos conteúdos em breve – nos próximos dias deve ser lançada a sua colaboração com o rapper norte-americano Snoop Dogg.

Rock in Rio: Lisboa ultrapassa Rio de Janeiro como cidade anfitriã do festival

por A-24, em 25.05.14
A capital portuguesa acolheu o evento pela primeira vez em 2004, colocando a "Cidade do Rock" no Parque da Bela Vista.
Lisboa ultrapassa este ano o Rio de Janeiro como a cidade que mais vezes acolheu o festival Rock in Rio, evento brasileiro que cumpre dez anos de existência em Portugal e que inicia nova edição no próximo dia 25.

A capital portuguesa acolheu o Rock in Rio (RiR) pela primeira vez em 2004, colocando a "Cidade do Rock" no Parque da Bela Vista, uma área arborizada e relvada com 200 mil metros quadrados - o equivalente a 20 campos de futebol. Desde então, o festival, criado pelo empresário brasileiro Roberto Medina, aconteceu em Lisboa em todos os anos pares, cumprindo agora a sexta edição e dez anos de permanência em Portugal.
O RiR nasceu no Rio de Janeiro em 1985 como um evento destinado a promover o Brasil, tornando-se num dos maiores festivais de música do mundo, tendo tido edições também em 1991, 2001, 2011 e 2012. A sexta edição do Rock in Rio, no Brasil, acontecerá em 2015.
Roberto Medina escolheu Lisboa como porta de entrada do festival na Europa, pela proximidade linguística e pelo potencial da cidade. Já depois de Lisboa, o festival estendeu-se a Madrid (em três edições) e terá uma estreia nos Estados Unidos em 2015, em Las Vegas.
Nos dez anos de existência em Portugal, o festival Rock in Rio contou com cerca de 1,7 milhões de espetadores, cerca de 400 concertos de alguns dos mais sonantes artistas do pop rock, como Paul McCartney, Peter Gabriel, Stevie Wonder, Metallica, Foo Fighters, Sting, Roger Waters ou Shakira.
Na memória ficaram também a atuação cambaleante de Amy Winehouse, o concerto da cantora Britney Spears - acusada de ter feito "playback" - e o de Miley Cyrus, na altura já a transitar da personagem Hanna Montana para a irreverente e polémica intérprete pop da atualidade.
Em todas as atuações do Rock in Rio Lisboa duas bandas marcaram sempre presença, tal como acontecerá este ano: o grupo rock português Xutos & Pontapés e a cantora brasileira Ivete Sangalo.
Este ano, os grandes destaques serão os britânicos Rolling Stones - a mais antiga banda rock em atividade -, que tocam no dia 29, os norte-americanos Queens of The Stone Age (dia 30), os canadianos Arcade Fire (dia 31) e a estreia em Portugal do músico norte-americano Justin Timberlake (01 de junho).
A organização do festival tem já garantida a realização do Rock in Rio Lisboa em 2016 e 2018.
A autarquia de Lisboa aprovou em abril as duas novas edições do festival, isentando a promotora do pagamento de taxas.
Na altura, a decisão foi criticada pelos vereadores do PCP, por considerarem que se perdem seis milhões de euros, entre isenção de taxas e prestação de serviços pela autarquia.
Em abril, semanas antes da decisão camarária, a responsável pelo festival, Roberta Medina (filha do fundador) afirmava à agência Lusa a vontade de a organização se manter em Lisboa, dado o sucesso dos anos anteriores: "A nossa intenção é ficar para sempre".

@Lusa

Festival Kazantip Segue Firme e Forte em Meio ao Caos da Crimeia

por A-24, em 17.05.14
Recuperando uma entrevista com o "presidente" do  festival Kazantip, indiferente ao que se passa na Crimeia, terra onde se realiza um dos festivais de musica eletronica mais interessantes da Europa.

Com uma duração de várias semanas e a auto-denominação de ser uma república temporária e independente (com ministros e um “presidente” que anda de Segway), Kazantip vem sendo há tempos um dos mais estranhos e interessantes festivais da Europa. E ele acontece na Crimeia, a antiga península da Ucrânia forçadamente anexada pela Rússia no mês passado.
Tal fato criou especulações sobre o futuro do festival, então pensamos que este seria ótimo um momento para conversar com o Presidente Nikita (criador e organizador do festival) e perguntar como andam os planos pro festival desse ano, levando em consideração a atual e ingrata posição. Como foi documentado ao longo dos anos em muitos artigos – e, inclusive, um documentário da VICE – Kazantip sempre foi um ímã para os cidadãos russos, que vão de jovens despreocupados a gente desagradável e assustadora, então era improvável que o festival de repente se tornasse uma espécie de bastião de protesto contra as recentes investidas de Putin na península.
Mas não contávamos com a extraordinária força retórica pró-Rússia das respostas de Nikita, que chegam a classificar o recente e forçado referendo como um exemplo prático de “livre escolha”, e rotular o luto da Ucrânia pela perda da Crimeia como “ciúme descontrolado e histérico”.
É um entendimento extremamente interessante e bizarro da situação, mas, ao menos, deixa descansados aqueles que temem o cancelamento do festival. Com o seu Presidente virando a casaca pro lado de Moscou desta maneira, a única possível surpresa desagradável em Kazantip nesse verão pode ser a visão de um Putin seminu pulando ondinha no Mar Negro.
THUMP: Se você tivesse que resumiro Kazantip numa única frase, qual seria?
Nikita:
Eu costumava usar uma expressão de outra pessoa que dizia “uma Amsterdã russa-ucraniana”, mas as coisas mudaram nos últimos anos e agora os visitantes da República Kazantip são cidadão de 106 países diferentes. E, de maneira geral, Kazantip não é o que você pensa, mas, às vezes, é o que você sonha.
Você sente que Kazantip já atingiu seu objetivo de criar uma sociedade nova e melhorada, ou ainda há trabalho pra fazer nesse aspecto?
Uma sociedade consiste em pessoas e eu não idealizo pessoas. Sem dúvidas, Kazantip como estado ocupa o primeiro lugar em números de pessoas felizes. Mas o comportamento dessas pessoas nem sempre é perfeito. Gostaria de ver pessoas mais gentis e mais inteligentes no mundo. É algo que deve ser trabalhado constantemente, não só por mim.
Aparentemente, o Burning Man é o único festival de música que você respeita. Quanta inspiração Kazantip tira dele?
Sim, não nego que o Burning Man me inspirou por muitos anos. Mas depois de visitá-lo percebi uma coisa muito importante: todas aquelas instalações não são nada comparadas às pessoas que vi lá. Foi como acreditar nas pessoas outra vez. Acredito que se possa (e se deva) incentivá-los a ir além; criar um ambiente favorável pra realização pessoal de milhares de pessoas, ao invés de tentar surpreender o mundo todo como um pequeno grupo de mágicos ilusionistas.
Hoje tenho muita experiência e recursos quase que ilimitados pra fazer um pulo no hiper-espaço. Você pode ter certeza de que isso vai acontecer, e então o Burning Man vai sentir orgulho por ser ocasionalmente comparado ao Kazantip, a meca do novo mundo. Com esse conceito de ser temporário e construído do nada, o Burning Man está condenado a permanecer como um doce acampamento cigano no meio do deserto.
Quão importante é a música no Kazantip? É de importância central ou é apenas um pequeno elemento no conjunto mais amplo da República?
A música fica em segundo plano, com certeza. Mas precisa ser perfeita e atual – ou melhor ainda, representar o futuro. Lamento que não haja dinâmica, qualidade, nem mudanças revolucionárias na cena moderna da música eletrônica. Atualmente, nossas prioridades musicais são quase idênticas à lista das melhores da Resident Advisor, mas também precisamos agradar pessoas com gostos minoritários (trance, drum 'n' bass, hardcore techno, além de uma plataforma de música ao vivo que oferece eletro-indie). A música é legal, mas vamos combinar que a vida de uma pessoa moderna tem coisas mais interessantes e significativas. É pra essa direção que devemos olhar.
Dada a situação atual da Crimeia e Ucrânia, existiu o perigo do Kazantip não acontecer neste ano?
Pra mim, com certeza não. Sim, eu presumi que o confronto entre o ocidente e a Rússia pudessem ser adiados, mas sempre achei que não iria além da retórica. Vou te contar um segredo: não há nada interessante ou significativo na Crimeia com exceção do Kazantip. O motivo da controvérsia foi inicialmente por conta de uma outra República. Kazantip é uma fonte inesgotável e única da mais importante energia, que é necessária a todos os países e pessoas – pelo menos uma vez por ano.
Você conhece muita gente que foi afetada pelos recentes eventos na Crimeia e na Ucrânia? Você acha que Kazantip pode ser um escape ainda mais valioso da realidade pros ucranianos este ano?
Concordo que a situação do lado de fora das fronteiras da República esteja muito politizada. Os ucranianos estão sofrendo dolorosamente pela perda da Crimeia, e especialmente de Kazantip. É mais algo como um ciúme descontrolado e histeria, mais do que senso comum. Estamos prontos pra curá-los.
Você estima alguma dificuldade este ano com o Kazantip acontecendo dentro da Rússia e não da Ucrânia?
Até o momento, só vejo infinitas oportunidades nessa nova realidade. Em face à crise, a destituída Ucrânia não foi capaz de resolver os problemas da Crimeia. Não poderia, nem resolveria. Mas a Rússia pode e está pronta pra fazê-lo. Agora a Crimeia está destinada a prosperidade. A questão é: o que vão fazer disso – a nova “Las Vegas”, “Monte Carlo”, “Singapura”?
O único problema deste ano é a necessidade do visto russo pra visitar a Crimeia. Claro, no futuro, essa região terá um regime de vistos mais simplificado. Por ora, enquanto a comunidade internacional estiver tímida em aceitar a Crimeia e Kazantip como entidades livres, as pessoas precisam pegar voos via Moscou, mas em compensação as passagens estão bem mais baratas.
Qual é o conceito por trás da oferta de cidadania pra mulheres da Ucrânia e da Crimeia?
Sabendo como é difícil pros ucranianos, Kazantip foi a primeira nação a oferecer ajuda. Observe que fizemos isso antes do resto do mundo, antes dos prósperos EUA e Europa. Fomos os primeiros a fraternalmente oferecer ajuda pra cada garota ucraniana conseguir seu ViZa (bilhete de entrada) de graça.
Por que só garotas? Acreditamos que os rapazes ucranianos não devem ser distraídos pela dança. Eles precisam continuar na luta pela sua liberdade, arrebentando as portas pra Europa, batalhando pelo poder, ou apenas parando pra pensar por que caralhos eles começaram com esse circo, e se há qualquer tipo de benefício vindo desses sacrifícios e privações.
Você acredita que Kazantip vai permanecer na Crimeia nos próximos anos ou vai se mudar pra Ucrânia?
Nikita:
Você está brincando? Kazantip nunca pertenceu à Ucrânia. Ela pertence a mim. Quando a União Soviética caiu, usei a oportunidade pra tirar um pedaço. Desde então, estou construindo meu próprio estado por muitos anos. Pra evitar chamar muita atenção, finjo que é tipo um festival. Mudar pra Ucrânia? Que ideia inesperada. Honestamente, nunca pensei nisso. Por que deveria?
O Kazantip deste ano vai incluir algum elemento de protesto contra as ações da Rússia na Crimeia?
Nikita:
Você está brincando comigo outra vez, né? Que protestos? A República Kazantip reconhece a legitimidade dos resultados finais do referendo da Crimeia muito antes deles terem sido estabelecidos. Vamos concordar em respeitar o direito que todas as nações têm em lutar pela sua liberdade, não só os ucranianos. As pessoas da Crimeia fizeram sua livre escolha. E claro, estamos felizes por elas.
Visitantes dignatários de outros países serão bem vindos no Kazantip? O que você diria se Vladimir Putin quisesse fazer uma visita?
Nikita:
Acho estranho que Vladimir Putin ainda não tenha arranjado tempo pra nos fazer uma visita, mas temos muitos amigos em comum que vêm a Kazantip todos os anos. A cada vez que voltam, eles provavelmente compartilham suas impressões positivas, fotos e souvenires com ele. Tenho uma proposta de mudar as conferências de Sochi pra Kazantip, porque é um lugar mágico de poder.
Além disso, exijo que Kazantip seja incluída na comunidade de estados super poderosos, pra que eles parem de fingir que não existimos no mapa múndi. Sim, não somos a maior nação, mas sabemos como curar a todos; como reconciliar as pessoas do mundo e resolver conflitos globais. Estamos prontos pra compartilhar os Segredos Estratégicos de Felicidade da Grande Nação de Kazantip com os demais habitantes da Terra.