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A-24

Verdades inconvenientes

por A-24, em 10.12.14

Palestina: Um erro que nada faz pela paz

por A-24, em 04.12.14
João Marques de Almeida

A ideia de que os palestinianos querem “dois Estados a viver lado a lado” constitui a maior ilusão de muitos europeus – e aparentemente de muitos dos deputados portugueses.
Parece que o governo vai reconhecer a Palestina como “Estado” para, diz um deputado do PSD aqui nas páginas do Observador, “fazer alguma coisa pela paz”. O governo segue aliás o exemplo de outros países europeus, como a Suécia, a França e o Reino Unido. É um erro que nada faz pela paz. Este voluntarismo diplomático é de resto extraordinário. Os países europeus não conseguem manter a paz na Ucrânia, não conseguem manter a paz na Líbia, não conseguem manter a paz na Síria, não conseguem manter a paz no Iraque, nunca conseguiram manter a paz entre Israel e os seus vizinhos, e agora acham que o reconhecimento da Palestina como “Estado” vai ajudar a “paz” na região. Esta gente vive em que mundo?
A recusa dos palestinianos, e de quase todos os outros países árabes – com a excepcão do Egipto, da Jordânia e de Marrocos – em reconhecerem o Estado de Israel constitui a principal causa do conflito na região. Mais: a recusa em reconhecer Israel explica por que razão a maioria dos líderes palestinianos não querem criar um Estado palestiniano ao lado do Estado judaico. Os palestinianos só querem criar o seu Estado quando acabarem com Israel.
Prestem atenção à educação “oficial” nas escolas palestinianas, onde as crianças são ensinadas a odiar os judeus e a recusar a existência de Israel. Ouçam os sermões nas mesquitas, leiam a imprensa palestiniana e vejam a televisão palestiniana. O ódio aos judeus – e não só aos israelitas – é o tema dominante. E estudem a história do Médio Oriente desde 1945. Os árabes e os palestinianos tiveram várias oportunidades para criar o Estado da Palestina. Nunca o fizeram porque isso significaria reconhecer Israel.
A ideia de que os palestinianos querem “dois Estados a viver lado a lado” constitui a maior ilusão de muitos europeus – e aparentemente de muitos dos deputados portugueses. Não querem e nunca reconhecerão o Estado de Israel. E por essa razão, também não querem um Estado palestiniano enquanto não destruírem Israel. Se os europeus quisessem mesmo fazer “alguma coisa pela paz” fariam tudo o que pudessem para forçar os palestinianos a reconhecer Israel. E com todo o dinheiro que enviam para a Palestina têm algum poder para o fazer. 
Não é a paz que leva os europeus a reconhecerem a Palestina como “Estado”. São questões de política interna. Um dia ouvi um líder socialista europeu – não é português – dizer o seguinte: “como a participação na zona Euro não nos permite ter políticas socialistas, temos que defender causas sociais e externas (foi aqui que deu a Palestina como um exemplo) para acalmar as nossas esquerdas”. E muitos governos de direita, como aparentemente o nosso, desgastados com as acusações de “neoliberalismo” precisam de uns votos parlamentares que mostrem que são, apesar de tudo, “moderados”. Quando a direita quer agradar à esquerda, normalmente faz asneiras.
A decisão de reconhecer a Palestina como um “Estado” não só é completamente inútil, como constitui um atentado aos valores fundamentais de uma sociedade democrática. Os europeus combatem os radicais islâmicos no Síria e no Iraque, reforçam a segurança nos seus países para evitar ataques terroristas a civis indefesos e inocentes, e reconhecem um “governo” que comete esses ataques. Além de praticar o terrorismo, o Hamas tem outra particularidade: assassina cruelmente homossexuais e mulheres que têm o “azar” de se apaixonar pelo homem errado – este tem a “sorte” de ser perdoado. O reconhecimento da Palestina como “Estado” constitui ainda um sinal de fraqueza por parte dos europeus, que será recebido com prazer e desprezo por todos os grupos radicais islâmicos, da Argélia à Indonésia.
O nosso Parlamento vai votar o reconhecimento de um “Estado”, parcialmente governado por um grupo terrorista, que não reconhece valores essenciais como os direitos dos homossexuais ou a igualdade entre homens e mulheres. Uma iniciativa que nada fará pela paz e que será visto pelos grupos terroristas como um voto contra uma democracia, Israel. Mas os nossos deputados ficarão bem com a sua consciência e felizes com o seu exemplo de “unidade moderada” em nome da “paz”.

Faz parte da natureza do Hamas.

por A-24, em 28.11.14
Rui Carmo via Insurgente

Do lado da União Europeia, será a altura para deixar de apoiar o terrorismo. Esse papel continuará a ser desempenhado pelo Qatar e por eméritos doadores públicos e privados. Em Maio último, o Qatar ofereceu cinco milhões de dólares ao governo islamista do Hamas. A solidariedade pretendeu apoiar os esforços de reconciliação com a Fatah (com os brilhantes resultados que se conhecem), partido que lidera a Autoridade Palestiniana na Cisjordânia. De acordo com Ismail Raduan, Ministro das Doações e Assuntos Religiosos do Hamas, a oferta do governo do país do Golfo Pérsico pretendeu apoiar a “reconciliação comunitária” e está destinada a apoiar as famílias que perderam os seus entes queridos nas quase eternas lutas armadas que opõem a Fatah e o Hamas.
Em Março deste ano, no seguimento da ilegalização da Irmandade Muçulmana, um tribunal egípcio baniu toda e qualquer actividade do Hamas no país e confiscou todos os seus bens. O Hamas é acusado de interferir nos assuntos internos egípcios e, na altura, alguns dos seus líderes tinham Cairo como base. As autoridades egípcias acreditam que a organização terrorista do Hamas que governa a Faixa de Gaza, desempenha um papel importante noaumento da violência vivida na Península do Sinai.
Desde Julho que o exército do Egipto destruíu mais de 100 túneis que ligam Gaza ao Egipto e que servem para contrabandear alimentos, materiais de construção mas também armas e terroristas. A lua-de-mel entre o Hamas e o Egiptou acabou de forma abrupta quando os militares removeram o Presidente Morsi e acabaram com o governo da Irmandade Muçulmana. Hoje o Hamas que é visto como é um apoiante dos atentados terroristas, um risco acrescido para as forças de segurança e civis, procura defender-se das acusações como um ataque à causa palestiniana e um favor a Israel.

Os interesses "domésticos" da Turquia e a hipocrisia islâmica

por A-24, em 26.11.14

Em Israel primeiro estão os judeus, só depois os outros. Para quando o mesmo na Europa?

por A-24, em 24.11.14
Expresso



Projeto de lei que reforça carácter judaico do Estado de Israel foi aprovado este domingo. A proposta, dos partidos de direita e extrema-direita, recebeu críticas ferozes, sendo apelidada de "racista" e "crime contra a convivência" entre judeus e minorias. 


O governo israelita aprovou este domingo um projeto de lei que define Israel como Estado-nação do povo judeu. A Lei Básica, que deverá sir quarta-feira ao Parlamento (Knesset), institucionaliza a lei judaica tradicional como fonte legislativa e define o árabe, não como língua oficial, mas como "estatuto especial". 
Apesar de ter sido aprovado por 14 votos a favor e 6 contra, a proposta gerou grande discussão e controvérsia entre o centro e esquerda e a direita. A versão final da lei poderá ter uma versão menos radical.
Os partidos de direita e extrema-direita, como o Likud, Israel Beitenu e Casa Judaica, saudaram a iniciativa. Para estes, o que importa é o direito de autodeterminação do povo judeu e a viabilidade do Estado de Israel, realçando que a igualdade individual não é colocada em causa. "No Estado de Israel há igualdade para todos os cidadãos, mas o direito nacional é apenas para o povo judeu", defendeu o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
As afirmações provocaram indignação entre os opositores, que apelidam a Lei Básica de "racista" e classificam-na de "crime contra a convivência" entre judeus e minorias árabes e cristãs - que constituem 20% da população de Israel. Entre eles, está o ministro das Finanças, Yair Lapid. E o procurador-geral de Israel, Yehuda Weinstein, que critica o facto de exaltar valores judaicos assentes em religião e história, em prejuízo dos valores democráticos.

Segundo vários críticos, a nova lei poderá enfraquecer a declaração de independência de Israel, baseada "nos princípios da liberdade, justiça e liberdade de expressão, proclamada pelos profetas de Israel" e onde se declara "igualdade social e política para todos os cidadãos, independentemente da sua religião, raça ou género".
A proposta pode aumentar as tensões entre israelitas e árabes, num momento em que surgem novas notícias de violência na região. Em Gaza, um palestiniano foi morto este domingo por forças israelitas, sendo a primeira vítima na faixa de Gaza após o acordo de cessar-fogo de 26 de agosto. No mesmo dia, na Cisjordânia, a casa de outro palestiniano foi incendiada em Khirbet Abu Falah, perto de Ramallah. 

Quem defende os cristãos?

por A-24, em 13.09.14
Ronald Lauder

O povo judeu compreende muito bem o que pode acontecer quando o mundo se mantém em silêncio. Esta campanha de morte tem de ser travada.

Porque é que o mundo se mantém em silêncio enquanto cristãos são vítimas de massacres no Médio Oriente e em África? Na Europa e nos Estados Unidos, assistimos a manifestações contra as mortes trágicas de palestinianos, utilizados como escudos humanos pelo Hamas, a organização terrorista que controla Gaza. As Nações Unidas conduziram inquéritos e focam a sua raiva em Israel por se defender contra essa mesma organização terrorista. No entanto, o massacre bárbaro de milhares e milhares de cristãos é visto com relativa indiferença.

O Médio Oriente e partes de África central estão a perder comunidades inteiras de cristãos que viveram em paz durante séculos. O grupo terrorista Boko Haram raptou e assassinou centenas de cristãos este ano – devastando a vila de Gwoza, maioritariamente cristã, em Agosto, no estado de Borno no nordeste da Nigéria. Meio milhão de cristãos árabes foram expulsos da Síria durante os mais de três anos de guerra civil. Os cristãos têm sido perseguidos e mortos em países desde o Líbano até ao Sudão.

Os historiadores podem olhar para este período e perguntar se as pessoas perderam o seu rumo. Até há pouco tempo poucos jornalistas tinham viajado até ao Iraque para testemunhar a onda de terror, semelhante ao nazismo, que se está a espalhar no país. As Nações Unidas quase não se pronunciam sobre o assunto. Os líderes mundiais parecem estar consumidos por outros assuntos neste estranho verão de 2014. Não há flotilhas em direção à Síria ou ao Iraque. E porque é que o massacre de cristãos não faz levantar as antenas das belas celebridades e das estrelas rock envelhecidas?
O Presidente Obama deve ser louvado por ter ordenado ataques aéreos para salvar dezenas de milhares de yazidis, seguidores de uma religião antiga e presos numa montanha no norte do Iraque, cercados por militantes muçulmanos sunni. No entanto, infelizmente, os ataques aéreos, por si só, não são suficientes para travar esta vaga grotesca de terrorismo.
O Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIS, ou ISIL) não é uma coligação solta de grupos jihadistas, mas sim um força militar real, que conseguiu assumir o controlo de maior parte do Iraque com um modelo de negócio bem-sucedido que rivaliza com o seu arauto da morte. Esta coligação utiliza dinheiro de bancos e de lojas de ouro que foram capturados, assim como recursos de petróleo e a velha extorsão, para financiar a sua máquina de morte, sendo assim, talvez, o grupo terrorista islâmico mais rico do mundo. No entanto, é na carnificina que o ISIS se destaca, rivalizando com as orgias de morte da Idade Média. De modo brutal, têm atacado xiitas, curdos e cristãos.
“Eles decapitaram crianças e puseram as suas cabeças em paus” disse à CNN Mark Arabo, um homem de negócios caldeu norte-americano, descrevendo uma situação num parque em Mosul. “Há mais crianças a serem decapitadas, mães a serem violadas e mortas e pais enforcados.”
200.000 arameus fugiram da sua cidade-natal, perto de Nineveh, e já saíram de Mosul.
A indiferença geral em relação ao ISIS, com as suas execuções em massa de cristãos e com a sua preocupação mortífera com Israel não é apenas errada – é obscena.
Em Budapeste, num discurso proferido perante milhares de cristãos, em junho, fiz uma promessa solene de que não vou manter-me em silêncio face à crescente ameaça de antissemitismo na Europa e no Médio Oriente – e que também não vou ser indiferente ao sofrimento cristão. A História conta-nos o oposto: os judeus têm sido sempre a minoria perseguida. No entanto, Israel tem estado entre os primeiros países a prestar auxílio a cristãos no Sudão do Sul. Os cristãos podem exercer a prática da sua religião abertamente em Israel, o que não se verifica em grande parte do Médio Oriente.
Esta ligação entre judeus e cristãos faz todo o sentido. Partilhamos muito mais do que a maioria das religiões. Lemos a mesma Bíblia e partilhamos um núcleo moral e ético. Nos dias de hoje, infelizmente, também partilhamos um tipo de sofrimento: cristãos estão a morrer pelas suas crenças, porque estão indefesos e porque o mundo está indiferente ao seu sofrimento.
É necessário que o lado bom das pessoas se traduza em união para travar esta vaga revoltante de violência. Nós não somos impotentes. Escrevo isto como um cidadão da maior potência militar do planeta. Escrevo isto como um líder judeu que se preocupa com os seus irmãos e irmãs cristãos.
O povo judeu compreende muito bem o que pode acontecer quando o mundo se mantém em silêncio. Esta campanha de morte tem de ser travada.
Ronald S. Lauder é o presidente do World Jewish Congress. Texto publicado originalmente no New York Times

Tradução de Francisco Ferreira

O Fogo e a Justiça Não Cessam

por A-24, em 29.08.14
A Batalha

A justiça quer-se cega, rápida e eficaz. O grupo terrorista do Hamas procura a máxima eficácia na sua aplicação ao território que domina. A organização que domina Gaza afirma ter executado 18 pessoas, suspeitas de colaborarem com Israel. As execuções acontecem 48 horas após um ataque aéreo israelita ter resultado na morte de três líderes operacionais do Hamas. Os três homens eram altos dirigentes das brigadas Azedim al Kasam, o braço armado do movimento islamista Hamas. Sabe-se que algumas das execuções foram públicas e que pelo menos onze das vítimas foram executadas com tiros numa esquadra no centro de Gaza, após terem sido julgadas em tribunais revolucionários. Os outros supostos colaboracionistas foram mortos em público por homens encapuzados e que envergavam o uniforme das brigadas Azedim al Kasam, em frente da mesquita de Al Omari, também localizada em Gaza. A “resistência” reforça assim a sua luta no terreno contra quem colabora com Israel. O delito está contemplado na lei palestiniana com a pena de morte. No entanto, a aprovação final da sentença pertence ao Presidente Mahmud Abas, cuja autoridade política e instituicional não é reconhecida pelos terroristas do Hamas.

A 19 de Agosto, apesar das negociações estarem a decorrer na capital do Egipto, tendo como pano de fundo uma solução a longo prazo, o Hamas violou de forma flagrante o cessar-fogo… pela décima primeira vez (!). Israel reafirma que não negoceia debaixo de fogo e que irá manter a Operação “Protective Edge” até que possa ser assegurada segurança e a paz, as estruturas do Hamas sejam grandemente afectadas, utilizando para o efeito os meios diplomáticos e militares que tem à sua disposição. A 20 de Agosto o dirigente do Hamas Saleh al-Arouri, admitiu que a organização a que pertence foi a responsável pelo sequestro e morte dos três adolescentes israelitas , o que prova aos mais cépticos uma vez mais a natureza terrorista da organização islamita.

Um dia seremos todos israelitas?

por A-24, em 26.08.14

O Curdistão tem todas as características para se tornar uma nova versão de Israel. Tal como Israel, está cercado de inimigos e sob a mira dos jihadistas. Tal como Israel, depende do apoio americano.

O Estado xiita que a retirada de Obama deixou no Iraque desfez-se perante a ofensiva do Estado Islâmico (ISIS), que o governo americano já classificou como uma ameaça maior do que a velha Al-Qaeda. E alguma gente aproveitou para ir ao sótão recuperar as acusações contra Bush: não fosse a invasão de 2003, nada disto teria acontecido. Houve até quem tivesse descoberto mais: o Iraque sob Saddam Hussein, tal como a Síria dos Assad, era uma ditadura, claro — mas uma ditadura de paz, secular, multicultural, onde todas as minorias viviam em amena tolerância mútua.
Acontece que as ditaduras de Saddam e dos Assad não eram nada disso. No Iraque, a 16 de Março de 1988, Saddam demonstrou uma peculiar concepção de multiculturalismo ao usar gás de mostarda para matar milhares de curdos. Na Síria, em Fevereiro de 1982, o pai do actual Assad desenvolveu um novo conceito de tolerância ao massacrar cerca de 20 mil sunitas na cidade de Hama. A paz do Iraque de Saddam ou da Síria da família Assad era a paz dos cemitérios. Externamente, as suas noções de boa vizinhança não eram menos originais. Saddam atacou o Irão em 1980 e invadiu o Koweit em 1990. A família Assad ocupou o Líbano em 1976. Eis os grandes pilares de paz multicultural e equilíbrio diplomático que a sabedoria de algibeira nos diz agora que o Ocidente devia ter respeitado.

Com Bush, ficámos a saber que operações de democratização-relâmpago, como a ensaiada no Iraque, não funcionam. Com Obama, percebemos que jogar golfetambém não. Obama retirou do Iraque e não quis intervir na Síria, para não repetir o “erro de Bush”. Resultado: teve de voltar ao Iraque e terá provavelmente de intervir na Síria, donde o ISIS saiu para invadir o Iraque. Em 2001, também Bush tencionava evitar o “erro” das intervenções de Clinton. Foi Bin-Laden quem o fez mudar de ideias. Tal como o ISIS a Obama.

As coisas podem ainda tornar-se mais complicadas. No Iraque, o objectivo americano não foi defender o governo de Nouri al-Maliki, que deixou cair, mas o Estado autónomo dos curdos. Ora, o Curdistão tem todas as características para se tornar uma nova versão de Israel. Tal como Israel, está cercado de inimigos e sob a mira dos jihadistas. Tal como Israel, depende do apoio americano. Ao contrário de Israel, porém, a sua defesa não dispensa a intervenção militar directa dos EUA. Por enquanto, tudo se passa no deserto, e não na cidade, como em Gaza. Senão, já estaríamos a contar as baixas civis causadas pela aviação americana.

O Curdistão não é o único candidato a ter um futuro israelita. A Europa ocidental tem à sua volta Estados como a Rússia e o Irão, sob sanções, ou ex-Estados convertidos em bases da jihad, como a Líbia, a Síria ou o Iraque, donde os sucessores da Al-Qaeda esperam, através da diáspora muçulmana, levar a guerra até ao Ocidente. Estes Estados e movimentos não são iguais, mas têm isto em comum: todos reagem, não apenas contra o poder ocidental, mas também contra o modo de vida ocidental (secularismo, igualdade das mulheres, aceitação de diferentes escolhas sexuais, etc.). Os seus métodos de agressão variam, mas são igualmente perigosos. A Rússia, por exemplo, pode parecer interessada apenas em jogos diplomático-comerciais, mas ei-la a armar uma subversão na Ucrânia, provocando a morte de centenas de passageiros de um voo de Amsterdão.

E como têm respondido os EUA e os europeus a tudo isto? Com embargos, operações de contra-terrorismo, e ataques militares. Tal como Israel no Médio Oriente. Há diferenças? Há, claro. Mas talvez um dia deixem de ser suficientes para esconder as semelhanças.

Kokito

por A-24, em 17.08.14
Excelente artigo de António Araújo no Malomil


Numa das passagens mais comoventes de Errata: Revisões de uma Vida, George Steiner recorda que, quando fez seis anos, o pai lhe começou a ler trechos da Ilíada, principiando logo pelo Livro XXI. Steiner lembra a cruel passagem em que Aquiles, desvairado pela morte do seu amado Pátrocolo, massacra os troianos em fuga. «O meu pai leu o grego várias vezes. Fez-me soletrar as sílabas. O dicionário e a gramática escancararam-se diante dos meus olhos.»


O trecho que provocou tão funda impressão na criança precoce é aquele em que, sem piedade, Aquiles degola o desprezível Licáon, um dos filhos de Príamo.

Aquiles desferiu-lhe um golpe com a espada afiada

na clavícula, por baixo do pescoço; e a espada de dois gumes

penetrou. Prostrado no chão ficou Licáon, estatelado;

seu negro sangue jorrou da ferida e molhou a terra.


(Homero, Ilíada, Canto XXI, 116−119, trad. de Frederico Lourenço)

No ensaio que dedicou às decapitações na arte ocidental, Visions capitales, Arts et rituels de la décapitation, Julia Kristeva escreve, a dado passo, que «o horror destas decapitações e o impacto das suas reproduções inevitavelmente evocam em nós as reportagens fotográficas e televisivas de guerras civis recentes. No Biafra, no Vietname e de novo agora no Ruanda ou na Argélia, onde os fundamentalistas actualmente praticam massacres e cortam o pescoço das vítimas. Estas práticas são tão frequentes em certas regiões do mundo que a opinião pública global, inicialmente chocada, acaba por fechar os olhos e não ligar.» (Julia Kristeva,Severed Heads. Capital Visions, trad. norte-americana, 2012, p. 26). 


Isto leva-nos a Kokito. Mohamed Hachud tem 28 anos. Kokito, nome de guerra. Vivia em Castillejos, uma localidade marroquina junto à fronteira com a praia de El Tarajal, uma povoação costeira do município de Ceuta.Kokito é casado com uma espanhola, Asia Ahmed Mohamed, que viajou até à Síria para se encontrar com o noivo num acampamento do Estado Islâmico do Iraque e do Levante (ISIL ou EIIL), a milícia jihadista que, além de matar soldados e perpetrar execuções públicas nas praças de Al Atarib, adoptou um novo costume: exibir-se com as cabeças decapitadas das suas vítimas. Na cerimónia do casamento, Mohamed ofereceu à noiva um cinto com explosivos, símbolo macabro de união eterna. Antes do casamento, Mohamed comerciava em Castillejos, durante o dia, e às noites reunia com salafistas radicais. Pensava já juntar-se ao ISIL, passando horas a fio na Internet. Kokito foi recrutado por Mustafá Maya Amaya, um paralítico de 51 anos, que, dando ordens através do seu portátil, enviou já dezenas de jihadistas para o Mali, para a Síria e para a Líbia.

A fotografia mostra Kokito com cinco cabeças a seus pés, uma faca ainda ensanguentada e o indicador erguido, em sinal de aviso. Não foi captada ao acaso. Destina-se a enviar uma mensagem: para os seus companheiros de armas, para as suas vítimas mais próximas e para todos nós, que também somos suas potenciais vítimas. A linguagem de Kokito é mais eloquente e directa do que a das pinturas medievais que Julia Kristeva analisou num ensaio denso e muito erudito. «Entram nas aldeias e arrasam-nas. Não há contemplações para com os inimigos. As cabeças degoladas são uma mensagem para que as pessoas vejam o que lhes pode acontecer se não aderirem ou obedecerem», disse há dias ao insuspeito El País um especialista em terrorismo, que acrescentou: «na Síria os jihadistas estão a cometer atrocidades num grau superior ao que vimos em todas as outras guerras.» Os guerreiros da Jihad global dominam as novas tecnologias que, note-se, foram criadas no mundo ocidental, tido por corrupto e satânico. Sempre que conquista uma localidade, o ISIL distribui pen drives com cânticos jihadistas que mostram as operações da milícia sanguinária e condeam a democracia. Mohamed Hachud, Kokito, tem uma conta noTwitter, onde escreveu há tempos: «Um dia voltarei à minha terra para fazer a jihad.»

Existe uma barreira entre nós e a lâmina ensanguentada da navalha deKokito. Essa fronteira não é a linha ténue e prosas que separa Ceuta de Marrocos; ou Marrocos da Península Ibérica, onde o ISIL aspira a reconstruir o Califado. Essa barreira está situada um pouco mais longe, não muito – e chama-se Israel. Considerem isto maniqueísmo, simplificação demagógica, afirmem que o Hamas e o ISIL são realidades diversas, digam o que bem entenderem: a Caixa de Comentários encontra-se ali em baixo, registando com plena liberdade todas as opiniões, por mais insultuosas que sejam.

Nada disto, sublinhe-se claramente e sem quaisquer subterfúgios, significa aprovação acrítica por tudo quanto Israel está a fazer na Palestina contra o Hamas e, já agora, tudo o que o Hamas está a fazer na Palestina contra Israel. Em Israel, um Estado democrático, com eleições limpas e alternância política, opinião livre e imprensa crítica, há muitos que discordam do rumo que a guerra ao Hamas está a tomar. Aliás, por todo o mundo há judeus horrorizados com a violência que alastra, sobretudo quando ela atinge populações civis indefesas. Em Israel pode discordar-se e criticar-se. No mundo de Kokito, não. Ainda há pouco, em Junho deste ano, em Mosul, o bando de Kokito chacinou 13 clérigos muçulmanos sunitas que, apesar de apoiarem as pretensões do ISIL, advogavam alguma moderação nesta barbárie sem fim. 



A indiscutível primazia política, ética e moral de Israel sobre todos os povos em seu redor não lhe confere, por si só, legitimidade para que possa fazer o que quiser, nem lhe dá carta branca para ultrapassar os limites do intolerável. Daquilo que temos por intolerável justamente à luz dos princípios, dos valores e das regras que, repete-se, distinguem Israel de todos os Estados seus vizinhos e das organizações que estes financiam e patrocinam. É imprescindível o diálogo entre todas as partes, na convicção de que com Kokito e a sua navalha não há «diálogo» possível. Estão a ser enviados às dezenas, de Espanha, Marrocos e até Portugal; todos prometem regressar em breve, de navalha em punho. 

E para aqueles que, por cegueira político-ideológica, conspurcam as paredes de Lisboa com grafitos que gritam Free Palestine!, importaria parar por momentos e pensar um pouco. Em Portugal e em Israel, pode dizer-se o que se pensa. Com Kokito, quem se arrisca a pensar pela própria cabeça, perde-a. Perde-a decapitada, no sentido mais literal do termo. Conviria pensar nisso. Se possível, pela própria cabeça. Sem dogmas nem preconceitos.

Um preconceito demasiado familiar e uma tomada de posição pessoal

por A-24, em 14.08.14
Via Iniciação ao Tédio

Circula na Internet uma petição a solicitar ao governo de Portugal a interrupção das relações diplomáticas com Israel (encerramento de embaixadas, etc.) até o «genocídio em Gaza» terminar.

Esta escolha de linguagem e o apelo a sanções diplomáticas fizeram-me antecipar a publicação da seguinte infografia:

(clicar para ver maior)


Porque a realidade é esta: por via de um preconceito demasiado familiar, o “valor” de um cadáver árabe ou muçulmano é maior — muito maior — se o dedo puder ser (com maior ou menor propriedade) apontado a Israel.

Os menos de 2 mil mortos em Gaza são um «genocídio» — já a guerra civil na Síria, com mais de 200 mil mortos, é um detalhe que quase já nem passa nas notícias.
O padrão, de resto, é antigo: fala-se frequentemente da cumplicidade (por vezes, enganosamente, de autoria) do exército de Israel no massacre de Sabra e Shatila (1982), em que 750 a 3500 civis pereceram às mãos de milícias cristãs libanesas — mas esquece-se, no mesmo ano, o massacre de Hama, em que 10 mil a 40 mil cidadãos sírios foram massacrados pelo seu próprio governo.
E, ao mesmo tempo que a ofensiva israelita decorre em Gaza, os islamitas do ISIS decapitam e crucificam “hereges” na Síria, tendo conquistado recentemente a cidade de Sinjar, último refúgio de diversas minorias étnico-religiosas (yezidis, shabaks, xiitas...) no noroeste do Iraque, lançando igual perspectiva sobre o futuro desta gente.
Infelizmente, os exemplos poderiam continuar quase indefinidamente por praticamente todo o mundo árabe e muçulmano.
Who cares! Israel não está envolvido, está?

Não digo que todos os que assinam e divulgam esta petição, ou de outra forma se manifestam contra Israel, sejam antissemitas ou anti-judeus. Certamente que não: o activismo clica-e-partilha faz-se de muita inconsciência, ignorância e preguiça intelectual, também. Mas há muitos que, alegremente, saltam, como de flor em flor, do protesto contra as acções de Israel para a oposição à existência de Israel e, daí, para a apologia da perseguição aos judeus. («O Adolfo tinha razão» foi coisa lida recentemente em paredes.)
Porque, por muito que o custe dizer, o antissemitismo não tem as raízes secas e tem terreno fértil onde cair. (Não, não me refiro às críticas a Israel, muitas delas legítimas.) Viu-se recentemente, de forma particularmente caricatural, com o desaparecimento do voo MH370: não tardou muito para que surgissem mirabolantes teorias da conspiração sobre supostos interesses de um famoso banqueiro judeu; uns pouco comentários online bastaram para que o dedo acusador passasse do banqueiro em concreto para «os judeus». O facto de a “teoria” não ter pés nem cabeça era irrelevante (inclusive para a comunicação social que, em busca do eterno “colorido”, divulgou acriticamente a acusação).
Conforme disse no início, publiquei esta infografia antes do previsto. De facto, andava por estes dias a preparar um (previsivelmente longo) artigo onde exporia de uma forma sistematizada a minha posição quanto ao conflito israelo-palestiniano. É um exercício particularmente deprimente, porque se trata de fazer escolhas num conflito em que nenhum lado fica propriamente bem na fotografia. Nele discutiria, entre outras coisas, aqueles que considero serem os erros (e, nalguns casos, os crimes) de Israel. Isto porque não embarco em maniqueísmos acéfalos: não é por eu apoiar Israel que pinto a actuação do seu exército em tons de cavaleiro andante.
Nenhum dos lados fica bem na fotografia, é verdade — mas os dois lados não ficam iguais na fotografia.
O exército israelita cometeu crimes de guerra, certamente. (Algumas vez terá havido um exército, em cenário de guerra, que não os tenha cometido nunca? Duvido.) Mas a maioria desses crimes foram deliberadamente provocados pelo Hamas, como estratégia de relações públicas — estratégia, ela própria, criminosa. Um crime é sempre um crime, mesmo que em reacção a um crime anterior, mas ainda assim a superioridade moral de Israel fica aqui bem patente: existe, moralmente, uma diferença enorme — abismal, inultrapassável — entre ser implacável para com os nossos inimigos e ser maquiavélico na orquestração do telegénico massacre da nossa própria população.
O maior pecado de Israel foi deixar-se cair na emboscada mediática montada pelo Hamas.

Que fique claro, pois: apoio Israel. Porque, apesar das opções nem sempre correctas, o governo de Israel tem um objectivo legítimo: a defesa e a segurança do seu próprio povo. E, não obstante as imperfeições, Israel é um país livre e democrático: mesmo os seus cidadãos árabes (20% da população), ainda que vítimas de alguma desconfiança quanto à sua lealdade, são mais livres em Israel do que em qualquer país árabe.
O mesmo não se pode dizer do Hamas. Para o Hamas, o objectivo não é a defesa do povo palestiniano, que alegremente sacrifica, mas a promoção niilista da Causa da Fé. Uma vez vencido o «inimigo sionista», o movimento dedicar-se-ia à opressão do seu próprio povo, em nome de uma “pureza religiosa” que mais não é do que um outro nome para a barbárie obscurantista. (De resto, já o vem fazendo em Gaza.) Porque o Hamas não é um movimento de resistência palestiniano ou mesmo uma Organização de Libertação da Palestina (por mais imperfeita que esta seja). O Hamas é, assumidamente, um «Movimento de Resistência Islâmica» (sunita): toda uma variedade de palestinianos — cristãos, druzos, baha’i, muçulmanos xiitas — seria, em maior ou menor escala, excluída, subjugada ou perseguida.
(O mesmo vale para o Hezbollah, o autoproclamado «Partido de Deus», este da vertente xiita, particularmente activo no sul do Líbano.)

Mas tudo pode ser resumido a isto: apoio Israel porque uma versão israelita de mim — ateu e crítico de muitas das acções do governo e do exército — poderia viver a sua vida em Israel sem grandes medos de represálias. (Concedo: existem franjas na sociedade israelita que moralmente não distingo do Hamas — veja-se o assassino de Rabin.)
Mas, e quanto à Palestina do Hamas ou do Hezbollah? (Ou, diga-se em abono da verdade, quase todos os países árabes e muçulmanos...) Poderia o mesmo ser dito? Não, todos sabemos bem que não. Alguém como eu, sendo palestiniano, seria pura e simplesmente abatido pelo seu próprio governo (não por um tresloucado à solta: em Gaza os tresloucados estão no poder) ainda a tinta não tinha secado na palavra «ateu».