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A-24

Rússia testa vontade da NATO de se reinventar

por A-24, em 22.11.14
Paulo Rangel

Vários líderes europeus, com destaque para Angela Merkel, têm mantido uma posição de força, mas alguns analistas questionam a determinação da Aliança Atlântica para enfrentar Moscovo.

1. Os ventos que correm Europa e Mundo afora são ventos de guerra. De guerra na Líbia, de guerra na Síria, de guerra no Iraque, de guerra nas fronteiras da Ucrânia.


E as brisas que atravessam o Mundo e a Europa são brisas de vésperas, de vésperas de guerras. O Egipto ferve e fervilha e o Magrebe já sente a febre do Estado Islâmico. Os aviões russos desejam com ardência ser acompanhados; os navios russos ufanam-se em ser escoltados; os submarinos russos orgulham-se em não serem identificados. A China desafia o Japão e o Japão desafia a China. O Irão aguarda pacientemente um momentum libertador vindo das actuais negociações internacionais; a Coreia do Norte insiste na sua vocação provocadora. Os Estados Unidos todos os dias fazem nova prédica, nova prédica dura e moral. Mas quanto mais pregam, mais longe parecem de qualquer vontade de intervir, mais próximos aparecem da sua secular reticência. Obama, vindo do Hawai, promete o Pacífico, promessa que obviamente não pacifica a Europa.

2. A Europa vive as angústias da crise e as inquietudes do enorme desgosto democrático dos cidadãos. O UKIP, mais xenófobo do que eurocéptico, progride a olhos vistos. Marine Le Pen, com a sua demagogia sedutora da desilusão, arrisca-se a ganhar eleições. A Suíça e a Noruega – outrora paraísos democráticos – convivem diariamente com a direita radical no poder. Na Itália, os cépticos e os cínicos crescem a toda a hora e ninguém faz baixar a onda populista e popular de Beppe Grillo. Na Hungria, na Holanda, na Grécia, na Suécia e na Finlândia, a direita extrema vai ganhando espaço e visibilidade. A suspeita de que a Rússia, de um modo ou de outro, apoia e financia os movimentos de extrema-direita em todos estes países aguça e estimula o aguilhão da insídia e da cizânia nas chancelarias e nos quartéis-generais. A Grécia soma ao radicalismo de direita a virtual vitória eleitoral da extrema-esquerda do Syriza e do seu projecto de dissolução anárquica da democracia liberal tal como a conhecemos. A Polónia – agora elevada ao estatuto de quase potência – e os países bálticos, temendo genuinamente o delírio imperial de Putin, pressionam a tal ponto a política externa europeia que esta acaba por fornecer a Moscovo os pretextos pelos quais Moscovo anseia e aspira. Os sinais de desagregação política em países pobres como a Roménia e a Bulgária são tudo menos discretos. As volições soberanistas da Catalunha, do País Basco, da Escócia, da Flandres e da Padânia complicam finalmente o debate do lado ocidental.

A crise das dívidas soberanas e a lentidão da sua superação encarregam-se da parte restante. A ameaça de deflação – que parece agora ser encarada com mais seriedade do que nunca – lança o espectro de fazer da Europa um novo e grande Japão. A polémica à volta da competitividade fiscal dos Estados-membros e da agressividade fiscal do Luxemburgo, outrora governado pelo novo Presidente da Comissão, também não ajudam. A ideia de que pode haver uma cesura entre Estados ricos e Estados pobres, entre Estados grandes e Estados médios e pequenos, entre Estados do Norte e Estados do sul, entre Estados atlânticos e Estados centrais e de leste continua a fazer o seu caminho.

3. A crise catalã é talvez o detonador mais visível da incerteza na Península, mas não é decerto o único. O vulcão dos escândalos políticos em Espanha não cessa de entrar em actividade: seja do lado do PP, com o caso Barcenas, seja do lado do PSOE, com a conexão andaluza, seja mesmo do lado institucional da monarquia, com o caso Nos. A formalização política do movimento dos indignados, de algum modo hipostasiada na ascensão do Podemos e do seu profeta Pablo Iglesias, não vem a ser menos preocupante. Com a sua confessa simpatia pelo “socialismo bolivariano” da Venezuela, do Equador e da Bolívia, está tudo dito quanto às suas credenciais democráticas. Com as suas promessas de distribuição omnímoda de prestações sociais, sem qualquer explicação sobre o respectivo financiamento, está tudo dito quanto ao lugar geométrico da sua demagogia. O Podemos, enquanto movimento de dissolução dos pilares da democracia liberal, não é menos pernicioso nem menos perigoso que muitos daqueles movimentos de direita radical. A Espanha vive um momento constitucional, político e partidário delicadíssimo, que, de uma maneira ou de outra terá sempre consequências sobre Portugal.

A incerteza global, a incerteza europeia e a incerteza espanhola são hoje o meio ambiente da incerteza lusa.

4. Miguel Macedo. Gostava de deixar aqui uma palavra a e sobre Miguel Macedo – para lá do “sim”, que aqui costumo registar e que hoje vai também registado a seu favor. Admiro de há muito o seu convicto sentido de Estado e de dignidade institucional, o seu conhecimento profundo da vida política e das suas vicissitudes, o seu respeito pela cultura institucional das administrações públicas. E, por isso, devo confessar que o seu gesto, tomado logo num primeiro momento, em nada me surpreendeu. Surpreender-me-ia, sim, um qualquer gesto diverso. É fundamental, designadamente, no quadro europeu que defendamos a todo custo – e independentemente de qualquer juízo precipitado ou injusto de culpabilidade sobre este ou aquele alto dirigente administrativo – a nossa polícia de fronteiras, o seu prestígio e a sua integridade. Numa altura em que Schengen, pelas boas e pelas más razões, está no epicentro da política europeia, não podem restar dúvidas sobre a honorabilidade e a competência da polícia portuguesa. Foram os valores éticos e democráticos de mais alto timbre, mas também este concreto interesse nacional vital, que o gesto de Miguel Macedo soube proteger.

SIM. Miguel Macedo. O Ministro da Administração Interna mostrou a dimensão política, ética e humana que muitos lhe reconheciam. Os bons exemplos são sempre benvindos. 

NÃO. Escândalo dos vistos Gold. A vida política de um Estado depende em muito da qualidade, do espírito de serviço e da credibilidade da alta administração pública. Eis um plano em que se passam a levantar dúvidas legítimas.

O petróleo como arma geopolítica

por A-24, em 19.11.14
João Marques de Almeida


A descoberta do “petróleo de xisto” nos Estados Unidos constitui uma das transformações geopolíticas mais relevantes dos últimos anos e terá repercussões enormes na política mundial.
O preço do petróleo está nos 80 dólares (mais precisamente nos 83). Eis um dos acontecimentos mais relevantes da política mundial. Há poucos meses custava cerca de 120 dólares. A redução do preço resulta de uma maior produção, desde o “petróleo de xisto” nos Estados Unidos até ao “pré-sal” no Brasil e em Angola. Mas também de uma menor procura, como resultado da crise económica, tanto nos países desenvolvidos como nas economias emergentes.
Petróleo de Xisto
A descoberta do “petróleo de xisto” nos Estados Unidos constitui uma das transformações geopolíticas mais relevantes dos últimos anos e terá repercussões enormes na política mundial. Os Estados Unidos tornaram-se independentes energeticamente e a partir do próximo ano tornar-se-ão exportadores de petróleo. Apesar das fraquezas conjunturais, a prazo os Estados Unidos serão mais poderosos. Como disse um famoso historiador norte-americano, “os Estados Unidos não só nasceram em liberdade mas também com sorte”. E a sorte continua. Além disso, ao contrário de muitos países, nos EUA a descoberta de petróleo não provoca corrupção. Desenvolve novas tecnologias, novas empresas e cria empregos.
O petróleo de xisto serve igualmente como uma arma geopolítica. E Washington já começou a utilizá-la. O Financial Times deste fim de semana publicou um artigo sobre o preço do petróleo com dados interessantes. Para a Venezuela manter as finanças públicas equilibradas – e estamos a falar de uma país que não tem acesso ao financiamento dos mercados internacionais – e não incorrer em bancarrota, o preço do petróleo deverá ser 160 dólares o barril. Para o Irão, seria 130 dólares. E para a Rússia, seria 110 dólares. Isto significa que a manter-se o actual preço de 80 dólares, o futuro destes três países não será brilhante.
Em particular, para a Rússia, a situação pode tornar-se dramática. Como resultado das sanções económicas, os seus bancos deixaram de ter acesso aos mercados, o que torna cada vez mais difícil o crédito às empresas e aos consumidores, afectando gravemente a economia russa. Preocupado com a situação económica, Putin não recorreu, pelo menos por agora, à arma do gás, tendo assinado um acordo com a Ucrânia. Com uma dívida elevada, a Gazprom precisa de vender gás à Europa; e a China não é a melhor alternativa porque, aproveitando as dificuldades da Rússia, impôs um preço do gás inferior ao praticado com a Europa.
Ao mesmo tempo, a maioria das empresas norte americanas produtoras de petróleo de xisto, para ter lucro, precisa de um preço do barril de petróleo entre os 40 e os 60 dólares. Ou seja, os Estados Unidos enfraquecem os seus adversários externos sem prejudicarem a sua economia. A outra boa notícia refere-se à transferência de riqueza e de recursos financeiros dos produtores para os consumidores de petróleo. Ou seja, num país como Portugal, todos nós. Um bom exemplo de alinhamento dos interesses transatlânticos.

Só agora é que deram conta dos aviões russos?

por A-24, em 05.11.14
José Milhazes

Se alguém tem dúvidas das intenções do Presidente russo preste atenção ao facto de 25% do Orçamento de Estado da Rússia ir para “fins secretos”, ou seja, despesas militares.

Num comunicado ontem publicado pela Nato, esta organizou alertou para as “manobras aéreas incomuns” e de “grande escala”, mas Portugal só acordou para este problema quando dois bombardeiros russos se aproximaram das águas territoriais portuguesas. Se as notícias fossem apenas relativas a incidentes semelhantes nos mares Negro ou Báltico, que acontecem regularmente, talvez não merecessem destaque.
Mas ainda bem que isso aconteceu connosco, pois talvez só assim despertemos para o que realmente está a acontecer na Europa, e compreendamos que a “guerra fria” já é uma realidade pelo menos desde o segundo mandato presidencial de Vladimir Putin na Rússia (2004-2008). Desde então ficou claro que Moscovo iria passar das palavras aos actos para manter o seu poder de influência no chamado “estrangeiro próximo”, ou seja, no antigo espaço soviético.
Quando da guerra entre a Rússia e a Geórgia (2008), esta perdeu parte significativa do seu território, mas a União Europeia não fez mais do que se apressar a congelar o problema, segundo o princípio: o fundamental é pôr fim aos combates e depois veremos o resto. Nicolas Sarkozy, então Presidente de França, veio a Moscovo para acordar o cessar de fogo e estava com tanta pressa que se esqueceu de definir para onde iriam os observadores da OCSE. O Kremlin decidiu que eles só poderiam estar do lado georgiano da fronteira, Bruxelas protestou um pouco e calou-se.
Talvez os dirigentes da NATO e da UE tenham decidido que Vladimir Putin se ficaria por aí, mas enganaram-se. O dirigente russo, aproveitando-se de uma crise interna na Ucrânia, ocupou silenciosamente a Crimeia, justificando-se com o antecedente do Kosovo, o que não corresponde à verdade. O antecedente seria equivalente se a Crimeia passasse a ser formalmente independente como o Kosovo, mas o Kremlin deixou-se de cerimónias e simplesmente transformou esse território em mais uma república sua.
Logo a seguir ateou o fogo do separatismo no Leste da Ucrânia e a explicação também foi encontrada: se os EUA têm direito, porque é que nós não temos? Mas os dirigentes do Kremlin continuam a falar de respeito pelo Direito Internacional com uma superioridade tal como se fossem anjinhos. E aqui a história volta a repetir-se: quando os EUA enviavam tropas para algum território, isso significava invasão. A União Soviética fazia exactamente o mesmo mas chamava-lhe “internacionalismo proletário”. Hoje, o Kremlin encontrou outra fórmula: “defesa do mundo russo”, ou, como afirmou recentemente Vladimir Putin, “o urso não vai pedir autorização a ninguém” na defesa da sua taiga. É verdade que o dirigente russo prometeu que esse animal “não tenciona ir para outras zonas climatéricas”, mas a Ucrânia já não é propriamente taiga.
E se alguém tem dúvidas das intenções do Presidente russo preste atenção ao facto de 25% do Orçamento de Estado da Rússia ir para “fins secretos”, ou seja, despesas militares. Aliás, o Kremlin não faz muita questão de esconder que está a gastar enormes meios financeiros para modernizar as suas forças armadas.
Os países da NATO, até há bem pouco tempo, decidiram relaxar-se e poupar nos orçamentos militares talvez considerando que as boas relações com a Rússia se iriam prolongar eternamente e, agora, irão ter de fazer esforços que países como Portugal e outros não conseguirão fazer.
Além disso, e isto parece-me ser o mais importante, a UE e a NATO parecem não saber como travar a expansão russa no antigo espaço soviético, criando esse desconhecimento um clima de insegurança nas populações dos países que são vizinhos da Rússia. Se falarem com estónios, por exemplo, verão que a maioria está convencida de que o Kremlin irá criar problemas nos países do Báltico sem que a UE ou a NATO venham em sua defesa. Eles foram abandonados aos caprichos de Hitler e Estaline e a história, como é sabido, tende a repetir-se.
Posso estar a exagerar? Talvez, mas dentro em breve terá lugar ou não um acontecimento que responderá a essa pergunta. Dmitri Rogozin, vice-primeiro-ministro russo encarregado do sector militar-industrial, anunciou que a França irá entregar o primeiro porta-helicópteros “Mistral” ao seu país e começar a construir o segundo a 14 de Novembro. Paris diz não existirem condições para isso. Vamos ver em que vai acabar este braço de ferro e o que vale a solidariedade europeia.

De barco ou comboio, Portugal quer exportar mais

por A-24, em 28.10.14
De barco ou comboio, Portugal quer exportar maisPor cada comboio de mercadorias podiam retirar-se 34 camiões das estradas, diz um administrador do grupo Mota-Engil numa análise sobre as trocas comerciais entre Portugal e Espanha.
Nas cargas de curta distância Portugal tem margem de progressão e pode ainda melhorar, sobretudo nos portos de Leixões (na imagem), Aveiro e de Lisboa / Rui Duarte Silva
As ligações de Portugal ao exterior são eficientes e favorecem a economia exportadora? Apesar da ferrovia apresentar vários estrangulamentos que podem comprometer a competitividade da economia, as vias marítimas funcionam. O balanço é favorável.
Estas são algumas linhas de conclusão do primeiro painel sobre as ligações de Portugal ao exterior das V Jornadas Empresariais da Fundação AEP/ Serralves, que decorrem esta quinta-feira na Fundação de Serralves. Durante a sessão, Luís Marques, administrador do Grupo Rangel, detetou fragilidades dos portos nacionais na receção de navios e no limite à capacidade, mas destacou a centralidade de Sines - que coloca Portugal nas rotas de tráficos internacionais - e a capacidade dos restantes portos como vantagens competitivas de Portugal.
Nas cargas de curta distância Portugal tem margem de progressão e pode ainda melhorar, sobretudo nos portos de Leixões, Aveiro e de Lisboa. O porto de Lisboa sofre de alguns constrangimentos nos seus acessos.
Nas ligações ferroviárias, Miguel Lisboa, administrador da Takargo, do grupo Mota-Engil, identificou constrangimentos vários que retiram atração a este modo de transporte. Em Portugal não se pode falar numa rede ferroviária, mas num conjunto de linhas sem coerência interna. A generalidade das ligações ferroviárias encontram-se saturadas com velocidades médias reduzidas e manutenções deficientes e, no caso da zona sul, a situação ainda é mais grave por não ser possível o transporte de mercadorias.
Miguel Lisboa verifica que a margem de progressão do transporte ferroviário se encontra sobretudo no mercado ibérico e admite que neste espaço geográfico a ferrovia pode retirar tráfego ao transporte rodoviário. Além-Pirinéus torna-se mais difícil ser competitivo. porque como verificou o administrador da Takargo o transporte rodoviário, ao reforçar a capacidade, ganha em preço e reduz o custo logístico.

Dificuldades além-Pirinéus
Avaliando a troca de mercadorias entre Portugal e Espanha, Miguel Lisboa verificou que o transporte ferroviário representa apenas 4% dos 23 milhões de toneladas que circulam entre os dois países e que por cada comboio de mercadorias podiam-se retirar 34 camiões das estradas.
Se a ferrovia ganhasse 10% de quota ao transporte rodoviário duplicaria 12 vezes as 40 mil toneladas por ano de transporte entre Portugal e Espanha. É portanto na ferrovia que se detetam os maiores constrangimentos e é isso que impede a eficiência das empresas usando este meio de transporte.
Além-Pirinéus, é possível, também, a ligação dos corredores portugueses às linhas europeias, mas aí o transporte ferroviário terá grandes dificuldades em impor-se ao transporte rodoviário ou transporte marítimo.
O administrador da Takarga deixou ainda um aviso sobre as concorrências do mercado nacional, dizendo que com um operador público como a CP Carga, que tem 90% do mercado e apresenta resultados operacionais negativos de 110 milhões de euros, é impossível haver um mercado liberalizado, saudável e competitivo.
Estas jornadas abriram com uma aula de geopolítica de 40 minutos do professor Jaime Nogueira Pinto, que identificou os riscos iminentes no mundo atual citando a ameaça do Estado Islâmico e a indefinição da fronteiro russo-ucraniana.
Nos dois casos referiu que os serviços secretos ocidentais revelaram negligência e as elites ocidentais europeias arrogância e pouca proatividade. Segundo Jaime Nogueira Pinto, a linha da NATO na Europa deverá recuar para a fronteira da Polónia e dos estados bálticos em vez de chegar à Rússia, como acontece neste momento.
Jaime Nogueira Pinto finalizou apontando como "deveras importante" o acordo comercial celebrado entre a China e a Rússia para o fornecimento de gás, assinado em março de 2014, e que envolve a construção de um gasoduto no valor 50 mil milhões de dólares, por entender que é um sinal de aproximação política e que pode ter outro significado para além da sua dimensão comercial. Expresso

A secessão de um país depende do tamanho do seu território?

por A-24, em 09.10.14
Via Instituto Ludwig Von Mises

Quando eu ainda era um mero aluno de faculdade vivendo em Montreal, o Quebec já estava pleiteando sua secessão do Canadá. Foi uma época intelectualmente empolgante, especialmente para um americano como eu, que sabe que, caso o mesmo debate ocorresse nos EUA, as ferrovias que vão para o estado secessionista seriam destruídas e sua população seria esfaimada.
Agora que a Escócia está planejando fazer o mesmo, seria legal açular novamente as controvérsias, só que em termos puramente econômicos.
Em 1995, a pergunta era se Quebec deveria se separar da Confederação Canadense. As emoções falaram mais alto. Um dos líderes secessionistas argumentou, imprudentemente, que a vitória do "Sim" faria com que todos os demais eleitores canadenses se sentissem como "lagostas jogadas na água fervente". Açulando ainda mais os nervos estavam os federalistas alertando sobre um iminente caos econômico, político e monetário em caso de secessão. No final, o voto foi incrivelmente apertado: 49,4% votaram pela secessão; 50,6% votaram pelo não.
Com a Escócia indo às urnas semana que vem para decidir se irá ou não se separar do Reino Unido, o tom da campanha, novamente, é de paixão e emoção. E os secessionistas, novamente, já estão se aproximando do valor mágico dos 50%. Mas isso ainda não é o suficiente para abrir aquela garrafa de malte: até o momento, as casas de aposta em Londres ainda estão pagando 4 para 1 contra a vitória dos secessionistas. (O que significa que, se você apostar uma libra na vitória da secessão, você ganhará 4 libras caso sua aposta seja a vencedora).

Mas, ainda assim, a secessão permanece uma possibilidade real.

Um dos principais debates é sobre se a Escócia é pequena demais ou insignificante demais para se tornar independente. Durante o referendo de Quebec ocorreu um debate praticamente idêntico, com os secessionistas argumentando que o Quebec possuía uma população maior que a da Suíça e um território maior que o da França, ao passo que os federalistas preferiam comparar Quebec aos EUA ou ao "resto do Canadá" para mostrar sua insignificância.

Em uma curiosa coincidência, a Escócia de 2014 e o Quebec de 1994 têm praticamente a mesma população: entre 5 e 6 milhões de pessoas. Isso é praticamente o mesmo que a Dinamarca ou a Noruega, e meio milhão a mais que a Irlanda. Mesmo em termos territoriais, a Escócia se impõe: praticamente o mesmo tamanho da Holanda e da Irlanda, e três vezes maior que a Jamaica. O fato de Irlanda, Noruega, Holanda e Jamaica serem considerados países de tamanho sustentável é apenas mais um ponto em prol dos separatistas.

Portanto, ser pequeno é possível. Agora, é uma boa ideia?

A resposta, talvez um tanto surpreendente, é um retumbante "sim!". Ao menos estatisticamente. Por quê? De acordo com os números do World Bank Development Indicators (Indicadores de Desenvolvimento do Banco Mundial), dentre as 45 nações soberanas da Europa, os países pequenos são quase duas vezes mais ricos que os países grandes. A diferença da riqueza per capita entre os 10 maiores e os 10 menores é de 84% quando se considera toda a Europa, ou 79% quando se considera somente a Europa Ocidental.
Trata-se de uma diferença abismal. Para colocar um pouco de perspectiva, uma diferença de riqueza de 79% é a diferença entre a Rússia e a Dinamarca. Isso é impressionante quando se considera as similaridades históricas e culturais dentro da própria Europa Ocidental.
Mesmo entre as nações de mesmo idioma, as diferenças são gritantes: a Alemanha é mais pobre, em termos per capita, do que as pequenas nações que também falam alemão (Suíça, Áustria, Luxemburgo e Liechtenstein); a França é mais pobre, em termos per capita, do que as pequenas nações que falam francês (Bélgica, Andorra, Luxemburgo, Suíça novamente, e, é claro, Mônaco). Até mesmo a Irlanda, que foi durante séculos devastada pelos ingleses belicistas, é hoje mais rica do que seus senhores do Reino Unido, que possui um território 15 vezes maior.
Por que isso ocorre? Há duas razões. A primeira é que os governos de países menores tendem a ser mais suscetíveis às demandas de sua população e mais intimidados por ameaças de emigração. Quanto menor o país, mais forte tende a ser a reação da população a políticas insensatas, e consequentemente mais sensatas tendem a ser as políticas adotadas por seus governos. Ideias ruins tendem a ser corrigidas mais precocemente. 

Como explicou Hans-Hermann Hoppe:

Governos pequenos possuem vários concorrentes geograficamente próximos. Se um governo passar a tributar e a regulamentar mais do que seus concorrentes, a população emigrará, e o país sofrerá uma fuga de capital e mão-de-obra. O governo ficará sem recursos e será forçado a revogar suas políticas confiscatórias. Quanto menor o país, maior a pressão para que ele adote um genuíno livre comércio e maior será a oposição a medidas protecionistas. 
Toda e qualquer interferência governamental sobre o comércio exterior leva a um empobrecimento relativo, tanto no país quanto no exterior. Porém, quanto menor um território e seu mercado interno, mais dramático será esse efeito. Se os EUA adotarem um protecionismo mais forte, o padrão de vida médio dos americanos cairá, mas ninguém passará fome. Já se uma pequena cidade, como Mônaco, fizesse o mesmo, haveria uma quase que imediata inanição generalizada.
Imagine uma casa de família como sendo a menor unidade secessionista concebível. Ao praticar um livre comércio irrestrito, até mesmo o menor dos territórios pode se integrar completamente ao mercado mundial e desfrutar todas as vantagens oferecidas pela divisão do trabalho. Com efeito, seus proprietários podem se tornar os mais ricos da terra. 
Por outro lado, se a mesma família decidir se abster de todo o comércio inter-territorial, o resultado será a pobreza abjeta ou até mesmo a morte. Consequentemente, quanto menor for o território e seu mercado interno, maior a probabilidade de sua adesão ao livre comércio.
Caso Mao Tsé-Tung fosse o prefeito de uma pequena cidade em vez de chefe de um país de quase um bilhão de pessoas (à época), suas ideias insanas não teriam chacinado milhões de pessoas.
A segunda é que países pequenos não têm dinheiro para desperdiçar em ideias megalômanas. Coisas como guerra ao terror, guerra às drogas, invadir outros países, mandar tropas para outros países, ou espalhar bases militares ao redor do mundo não estão na agenda desses países. Uma Escócia independente, ou o Quebec, não irão invadir o Iraque. É necessário um país grande para se fazer coisas realmente insanas.
É claro que há outras questões mais prementes a serem consideradas pelos escoceses, de impostos e subsídios a empresas ameaçando ir para a Inglaterra em caso de secessão. Além de, é claro, as profundas questões histórico-culturais da região.
Ainda assim, como economistas, o que podemos dizer é que a Escócia é grande o suficiente para "sobreviver" por conta própria; e, com efeito, é bem provável que ela se torne mais rica após a secessão. É melhor se tornar pequena e rica como a Irlanda do que continuar grande e pobre (sempre em termos per capita) como o Reino Unido.