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A-24

Julian Assange: “O avanço da civilização pode levar-nos ao totalitarismo”

por A-24, em 12.12.14

Observador

O fundador do Wikileaks criticou a Google, que acusa de ser muito ambiciosa e que tenderá a tornar-se líder de mercado e a centralizar toda a informação.

O fundador do WikiLeaks, Julian Assange, advertiu hoje para o perigo de a civilização atual caminhar para o totalitarismo, em resultado da centralização de informação, e recomendou aos cibernautas a procura de caminhos alternativos a essa centralização.

O aviso foi dado num debate realizado em Lisboa, via teleconferência, emitida da embaixada do Equador em Londres, onde Assange reside há dois anos. Assange intervinha no âmbito do fórum “Reagir contra a vigilância de massas: abrir o espaço à sociedade”, integrado no Festival de Cinema de Lisboa e Estoril (L&EFFest).

“O avanço da civilização, em termos de tecnologia complexa, pode levar-nos ao totalitarismo, como resultado da centralização de informação? Essa é a verdadeira questão que tem de ser respondida”, disse o australiano, que desde meados 2012 está refugiado naquela embaixada, após o Supremo Tribunal britânico ter autorizado a sua extradição.

Assange salientou que a globalização tende a ter como resultado um líder de mercado, como a Google, e defendeu que “podemos estar a caminhar” para uma situação de centralização em todo o mundo.

“A verdade é que, à medida que os serviços de inteligência se tornam mais poderosos e mais secretos, e aumenta o fenómeno generalizado de ligação nas comunicações entre indivíduos, esses serviços tornam-se mais livres e poderosos e não há forma de escapar”, avisou.

E Assange foi ainda mais longe nas acusações à Google, defendendo que é uma empresa que está a crescer e é muito ambiciosa, e que essa ambição não acontece só nas ligações que a Google cria com o Governo e o poder norte-americanos, mas também porque a Google chega a qualquer canto do mundo.

“Vigiar cada pessoa, saber onde está, o que cada um de nós está a fazer, a ler, quem contacta”, precisou, defendendo que todos os que usam a internet, o facebook, o gmail, devem encontrar caminhos que permitam fugir dessa centralização da informação.

Assange defendeu ainda que, independentemente da verdade sobre os motivos da criação da Google, o seu modelo básico assenta no mesmo dos sistemas de segurança nacional, arrecadando informação de todo o mundo, tratando-a e organizando-a para cada pessoa.

E rebateu ainda os argumentos dos cibernautas que dizem não temer a Google ou a internet, por não terem nada a esconder: “A minha primeira pergunta é: o que está errado contigo? Deves ser muito aborrecido. Vai imediatamente arranjar algo para esconder”, disse, provocando o riso da plateia, na maioria composta por jovens.

“Estamos todos ligados, juntos, a informação viaja de uns para outros, somos amigos uns dos outros, direta ou indiretamente”, constatou, explicando que, se alguém usa o gmail para contacta uma pessoa ou publica algo sobre ela no facebook, acaba por dar informação sobre essa pessoa e sobre os seus familiares.

Assange defendeu que um dos passos importantes é tomar consciência sobre a centralização de informação e adquirir novos conhecimentos sobre alternativas de fugir a esse controlo, e recomendou: “Vão à pagina da wikileaks e comecem por ler um documento chamado ‘Google Is Not What It Seems’ (a Google não é o que parece)”.

Julian Assange revelou ainda que a WikiLeaks se prepara para libertar mais documentos secretos, mas não deu mais pormenores.

Sócrates na comunicação social francesa

por A-24, em 30.11.14
Mário Amorim Lopes

Não, o título deste artigo não é da autoria de um gangster neoliberal de direita, cuja profissão de fé passa por liquidar Sócrates na praça pública. É do Libération, esse mesmo, de Jean-Paul Sartre. A sublime ironia disto tudo é impossível de ser quantificada.


Sócrates nos Jornais de hoje

por A-24, em 23.11.14










Ninguém deu por isto, e porquê?

por A-24, em 04.11.14
Lura do grilo

Ontem, deram 48 horas aos fachas de Gaza para retirarem e, em seguida, mesmo sem qualquer provocação directa, demoliram um valente conjunto de habitações para construir um muro de protecção. A notícia não apareceu na televisão!!
E não apareceu porquê? Jornalistas distraídos? Mais compreensão com o facto de Israel ter que defender a sua população de ataques indiscriminados visando civis e especialmente a crianças? Um arrependimento pelas mentiras e facciosismo que exibem?
Não apareceu pois foi o governo egípcio que, perdendo a paciência pelas inúmeras mortes e emboscadas causadas pelas víboras do Hamas, decidiu colocar um fim às consequências de ter por vizinhos esta mole de bestas humanas.

Os jornalistas são preguiçosos ou serão todos de esquerda?

por A-24, em 31.10.14
Helena Matos

O problema dos jornalistas não é de modo algum o que criticam e investigam, mas sim o que omitem sobre determinados líderes e o acriticismo com que brindam determinadas causas.

“Tantos são preguiçosos. É verdade, preguiçosos”, disse este sábado Passos Coelho a propósito dos jornalistas, nas jornadas parlamentares do PSD/CDS. Terá dito mais. Falou de “inverdades como punhos” (um dos fenómenos mais estranhos do léxico político português foi o desaparecimento da límpida palavra mentira e a sua substituição pela retorcida inverdade.) Falou também o primeiro-ministro, aqui já, ao que parece, a propósito dos comentadores (quiçá dos comentadores filiados no PSD que aspiram a outros voos no ano de 2015), do espírito “Maria vai com as outras” de quem procura causar uma boa impressão. Mas não ficou por aqui. Foi mais longe questionando: “Porque é que aqueles que todos os dias informam os portugueses e informam mal não hão-de dar a mão à palmatória, não hão-de pedir desculpa e não dão aos portugueses um direito a ter uma informação isenta e rigorosa?”

Dizem as notícias que esta intervenção de Passos Coelho foi bastante aplaudida. Não admira: os sociais-democratas estão convencidos de que em geral a comunicação social não lhes é favorável. Pode dizer-se que isso em parte é verdade. Basta comparar as notícias sobre este governo com o respeitinho mostrado em relação ao PS ou com o doce fechar de olhos em relação ao PCP e ao BE para o poder dizer. Mas também se deve acrescentar que esta circunstância aparentemente penalizadora foi usada em proveito próprio e com grande sucesso por alguns sociais-democratas como Cavaco Silva ou Rui Rio, cujos eleitorados absolutamente convictos da parcialidade dos jornalistas em relação aos seus candidatos, se habituaram a desvalorizar e a desconfiar das notícias. E ficar imune às notícias (ou quase) durante uma campanha eleitoral é verdadeiramente estar em estado de graça.

A avaliar pelo teor da intervenção de Passos e pelas palmas ouvidas na sala do parlamento onde decorriam estas jornadas parlamentares do PSD/CDS, podemos concluir que este será um dos eixos da campanha eleitoral do PSD em 2015: nós fizemos mas os jornalistas não mostraram. A que naturalmente se seguirá não dito mas implícito: não mostraram porque querem favorecer António Costa.

Digamos que este é um argumentário com algum fundamento, mas é apenas uma parte da verdade: a boa imprensa, de que Costa inegavelmente gozou, torna-se frequentemente um presente envenenado. E no caso concreto do actual líder dos socialistas pode trazer-lhe mais problemas do que vantagens em 2015: habituado a declarar e não a debater, tendo vivido mediaticamente na redoma reservada às segundas figuras dos partidos e tendo sido geradas em torno de si expectativas redentoras para o dilema presente dos socialistas – é o socialismo compatível com a realidade? –, António Costa vai sofrer uma imensa pressão para explicar como governará de forma diferente de Passos e como será diferente de Hollande (e também de Sócrates mas esse é um outro assunto que nada tem a ver com ideologia mas sim com moral e poder).

Se Costa não for muito claro nestas matérias – e o enredo em que se enfiou em torno da discussão sobre a dívida não augura nada de bom –, arrisca-se a não se livrar dessa pressão antes da campanha eleitoral. Ora há poucos momentos mais perigosos para um político em campanha do que perder o estado de graça. Perdê-lo no poder como aconteceu a Passos faz parte do jogo. Perdê-lo em campanha pode determinar um resultado. Logo nem tudo o que parece é neste mundo das notícias dos e sobre os partidos e os governos.

Quem também não se pode dizer que sejam preguiçosos, mesmo que o pareçam, são os jornalistas. Haverá alguns que o são, mas a maior parte trabalha cada vez mais recebendo cada vez menos. Também não acho que tenham de pedir desculpas. Ou, como quaisquer outros profissionais, só terão de o fazer quando por negligência ou má-fé fizerem mal a alguém. E aí não são os políticos as principais vítimas. Ou quando o são isso acontece geralmente porque os aparelhos partidários deixaram cair alguém que lhes pode comprometer as ambições: lembram-se das notícias sobre o cansaço de Campos e Cunha numa fase em que o então ministro das Finanças começava a ser um obstáculo aos projectos megalómanos de Sócrates? E a hiper-atenção votada à pasta da Economia quando esta era ocupada pelo independente Álvaro Santos Pereira? E as notícias sobre a demissão de Nuno Crato sopradas por gente do PSD ansiosa por substituir o actual ministro por alguém que de educação nada saiba, mas que entregue o ministério à paz dos funcionários e dos sindicatos do sector? Os jornalistas têm as costas largas!

O que temos como elemento redutor e distorcivo de boa parte das notícias é uma outra coisa. Uma outra coisa que faz com que o problema não esteja no que escrevem sobre Passos, mas sim no que não escreveram sobre Sócrates. Ou que em algumas redacções tal só tenha acontecido por absoluta impossibilidade de evitar o assunto. Tal como o problema não é o que escrevem sobre os cortes nos salários, mas sim que em quarenta anos de democracia se contem pelos dedos das mãos as reportagens dignas desse nome sobre os sindicatos – de que vivem; quantos trabalhadores representam ou como são realmente escolhidos os seus dirigentes – ou sobre o mundo paralelo das empresas públicas.

O problema é acreditarem em qualquer maquete e fazerem invariavelmente equivaler o gasto do dinheiro dos contribuintes a políticas de crescimento. O problema é de cada vez que falam em pobreza colocarem a questão como se a pobreza se resolvesse invariavelmente com mais e mais subsídios. Em conclusão, o problema não é de modo algum o que criticam e investigam, mas sim o que omitem sobre determinados líderes e o acriticismo com que brindam determinadas causas. Aqui sim pode falar-se de um favorecimento não necessariamente da área da esquerda, mas sim de quem lhe usa o ideolecto.

Esse ideolecto que leva a que se escreva (e apenas para citar exemplos da passada semana) “ILGA relembra: Portugal não protege filhos de casais homossexuais” – desde quando é um dado adquirido que aquilo que a ILGA defende protege essas crianças? Ou que se conclua numa outra notícia: “Ferreira Leite arrasa Mota Soares e defende o Estado Social”. Portanto dá-se como adquirido que Ferreira Leite defende o Estado Social. Porquê? Porque defende a manutenção das prestações sociais mesmo quando estas ultrapassem o valor obtido a trabalhar? É isso defender o Estado Social? Esse ideolecto que leva ainda a que, na impossibilidade de ignorar um facto, ele seja noticiado de forma absolutamente tonta como sucedeu com o atentado que custou a vida a um bebé em Jerusalém – “Automóvel atropela transeuntes em Jerusalém”. Como se os atropelamentos no mundo fossem tão raros, mas tão raros, que o atropelamento de um bebé em Jerusalém ou noutra qualquer cidade fosse notícia por si mesmo.

Esta é aquela parte da História em que nas notícias não existem crimes mas sim desilusões – por exemplo, a descolonização portuguesa. Em que as velhas utopias de engenharia social se mantêm intactas mudando apenas de procedimento – agora são as barrigas de aluguer, no passado foram os jardins-de-infância alternativos. Em que entre nós e a felicidade está apenas o obstáculo de um papão – no passado o imperialismo ianque, agora a senhora Merkel.

Alguma vez deixará de ser assim? Não creio. Mas sempre nos resta o consolo de antecipadamente sabermos que alguns dos melhores textos dos jornalistas do amanhã serão sobre esta particular vontade de não ver dos jornalistas seus antepassados.

China, Hong Kong, Instagram e Liberdade

por A-24, em 29.09.14
Via Breitbart

China blocked the photo-sharing site Instagram over the weekend due to massive pro-democracy protests in Hong Kong. People posted pictures of police using tear gas on the demonstrators.
The photos used hash tags such as #OccupyCentral and #UmbrellaRevolution. The latter hash tag was developed after many protesters used umbrellas to defend themselves against the police. China blocked these hash tags on “Hong Kong Tear Gas” on Weibo, China’s version of Twitter, and Baidu, China’s largest search engine. However, the site is still allowed in Hong Kong.


China is well known for severe censorship laws. The Global Times, which is associated with state media People’s Daily, ran a column arguing that these protests ruin Hong Kong’s image, mainly in economics. Hong Kong, New York City, and London are the top three financial hubs in the world. The unnamed author offers excuses for China’s censorship and insists these moves help keep the peace. From the Global Times:
Radical activists in Hong Kong announced early Sunday the launch of the Occupy Central movement, raising the curtain on an illicit campaign earlier than expected. Photos of Hong Kong police being forced to disperse demonstrators with teargas have been widely circulated online across the world. These activists are jeopardizing the global image of Hong Kong, and presenting the world with the turbulent face of the city. 
....
China is no longer the same nation it was 25 years ago. We have accumulated experience and drawn lessons from others, which help strengthen our judgment when faced with social disorder.  
The country now has more feasible approaches to deal with varied disturbances.
Recent years have witnessed many severe mass incidents, but none had the ability to disturb the thinking of society. China has tackled these incidents smoothly.
Unsaid in the article is the vast differences in levels of freedom between Hong Kong and China. Hong Kong does not have censorship. The residents enjoy freedom of speech, free press, and free assembly. In a 1999 special, John Stossel demonstrated how easy it was to open a business in Hong Kong compared to America. Milton Friedman told Stossel that “Hong Kong showed us all a lesson on how to make everyone’s life better.”

Quando os "bons" também decapitam

por A-24, em 22.09.14
Ricardo Costa

Há duas semanas o Channel 4 britânico emitiu uma grande reportagem (Nigeria's Hidden War: Channel 4 Dispatches) que teve muito pouca repercussão em Inglaterra e no resto do mundo. Entre muitas atrocidades e situações extremas, a reportagem televisiva mostrava um grupo de soldados nigerianos a cortar a garganta a vários jovens numa aparente ação de retaliação pela decapitação de militares nigerianos por parte do Boko Haram, o grupo terrorista que professa o radicalismo islâmico e que espalha o terror na Nigéria, o país mais populoso de África e o maior produtor de petróleo do continente. 

O Boko Haram não é desconhecido no ocidente, sobretudo desde que decidiu raptar em série centenas de raparigas, pelo simples facto de irem à escola. As atrocidades do Boko Haram são imensas e atraem com facilidade a nossa atenção. Mas a verdade é que muitas ações de retaliação do exército nigeriano não têm qualquer repercussão entre nós, como esta reportagem do Channel 4 demonstrou, ao não ter tido qualquer efeito público. Aliás, a Amnistia Internacional tem tentado em vão chamar a atenção internacional para a "guerra suja" que devasta a Nigéria, mas só as brutalidades do Boko Haram é que são alvo de atenção.
Porque é que ações "idênticas" nos chocam ou nos são relativamente indiferentes? A questão é muito complexa e exige uma resposta filosófica ou moral, que não arrisco dar. Mas todos sabemos que as coisas são assim. No Expresso, por exemplo, sempre demos enorme atenção nas páginas do Internacional aos avanços e às loucuras do Boko Haram e pouco escrevemos sobre a resposta do exército nigeriano. Mesmo nos órgãos de comunicação social, acaba sempre por haver um lado bom ou menos mau num conflito. Quando de um lado da barricada estão grupos com os "valores" do Boko Haram, a escolha é quase automática. Gente que rapta crianças, que fuzila e decapita em série, que professa um regresso à idade das trevas, que despreza a democracia e exclui a liberdade religiosa ou qualquer direito elementar, não merece qualquer complacência.
Foi assim na Nigéria, no Mali ou no Sudão. Mas não foi assim na Síria, por uma razão extraordinariamente simples. Numa primeira fase da guerra todas as atrocidades foram atribuídas ao regime de Assad, que não hesitou em dizimar cidades ou em usar armas químicas, banidas por todos os acordos internacionais. À medida que a guerra se prolongou, a atenção virou-se a espaços para os milhões de refugiados, uma crise que pouco comoveu a comunidade internacional. Só muito mais tarde é que se começou a dar atenção a um movimento com muitos meses: a tomada de assalto por extremistas sunitas do movimento anti-Assad. É difícil aceitar isto, mas foi o facto de Assad ser "o mau" que atrasou tanto o reconhecimento do perigo que o Estado Islâmico representava para o Ocidente.
Quem criou o Estado Islâmico percebeu isto desde o início. O maniqueísmo com que se olha para uma guerra civil beneficiou-o por muito tempo, conseguindo financiamento de países sunitas da região, como o Qatar ou a Arábia Saudita, de que o Ocidente tanto gosta. Ao longo desse período em que pouco foram notados, os terroristas do Estado Islâmico já usavam as suas armas de sempre nas redes sociais: vídeos com atrocidades, mensagens e fotografias sobre a sua cavalgada heroica, relatos de como são bem tratados os que se submetem (e convertem) ao Estado islâmico e o fim que têm os que o desafiam ou são considerados apóstatas.
Os vídeos de decapitações, de fuzilamentos, de lapidações ou crucificações não são de agora. É por isso que defendo que não devem ser ignorados. Devem, isso sim, ser usados com cuidado, cortados nas suas partes chocantes e gratuitas, editados e explicados. É claro que a decapitação de James Foley elevou esta questão a um limite extremo, pela barbaridade, pela cobardia, pelo sotaque do verdugo e, sobretudo, pela proximidade da vítima. Foley é "um de nós", um ocidental que teve o azar de cair nas mãos de uns torcionários quando apenas estava a fazer o seu trabalho, absolutamente inofensivo.
A grande diferença dos dias de hoje não está na forma como jornais, televisões ou sites devem tratar este caso, mas na explosão da internet e das redes sociais. Em 2002 o jornalista Daniel Pearl foi decapitado no Paquistão, mas o vídeo pouco foi visto, apesar de ter sido notícia em todo o mundo. Dois anos depois, o vídeo da decapitação do empresário americano Nicholas Berg foi divulgado na Malásia, mas a sua visualização foi restrita. O que mudou entretanto não foi a brutalidade dos verdugos nem a natureza das vítimas, foi a força das redes sociais e dos sites de alojamento de vídeos. E mudou para toda a gente, para vítimas e atacantes, para quem está por perto ou do outro lado do mundo.
A sofisticação do estado Islâmico é evidente. Tem Apps oficiais (The Dawn of Glad Tidings ou simplesmente Dawn), tem gestores de redes sociais, adapta as hashtags até ao ponto em que são trends no twitter, tem contas sucessivas no youtube para nunca estar fora do ar e, em caso extremo, recorre a uma rede social chamada Diaspora onde os vídeos são literalmente impossíveis de serem retirados, porque ironicamente tem uma arquitetura pensada para escapar à censura dos Estados...
Ignorar a propaganda do Estado Islâmico não é uma boa opção. Podemos e devemos cortar partes chocantes e não repetir ad nauseam as imagens. Mas ignorá-las pode ter um efeito errado. É verdade que as imagens provocam o efeito pretendido ao espalhar o medo entre nós, mas não é menos verdade que os Estados Unidos e a União Europeia só acordaram para o estado Islâmico quando estas imagens chocaram os cidadãos dos seus países. Não é caso único, foi a queda do avião da Malasian Airlines que obrigou a União Europeia a deixar de ignorar que a Rússia estava a interferir no conflito ucraniano...
O maior desafio na reação à propaganda do estado Islâmico não está nas redações, mas nas redes sociais e motores de busca. As redações devem aprender a trabalhar perante uma ameaça tão sofisticada e tão bem organizada em todo o tipo de ações. Por exemplo, sabe-se agora que o célebre assalto do estado Islâmico ao Banco Central de Mossul não valeu nem de perto nem de longe os célebres 430 milhões de dólares que o Estado Islâmico divulgou.
Nas redes o desafio é muito mais complexo. O Youtube, o Facebook e o Twitter demoraram muito a responder à propagação do vídeo da decapitação de Foley. Foram muito lentos e ainda hoje os vídeos e as fotografias circulam. Num artigo no Financial Times, Zenyep Tufecki, da Universidade da Carolina do Norte, lembra que se o Estado Islâmico tivesse usado imagens não autorizadas de um concerto de Beyoncé, estas tinham sido imediatamente retiradas. Esta é a questão fundamental: qualquer imagem de Beyoncé, da Premier League ou da Formula 1 é retirada mais depressa das redes sociais que uma decapitação.
Este tema não fica por aqui. O Estado Islâmico vai estar entre nós muito tempo e vai bombardear os nossos espaços públicos, que hoje são os meios de comunicação social, mas, muito mais, as redes sociais. Um campo vasto que faz toda a diferença entre a quase indiferença da decapitação de Daniel Pearl em 2002 e a de Foley em 2014. E que faz toda a diferença entre as atrocidades do Estado islâmico e as do exército nigeriano. As redes sociais são muito assim, de modas e ondas avassaladoras. Lembram-se de Koni, que obrigava crianças a lutar ao seu lado no Uganda? Claro que não, isso já foi em 2012...

Sobre as últimas declarações do Dalai Lama

por A-24, em 26.07.14
Gladius via El Manifesto

O Dalai Lama, máxima autoridade espiritual do Tibete, esteve seis dias de Junho em Itália, onde levou a cabo diversos encontros espirituais e discursos vários. Num destes encontros foi questionado, por alguém na assistência, a respeito do grave problema da imigração em Itália.
O tibetano respondeu assim:

«Os imigrantes aqui são demasiados. Vocês devem ter a coragem de dizer basta. 
Costuma dizer-se que os refugiados estão a fugir de algo mas o bom coração não é suficiente para dar-lhes refúgio e temos de ter a coragem de dizer quando são demasiados, bem como de intervir nos seus países para construir aí uma sociedade melhor. Não se pode pensar que o acolhimento dos imigrantes é solução para resolver o problema. Os Italianos, principalmente os Sicilianos, estão a demonstrar um grande coração, mas para resolver o problema dos refugiados é necessário intervir nesses países e envidar esforços para superar as guerras, frequentemente de fundo religioso, e ajudar a superar a enorme brecha entre ricos e pobres para construir uma sociedade melhor. Isto necessita de um pensamento a longo prazo para conseguir algo realmente eficaz.»

Ora o Dalai Lama é personagem mais que grata a nível mediático em geral. Recebeu o Prémio Nobel da Paz em 1989 e mais de cento e cinquenta reconhecimentos (prémios, doutoramentos honoris causa, etc.). Claro que um alógeno não tem de ser tido nem achado no que toca à política europeia, por mais prémios que receba, bem entendido, mas a questão não é essa. O que realmente tem graça aqui é que o Dalai Lama é actualmente um dos gurus da politicagem correcta dominante no Ocidente, pouco abaixo de Mandela ou de Gandi... Não há nenhum ocidental dado como «bem-pensante» e amante da humanidade e auto-proclamadíssimo cidadão do mundo que não teça loas à figura do dito tibetano assim que em tal indivíduo se fala. O silêncio me(r)diático tuga a respeito destas declarações, o silêncio dos mé(r)dia dominantes cá no burgo, torna-se por isso particularmente divertido. Quem diria que o amadíssimo Dalai Lama havia de dizer sobre a imigração o mesmo que dizem os nazis e xenófobos e fascistas e até mesmo porcos fassistas, quem diria...

Em Itália as declarações tiveram repercussões. Mario Borghezio, da Liga do Norte, congratulou a claridade do pensamento do líder tibetano, em contraposição à do papa Francisco, que abriu as portas das igrejas e conventos da Sicília aos imigrantes, independentemente de serem legais ou ilegais.

Dois pesos e duas medidas, para não variar

por A-24, em 19.07.14

A vitória da Argentina na imprensa sul-americana

por A-24, em 10.07.14