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A-24

Interstellar: odeia, odeia a luz que começa a morrer

por A-24, em 17.11.14
No filme Interstellar surge um buraco de minhoca, que cria um atalho no espaço-tempo, e que do outro lado tem planetas estranhos. Mas este não é um filme sobre o espaço interestelar, é sobre o homem. É um hino à vida ao enfatizar a luta com a morte que a ciência permite.

O verso “Odeia, odeia a luz que começa a morrer” é de Dylan Thomas, o escritor galês cujo centenário se está a comemorar. A respectiva estrofe é repetida por um dos personagens do filme “Interstellar”, do realizador norte-americano Christopher Nolan, que acaba de se estrear em Portugal e em todo o mundo. Quem a repete é o professor John Brand (Michael Caine), um físico da NASA que procura o mistério último da gravidade e, com ele, a esperança de salvação para uma humanidade ameaçada. O verso de Thomas, que inspirou o título de um romance de António Lobo Antunes, abre um poema belíssimo: “Não entres docilmente nessa noite serena,/ porque a velhice deveria arder e delirar no termo do dia,/ odeia, odeia a luz que começa a morrer.



Interstellar é uma glosa cinematográfica do tema da morte, neste caso o apocalipse do nosso planeta devastado por tempestades e pragas. Como ocorre em geral nos seus tratamentos artísticos, também aqui a morte é recusada. Escreveu um outro poeta, o alemão Friedrich Hoelderlin: “Onde cresce o perigo, surge também a salvação.” A redenção é, no filme, proporcionada pela ciência e pela sua filha dilecta, a tecnologia.
Desvendemos um pouco do enredo, tentando não desmanchar o prazer dos leitores que ainda não viram. Num futuro indeterminado, vastos campos de milho surgem cobertos por nuvens de poeira e são pasto de doenças. Nesse mundo distópico, com o ar a ficar irrespirável, a ciência e a tecnologia quase desapareceram. Na escola ensina-se que a ida à Lua não passou de um embuste. E os estudos superiores são um capricho face a necessidades básicas de sobrevivência.
É nesse cenário que um agricultor, ex-piloto de testes da NASA, Joe Cooper (Matthew McConaughey), tenta manter a sua família: a espertíssima filha adolescente Murph (em jovem Mackenzie Foy e, mais tarde, Jessica Chastain), o filho e o seu sogro, já que a mulher tinha morrido de um tumor na falta de uma ressonância magnética. Tal cenário dantesco está longe de ser novo na ficção científica: lembrei-me de Um Cântico a Leibowitz, de Walter Miller, onde a humanidade regressa à Idade Média após um desastre nuclear e só um conhecimento muito escasso sobrevive. O filme não é claro sobre a origem do “fim do mundo”. Há uma referência ao Dust Bowl, uma série de tempestades de pó que ocorreram, por incúria humana, durante a Grande Depressão, originando fome e miséria: surgem depoimentos autênticos em vídeo de sobreviventes desses anos. O fim no filme não é, portanto, uma explosão nuclear, mas sim o silêncio imposto pela falta de ar. Como escreveu ainda outro poeta, T. S. Eliot: “É assim que acaba o mundo./ Não com um estrondo,/ mas com um suspiro.”

O que é um buraco de minhoca?
Enquanto há vida há esperança. E a esperança irrompe aqui, de um modo estranho, a meio de uma estante. No quarto de Murph surgem sinais, que enviam Cooper para uma secretíssima base da NASA, às ordens do professor Brand. Ao despedir-se comoventemente da filha, o pai não sabe que lhe está destinado o papel de salvador da humanidade. É enviado para Saturno a bordo de uma estação espacial, pois é lá que se encontra a entrada de um buraco de minhoca, isto é, um atalho ou túnel no espaço-tempo para um longínquo domínio interestelar.


E é do outro lado do buraco que vai partir à aventura para planetas para os quais tinham sido enviados pioneiros com o intuito de encontrar refúgio para a humanidade. O plano principal do professor consistia em domar a gravidade para enviar o que restasse da espécie humana a povoar as novas terras encontradas.
O que são buracos de minhoca? Uma ideia dos físicos teóricos que exige uma prodigiosa distorção do espaço-tempo. Segundo a teoria da relatividade geral de Albert Einstein, invocada repetidamente ao longo do filme, o espaço está ligado ao tempo (o espaço-tempo), a matéria à energia (a matéria-energia) e a matéria-energia comanda o espaço-tempo.
Matéria-energia muito densa pode contorcer o espaço-tempo para formar um tubo. O aproveitamento cinematográfico do conceito não é novo. Já o astrofísico Carl Sagan o tinha feito em Contacto, livro que serviu de guião a um filme onde McConaughey entrou, tendo recorrido aos préstimos do seu colega Kip Thorne. Thorne foi agora o consultor científico de Nolan. O aproveitamento das suas especulações era uma ideia que estava na carteira de Steven Spielberg, o realizador de Encontros Imediatos de Terceiro Grau e deAI, mas este cedeu-a a Nolan, o autor de Memento e de O Cavaleiro das Trevas.
O que há de real nos buracos de minhoca? De facto, não se conhece nenhum. Discute-se, porém, em artigos de física, a possibilidade de os construir, que exigiria não só matéria exótica que dobrasse o nosso espaço-tempo a quatro dimensões mas também possivelmente dimensões adicionais. Um físico companheiro de Cooper explica-lhe no filme com a ajuda de uma folha de papel: marca dois sítios, a entrada e a saída do buraco, e diz que eles ficam ligados se se dobrar a folha, isto é, permitindo outra dimensão. O tema das dimensões adicionais é corrente hoje na cosmologia e na física quântica, apesar de não haver provas da sua existência. A ideia agradou a Einstein por proporcionar a unificação das várias forças da natureza, o seu grande sonho que ainda não se materializou. É nesse assunto que o professor Brand trabalha, no futuro onde o filme nos mergulha.
E o que há do outro lado do buraco de minhoca? Planetas estranhos, um deles tão estranho como as paisagens da Islândia, uma vez que parte do filme foi aí rodado, e um buraco negro gigante, o Gargantua, que teve de ser criado virtualmente. Entre outros truques científicos, o enredo envolve a animação suspensa de astronautas, que consiste na suspensão das funções vitais de uma pessoa em hipotermia, e a disseminação de embriões humanos noutros planetas, criopreservados pela bióloga Amelia Brand (Anne Hathaway), filha do professor. Há também uma profusão de truques cinematográficos, como as imagens panorâmicas tiradas por câmaras IMAX e um nível de som que pode incomodar os ouvidos mais sensíveis e que contrasta violentamente com o silêncio sideral. E há truques científicos que combinam com truques cinematográficos como os cálculos que Kip Thorne efectuou para obter imagens do buraco negro o mais realistas possível.

Trama científica impecável
Como o buraco negro tudo atrai, desde a luz até à curiosidade humana, os nossos heróis acabam por se precipitar para o Gargantua. Cooper entra no buraco negro para obter segredos da força gravitacional com a ajuda de um robô não humanóide a quem o argumentista deu deixas muito engraçadas (faz lembrar o HAL de 2001 Uma Odisseia do Espaço, de Stanley Kubrick, uma das influências reconhecidas por Nolan). Esta é a parte que parece mais inverosímil de toda a trama, cuja base científica é em geral impecável, incluindo as especulações aparentemente desenfreadas sobre a passagem do tempo. Dentro do buraco negro Cooper cai em dimensões superiores, numa tecelagem por trás da estante do quarto da miúda. Sim, miúda, porque Cooper viajou para trás no tempo no interior de Gargantua. Consegue enviar sinais cifrados para o quarto. E Murph consegue recolhê-los.
O Homo sapiens salva-se? Sim, graças à drª. Murph, que acabou por seguir física teórica e prosseguir o projecto do professor Brand (o nome dela afinal enganava pois, contrariando o princípio de Murphy, tudo vai correr bem!). E Cooper fica sepultado no tenebroso buraco negro? Não, porque não era totalmente negro. Vai dar a uma base espacial, em Saturno, para onde a população da Terra, ajudada pelos conhecimentos de física, se tinha conseguido escapar. Ainda chega a tempo de assistir à morte da sua filha, com 124 anos, enquanto ele continua relativamente jovem. É o famoso “paradoxo dos gémeos”, enunciado pelo físico francês Paul Langevin, contemporâneo de Einstein: um gémeo que vá a estrelas distantes à velocidade próxima da luz e volte consegue manter a juventude, enquanto o irmão imóvel na Terra envelheceu.

Contado assim (ou melhor, semi-contado, porque não é melhor não contar as peripécias surpreendentes do longo e engenhoso enredo) até parece ficção científica de série B. Mas não, é um dos grandes filmes do nosso tempo, um tempo dominado pela ciência mas ensombrado pelos riscos. Para além de estar muito bem realizado (talentosos actores e portentosas naves consumiram um orçamento equivalente ao Euromilhões), a obra de Nolan não é sobre o espaço interestelar mas sim sobre o homem, a parte do Universo que afinal mais nos interessa. É um hino à vida ao enfatizar a luta com a morte que o conhecimento científico permite.
Voltemos a Dylan Thomas: “Odeia, odeia a luz que começa a morrer.” Mais do que na ciência, o triunfo da vida baseia-se aqui no amor, um sentimento bem claro na ligação cósmica entre pai e filha. Um ser humano vai ao fundo da escuridão, ao interior do buraco negro, em busca de luz para dar à filha. É um representante da humanidade que destemidamente recusa o fim da espécie, mas, para isso, tem de conjugar o conhecimento com o amor. O conhecimento sozinho não chega para salvar ninguém.

Professor de física da Universidade de Coimbra (tcarlos@uc.pt)

25 anos da queda do muro: Dez filmes para recordar o Muro de Berlim (e a RDA)

por A-24, em 11.11.14
Observador

Logo que foi erguido, o Muro de Berlim tornou-se no símbolo mais tangível, concreto e sinistro da Guerra Fria e do totalitarismo comunista, dividindo uma cidade, famílias, amigos e amantes, e passando a representar a cisão do mundo em dois blocos ideológicos incompatíveis. No próprio dia em que começou a ser construído, a 13 de Agosto de 1963, havia um filme americano a ser rodado em Berlim, ‘Um, Dois, Três’, de Billy Wilder, e o cinema, com Hollywood logo à cabeça, rapidamente começou a produzir filmes ambientados na capital alemã dividida, que originaram um subgénero de espionagem. Mais tarde, o cinema alemão começaria também a filmar o Muro, e Berlim cortada ao meio, para reflectir sobre a sua identidade e o significado mais profundo da construção para os berlinenses e para a história da Alemanha. Eis 10 dos filmes mais emblemáticos sobre o Muro de Berlim, a Guerra Fria e também a vida nas duas Alemanhas durante esse período.

 1. ‘Um, Dois, Três’, de Billy Wilder (1963)
Esta comédia satírica de Billy Wilder estava a ser filmada em Berlim quando o Muro começou a ser erguido e a fronteira entre Berlim Ocidental e Berlim Leste foi fechada, obrigando a produção a mudar-se para Munique e recriar lá, parcialmente, a Porta de Brandenburgo. James Cagney interpreta um executivo da Coca-Cola que tem que impedir que a filha de um dos seus patrões se case com um jovem alemão comunista, que a quer levar para Moscovo.  O filme estraleja com gags do tempo da Guerra Fria, e se Wilder se farta de cravar bandarilhas no comunismo, também reserva algumas farpas para o capitalismo consumista, representado pela personagem de Cagney, numa das suas fabulosas interpretações a 200 a hora. O filme foi muito mal recebido pelos liberais mais esquerdistas de Hollywood, que à altura ainda tentavam pintar o comunismo com tintas suaves.


2. ‘O Espião que Veio do Frio’, de Martin Ritt (1965)
Adaptado de um dos melhores livros de John Le Carré por um dos autores do argumento de ‘007-Contra Goldfinger’, ‘O Espião que Veio do Frio’ é o melhor filme tirado de uma obra daquele, e calmamente, o melhor já rodado sobre a Guerra Fria e envolvendo o Muro de Berlim, com uma interpretação esmagadora de Richard Burton no papel de Alec Leamas, um agente inglês que simula passar para o lado comunista. Longe do maniqueísmo espectacular das histórias de James Bond, esta é uma visão amarga,  enviesada  e desencantadamente realista da Guerra Fria, da moralidade movediça do mundo da espionagem e do confronto entre as democracias ocidentais e o bloco de Leste. Le Carré, aliás David Cornwell, sabe bem do que fala, porque trabalhou para o MI6 e esteve colocado em Berlim nesta altura.

3. ‘O Meu Funeral em Berlim’, de Guy Hamilton (1966)
E depois de John Le Carré, o seu colega Len Deighton, num filme assinado por um realizador inglês que também fez filmes de 007. Michael Caine volta aqui a interpretar o papel de Harry Palmer, um antigo ladrão tornado agente secreto, criado por Deighton em ‘O Caso Ipcress’. Palmer é desta vez mandado para Berlim, para coordenar a fuga de um general comunista para o Ocidente, mas as coisas não correm tão bem como se poderia pensar. Para a pequena história dos filmes de Guerra Fria, fica o facto dos guardas russos do lado de Berlim Leste terem tentado impedir a rodagem das cenas em Checkpoint Charlie, usando espelhos para lançar a luz do sol sobre as câmaras da produção e encandear os actores e a equipa técnica.

4. ‘A Cortina Rasgada’, de Alfred Hitchcock (1966)
Hitchcock foi acusado de “anticomunismo primário” por alguma crítica de esquerda por ter rodado este filme de espionagem onde Paul Newman faz um cientista americano que finge fugir para a RDA, onde vai buscar uma fórmula secreta. O estúdio forçou Hitchcock a dar o papel principal a Newman em vez de Anthony Perkins, a escolha do realizador, e o papel feminino a Julie Andrews ao invés de Eva Marie Saint, e ‘Cortina Rasgada’ ficou também marcado por uma zanga entre o realizador e o compositor Bernard Herrmann, que marcou o fim da sua lendária parceria. Apesar de Hitchcock não ter gostado do resultado final, ‘Cortina Rasgada’ tem mesmo assim vários momentos fortíssimos de suspense e um punhado de cenas inspiradas.


5. ‘As Asas do Desejo’, de Wim Wenders (1987)
Realizado dois anos antes da queda do Muro de Berlim, este filme de Wim Wenders é o mais fantástico, poético e emocionalmente atmosférico ambientado na cidade dividida.  Bruno Ganz é Damiel, um dos dois anjos encarregues de percorrer Berlim Oeste, testemunhando a existência das pessoas, captando os seus sentimentos e tentando oferecer-lhes algum conforto.  Damiel perde as asas e torna-se de carne e osso para poder ter mais empatia com os humanos que observa e entendê-los, e trava amizade com um famoso actor americano (Peter Falk) que está em Berlim a fazer um filme policial passado na II Guerra Mundial. Único e belíssimo, com uma Berlim filmada (e sentida) por um cineasta alemão, e fotografada a preto e branco e a cores pelo grande Henri Alekan.


6. ‘The Legend of Rita’, de Volker Schlondorff  (2000)
Nunca estreado comercialmente em Portugal, ‘The Legend of Rita’ (‘Die Stille nach dem Schuss’, no título alemão original) conta a história de Rita Vogt (Bibiana Beglau), uma militante de extrema-esquerda alemã que odeia o sistema capitalista e acredita que é do outro lado do Muro que existe uma socidade verdadeiramente livre, justa e defensora dos trabalhadores e dos seus direitos. Depois de roubar um banco com outros camaradas, Rita foge para o outro lado e, com o beneplácito da Stasi, muda de identidade e instala-se na RDA. Mas o Muro de Berlim cai, a RDA desfaz-se e Rita tem que enfrentar as consequências do seu passado. ‘The Legend of Rita’ inspira-se na vida da militante anarquista Inge Viett, dissidente da Fracção do Exército Vermelho.


7. ‘The Tunnel’, de Roland Suso Richter (2001)
Também nunca exibido em Portugal, ‘The Tunnel’ (‘Der Tunnel’) baseia-se noutra história real, a de Hasso Herschel, um campeão de natação da Alemanha de Leste, que fugiu para o Ocidente em 1961, depois de ter estado preso por contestação ao regime comunista, e mais tarde, juntamente com uma série de amigos, organizou a fuga para Berlim Ocidental da irmã e da sua família, cavando um longo túnel. Além das incríveis dificuldades logísticas que a tarefa envolve, há também que temer as pessoas que, no lado de lá, podem denunciar os fugitivos às autoridades. Roland Suso Richter assinou uma fita tão realista quanto empolgante, que virou um clássico dos “filmes de fuga”.


8. ‘Adeus, Lenine!’, de Wolfgang Becker (2003)
Esta premiada e aclamadíssima comédia dramática de Wolfgang Becker é uma história de amor filial tendo como pano de fundo a queda do Muro de Berlim e o colapso do comunismo. A mãe de Alex (Daniel Bruhl), uma fervorosa e activa comunista , sofre um ataque de coração em 1989 e fica vários meses em coma. Quando acorda, o Muro caiu, e o filho, para a proteger do choque, faz tudo para que, no seu apartamento daquela que foi Berlim Leste, ela não se aperceba que a ideologia que defendia perdeu o combate, e o mundo onde vivia se desmoronou.  Grandes papéis do jovem Bruhl e de Katrin Sass na mãe, e muitas e boas piadas sobre a vida na antiga RDA, o choque da reunificação e a chegada do capitalismo consumista ao Leste.


9. ‘As Vidas dos Outros’, de Florian Henckel von Donnersmarck (2006)
Vencedor do Óscar de Melhor Filme Estrangeiro, ‘As Vidas dos Outros’ passa-se em 1984, quando um zeloso capitão da Stasi, Gerd Wiesler (Ulrich Muhe), é encarregue das escutas da casa onde habitam um famoso dramaturgo e a sua namorada, uma popular actriz. À medida que os vai escutando, Wiesler, que gosta e saboreia o que faz, sente-se cada vez mais fascinado pela vida íntima do casal. ‘As Vidas dos Outros’ é parte ‘thriller’ político, parte drama voyeurístico, parte retrato arrepiante de um estado policial onde a privacidade dos cidadãos não vale um tostão furado para o poder. O próprio Ulrich Muhe, que viveu no Leste, foi escutado pela polícia política da RDA e descobriu, depois da queda do Muro, que a mulher, também actriz, era informadora da Stasi.


10. ‘Bárbara’, de Christian Petzold  (2012)
Alemanha de Leste, 1980. Bárbara, uma médica que exerce clínica em Berlim Leste, candidata-se a um visto para sair do país e juntar-se ao homem que ama, que conseguiu instalar-se no outro lado do Muro.  Como castigo, é enviada para um hospital de uma vila no interior da RDA, ficando sob a vigilância da Stasi local. O namorado tenta organizar a sua fuga, e enquanto isso, Bárbara vai tentando ambientar-se à vida no campo, nunca sabendo quem entre os locais ou os colegas poderá ser um informador da polícia política. A excelente Nina Hoss, uma das maiores actrizes alemãs de hoje, interpreta o papel do título, num filme tão interessado na personalidade da sua heroína como no quotidiano vigiado da vida na RDA, e que tem um final surpreendente. Christian Petzold ganhou o Urso de Prata no Melhor Realizador no Festival de Berlim.

Cinema: Queer Lisboa

por A-24, em 30.09.14
"Appropriate Behavior", de Desiree Akhavan: É difícil não pensar em "Girls" ao vermos esta primeira obra de uma realizadora que acumula também as funções de argumentista e actriz principal. Mas se o arranque parece oferecer apenas mais uma comédia new yorker e hipster - ambientada em Brooklyn, nem mais -, Desiree Akhava consegue ir deixando algumas singularidades ao longo de um filme sempre a crescer no nível de graça e interesse.
Shirin, protagonista inspirada nela própria, é uma jovem neurótica, desbocada e insegura cuja ascendência iraniana torna ainda mais complicado apresentar a sua namorada aos pais. O fim do relacionamento marca o início de um filme que alterna presente e passado e vai acrescentando camadas a uma personagem com um potencial para criar irritação ao primeiro embate. "Appropriate Behavior" diverte (às vezes, muito) pela forma como a vai atirando para situações constrangedoras, quase sempre motivadas pela sua atitude, mas tem o cuidado de não a espezinhar ou massacrar. Desiree Akhavan gosta demasiado de pessoas para isso, dá-lhes a possibilidade de redenção e sabe como conjugar sarcasmo e ternura. No final, acaba por ser difícil não ganharmos afeição por Shirin, aí já longe de uma sucedânea da série de Lena Dunham e muito mais a voz de uma autora a ter debaixo de olho.

Via Gonn  1000

Afinal somos todos Scarlett Johansson, ou Lucy

por A-24, em 21.08.14
O filme de Luc Besson parte do "mito urbano" que diz que o ser humano não usa 100% do cérebro. Mas ainda assim vale a pena ver este thriller de ação, protagonizado por Scarlett Johansson.

Scarlett Johansson, ou Lucy, só tinha de entregar uma mala misteriosa, mas acaba coagida para ser “mula” de uma droga revolucionária. Quando a droga sintética rebenta no seu estômago, estranhas reações fazem com que Lucy passe a usar 100% do cérebro, o que se traduz em poderes sobre-humanos. É esta a premissa do novo filme de Luc Besson, que estreia em Portugal esta quinta-feira. Mas Lucy somos já todos nós.

“Estima-se que a maioria dos seres humanos use apenas 10% da capacidade cerebral. Imagine se conseguissemos ter acesso a 100%. Aconteceriam coisas interessantes.” Uma deixa do professor Norman, interpretado por Morgan Freeman, no filme “Lucy”, mas que poderia ter sido proferida por qualquer pessoa na vida real. O mito persiste, mas é errado. A verdade é que o ser humano usa a quase totalidade do cérebro. Sem recurso a qualquer droga.
Tentando esquecer que a questão principal do filme é um “mito urbano”, o que temos em “Lucy” é um thriller de ficção científica e efeitos especiais, produzido por Virginie Besson-Silla da EuropaCorp. Luc Besson dirige Scarlett Johansson para que a sua metamorfose de estudante americana em Taiwan para implacável guerreira sobre-humana se torne no centro do filme. OBSERVADOR

Cinema: Jovem e Bela

por A-24, em 10.06.14
Via Adoro Cinema

A adolescência sempre foi um terreno arenoso para estudiosos e continuará sendo um momento marcante para todos os que passam por essa fase das descobertas. Em Jovem e Bela, o cineasta François Ozon nos faz observar durante as quatros estações do ano, as mudanças ocorridas na vida da protagonista aos 17 anos, quando "ninguém é sério", segundo o poeta Rimbaud. Será?

Jovem e Bela -Isabelle (Marine Vacth) mantém uma relação fria com a mãe e o padrasto, ao contrário de uma cumplicidade quase insana com o irmão mais novo. Durante uma viagem de férias com a família, subverte a visão mais romântica da expressão "amor de verão" e a traduz em um simples passaporte para a perda da virgindade. No outono, mente sobre a idade e excitada pelo misterioso jogo de não saber com quem irá se encontrar, embarca na prostituição em troca de uma pretensa independência. Sozinha em suas aventuras sexuais, vivencia momentos distintos, como quem abre uma caixa de bombons e experimenta os diferentes sabores. E se o inverno traz as consequências de um trágico acontecimento, é com a chegada da primavera que ela desabrocha, descobrindo-se mais madura que seus pares, mesmo que ainda sem se dar conta do alto preço que pagou.
Jovem e Bela - FotoPara não deixar dúvidas quanto a sua, digamos, fixação voyeurista, o diretor abre sua obra com uma emblemática sequência inicial pela lentes de um binóculo (veja você), para logo em seguida vermos a bela jovem se masturbando com o travesseiro, também através dos olhos do irmão caçula. Tudo isso para iniciar você nessa jornada, que muitos poderão ver conexão com A Bela da Tarde, clássico de Luis Buñuel, mas a fêmea de Ozon ainda "engatinha" em sua vida dupla, mesmo que a passos largos, e não esboça muita emoção. Essa frieza, por sinal, pode até incomodar os mais desejosos, mas a iniciação sexual dela sintetiza bem essa estranheza que irá permear suas experiências. Aos que imaginam ser esse um tema batido, o pensamento não está errado, mas é certo afirmar que o roteiro não é raso e você pode se deliciar com suas indagações, porque o julgamento é todo seu.
Jovem e Bela - FotoAssim, a trama que conquistou o Festival de San Sebastián e concorreu a Palma de Ouro em Cannes 2013, proporciona ao espectador um sexual, às vezes tenso, mergulho nas estações da personagem. Tudo devidamente encaixado com a bonita trilha de Philippe Rombi, que "copula" perfeitamente com as (também) quatro canções de Françoise Hardy, "L’amour d'un garçon" (1963), "À quoi ça sert" (1969), "Première rencontre" (1973), "Je suis moi" (1974), que ajudam a contar um pouco desta curiosa história. Para os que conhecem o trabalho do diretor e roteirista, Jovem e Bela tem ainda um leve humor (sarcástico), além de uma pequena participação da veterana e parceira Charlotte Rampling, mas o destaque é todo de sua atriz novata. O filme pode ser menor que o recente Dentro da Casa (2012), mas é igualmente grande em sua vocação para provocar a reflexão. E até o fim. Com trocadilho, vale o programa!

Logo à noite estarei em El Paso

por A-24, em 01.08.13
Há uma ponte a dividir dois mundos. De um lado, território dos Estados Unidos - estamos em El Paso, cidade aparentemente pacífica, com apenas meia dúzia de homicídios por ano. Do outro, o inferno na terra: Ciudad Juárez, já no México - a povoação mais perigosa do planeta, onde as malhas do crime ditam a lei. Em 2009, cerca de 2600 foram aqui assassinadas.


Há uma ponte. E, nessa ponte, um cadáver. Precisamente a meio da ponte. Há pontes que unem, mas esta separa. E até o cadáver, ao contrário do que se julgava, vem separado.
O assassínio da juíza cometeu-se de que lado da fronteira? Esta é uma das incógnitas que ficam a pairar desde os instantes iniciais, numa atmosfera nocturna (The Bridge, com reminiscências óbvias do film noir, é uma série inseparável da noite, ameaçadora e viscosa). Outra incógnita relaciona-se com a vida dupla do passageiro da ambulância que fura o bloqueio policial: que mistérios se ocultavam sob a sua verdadeira identidade?
É um policial, claro. Mas parece muito mais que isso: basta olharmos pela primeira vez o rosto magoado da detective Sonya Cross (Diane Kruger), que já viu demasiados corpos vitimados pela violência gratuita ao longo do seu percurso profissional. Entender-se-á ela com Marco Ruiz (Demian Bichir), o seu inesperado parceiro mexicano na investigação do crime, um homem de quem aparentemente tudo a separa?
The Bridge conquistou-me à primeira vista: raras séries o conseguem. Tornei-me espectador fiel. Mais logo, na Fox, são transmitidos, em dose dupla, o primeiro (em repetição) e o segundo episódios.
Não quero saber da crise política nem dos comentadores encartados que falham todos os prognósticos, serão após serão: logo à noite estarei em El Paso.

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Palma de Ouro para as actrizes e realizador de La Vie d'Adèle

por A-24, em 27.05.13
O filme La Vie d'Adèle Chapitres 1 et 2, recebeu este domingo a Palma de Ouro no 66.º Festival de Cannes. Em palco, as actrizes Adèle Exarchopoulos e Léa Seydoux e o realizador franco-tunisino Abdellatif Kechiche emocionaram-se.

As expectativas confirmaram-se e La Vie d’Adèle Chapitres 1 et 2, do franco-tunisino Abdellatif Kechiche, foi o vencedor da Palma de Ouro da 66.ª edição do Festival de Cannes.

O júri quis, com este prémio, homenagear não apenas o trabalho do realizador, mas das duas actrizes, Léa Seydoux e Adèle Exarchopoulos, nesta adaptação de uma novela gráfica, Le Bleu est une couleur chaude, de Julie Maroh, que conta a educação sentimental e sexual de uma rapariga, no filme chamada Adèle, a partir do coup de foudre por uma Emma de cabelos azuis. A Palma, frisou Steven Spielberg, o presidente do júri, foi para premiar o trabalho de três artistas.



O Grande Prémio foi para Inside Llewyn Davis, dos irmãos Coen, uma recriação da cena folk em Nova Iorque no final dos anos 1950 antes da explosão do fenómeno Bob Dylan.
O júri considerou como Melhor Realizador o mexicano Amat Escalante, que em Heli filma a violência extrema num país, o México, consumido pelo medo.


O prémio de Melhor Interpretação Masculina foi para Bruce Dern, um dos tesouros do cinema americano dos anos 1970, que em Nebraska, de Alexander Payne, faz o papel de um homem que acredita que ganhou um milhão de dólares e obriga o filho a levá-lo do Montana ao Nebraska.

O prémio de Melhor Interpretação Feminina foi para Bérénice Bejo, pelo seu papel em Le Passé, do iraniano Ashgar Farhadi – uma mulher envolvida num drama conjugal entre o marido de quem se vai divorciar e a nova relação que iniciou.


O chinês Jia Zhangke venceu o Melhor Argumento com A Touch of Sin, enquanto o Prémio do Júri distinguiu Tel Père, Tel Fils, de Hirokazu Kore-Eda, que regressa uma vez mais ao universo da infância com a história de um pai que descobre que o filho que pensava ser dele não é.


O prémio Câmara de Ouro, que pode ser atribuído a qualquer primeira obra presente no festival, independentemente da secção (e por um júri diferente do do palmarés principal), distinguiu o filme Ilo Ilo, de Anthony Chen, realizador de Singapura.

Portuguesa filma mutilação genital não como "barbárie", mas como "acto civilizacional"

por A-24, em 29.04.13
É a primeira vez que o tema da mutilação genital feminina que, em Portugal, afecta sobretudo as mulheres de algumas etnias originárias da Guiné-Bissau, é tratado numa ficção nacional.
Inês Oliveira disse à Lusa que decidiu filmar ‘Bobô’ depois de conhecer uma mulher guineense. "A história nasceu de uma forma um pouco espontânea", explica, reconhecendo que, quando ouviu falar da prática, julgava que "era uma coisa que acontecia muito longe, algures entre tambores", em África.
‘Bobô’, que hoje é exibido na Culturgest, às 21h30, no âmbito do festival de cinema IndieLisboa, conta a história da relação entre duas mulheres, Sofia, portuguesa, e Mariama, guineense, com diferentes "maneiras de estar no mundo".
"Sabia muito pouco sobre o assunto e tinha aversão, e ainda hoje tenho, mas não conseguia contextualizar", conta Inês Oliveira, que optou por tratar o tema "do ponto de vista do simbólico e não analisá-lo tanto do ponto de vista físico".
A mutilação genital feminina "é muitas vezes" tida "como uma barbárie, quando, na verdade, é um ato civilizacional, ou seja, é fruto de uma necessidade, de uma vontade de capitalizar as jovens raparigas", destaca. "É acompanhada de um ritual que é tomado como educação. Há uma escolinha onde elas [as meninas] aprendem uma série de lições de vida", explica.
O objectivo é controlar a sexualidade feminina", mas esse fim é comum a "todas as civilizações, porque a mulher pode mentir em relação ao pai da criança", diz.
Quando a conheceu, há dois anos, a actriz guineense Aissato Indjai, que interpreta Mariama, "mal falava português". Era "muito orgulhosa da sua cultura", mas também "crítica", e deu "um valor de autenticidade" ao filme.
A realizadora nunca abordou o assunto da mutilação com Aissato Indjai. "Acho que é um assunto da intimidade das pessoas. Muitas pessoas que foram submetidas à prática não querem ser vistas como vítimas e eu percebo isso perfeitamente. Eu própria, se fosse excisada, não o diria", frisa.
A comunidade imigrante guineense que foi "conhecendo" ao longo das filmagens é "muito típica, em todas as suas qualidades e defeitos", resume.
Recordando a comunidade portuguesa em França, realça que "há sempre uma cristalização da essência nacional nas comunidades imigrantes".
"Como os portugueses em França também comem o seu bacalhau sempre que podem e ouvem a música portuguesa e há ali uma exacerbação do ser português, também os guineenses assim o fazem, porque há uma luta de sobrevivência da sua identidade, étnica e nacional", compara.
Na comunidade guineense, encontrou pessoas com "opiniões muito distintas" sobre a prática da mutilação genital feminina. "Não consigo generalizar e dizer que maioria das pessoas são contra ou a maioria das pessoas são a favor", diz.
No filme, Mariama decide fugir com a irmã, Bobô, para evitar que ela seja submetida à mutilação. "Era importante ser ela própria, a Mariama, a insurgir-se, e não ser a Sofia a fazê-lo", assume.
‘Bobô’, que está em competição no IndieLisboa e volta a ser exibido na sexta-feira, às 19h ainda não tem data de estreia nas salas nacionais.
Notícias ao minuto

"Argo" vence Óscar máximo, numa noite com prémios para todos

por A-24, em 25.02.13


iOnline - "Argo" foi considerado o melhor filme pela academia norte-americana. O prémio foi entregue numa parceria entre Jack Nicholson e Michelle Obama, uma das supresas da noite. Ang Lee venceu o estatueta de melhor realizador pelo filme "A Vida de Pi".
O primeiro prémio da noite foi entregue a Christoph Waltz, que leva a estatueta de melhor actor secundário pela sua participação no filme "Django", de Quentin Tarantino. Anne Hathaway venceu o prémio de melhor actriz secundária com o seu papel em "Os Miseráveis". Ainda nas categorias de interpretação, Jennifer Lawrence foi considerada a melhor actriz em "Guia para um final feliz" eDaniel Day Lewis o melhor actor em "Lincoln".
"Django" ganhou ainda o óscar para melhor argumento original e "Argo" o prémio de melhor argumento adaptado.
Amour”, de Michael Haneke, venceu o óscar de melhor filme estrangeiro.

A curta-metragem de animação "Paperman" foi a vencedora e "Brave" ganhou a estatueta de melhor filme de animação.

"Curfew", de Shawn Christensen, venceu o óscar de melhor curta-metragem e "Inocente" o de melhor documentário em curta-metragem. "Searching for Sugar Man", que conta a história de Rodriguez, músico folk da década de 60, foi considerado o melhor documentário.

O prémio de melhor guarda-roupa foi entregue a Jacqueline Durran, pelo filme "Anna Karenina". Já o óscar de melhor caracterização foi para "Os Miseráveis". O prémio foi recebido por Lisa Westcott e Julie Dartnell.
A "Vida de Pi" ganhou duas categorias técnicas: melhores efeitos especiais e melhor fotografia. Na categoria de melhor montagem de som, há um empate: ganham Skyfall e 00:30 A Hora Negra.
A apresentação deste ano está a cargo do realizador, argumentista e actor Seth MacFarlane, que não desiludiu com o humor negro que o caracteriza.
A cerimónia contou já com uma performance de Charlize Theron e Channing Tatum e um momento musical que o apresentador partilhou com Daniel Radcliffe e Joseph Gordon-Levitt. Shirley Bassey cantou a música "Goldfinger", numa homenagem aos 50 anos dos filmes de James Bond.

Com uma cerimónia dedicada aos musicais, o elenco d' "Os Miseráveis" esteve em palco, assim como os anteriores vencedores "Chicago" e "Dreamgirls".

Cinema: The hunger Games (2012)

por A-24, em 30.08.12

The Hunger Games constitui a primeira parte de uma saga que promete tomar de assalto o mundo cinematográfico. Contudo, se há coisa que odeio, é que comparem The Hunger Games com Twilight. É certo que esta última franchise já está no fim, mas não é por isso que agora uma nova saga tem de obrigatoriamente substituir uma outra. É que não tem mesmo nada a ver. Quer dizer - ambos são protagonizados por uma rapariga adolescente e são baseados em best sellers; mas as semelhanças param mesmo por aqui. Apesar de não odiar Crepúsculo, digo com pura certeza que The Hunger Games é melhor, pela mais sólida e madura narrativa.

Sinopse (PUBLICO): Num futuro pós-apocalíptico não muito distante, no território outrora conhecido como América do Norte, existe Panen, uma nação administrada por um governo totalitário que domina os seus 12 distritos. Uma anterior insurreição fracassada dos distritos contra o Capitólio resultou no extermínio de um 13º e num acordo tácito de rendição entre os restantes. Assim, a viver no limiar de pobreza, numa existência de quase escravatura, os seus habitantes são constantemente relembrados da sua posição de obediência perante o governo. Todos os anos, cada distrito envia dois adolescentes entre os 12 e os 18 anos para participar nos Jogos da Fome, competições de vida e morte em que apenas um sairá vencedor. Katniss Everdeen (Jennifer Lawrence) é uma jovem de 16 anos que, após a morte do pai, se tornou no único sustento da família. Quando Primrose (Willow Shields), a sua irmã de 12 anos, é seleccionada para os jogos, Katniss voluntaria-se para a substituir. Agora, sabendo como a sua vida é crucial para a sobrevivência da família, ela está disposta a lutar com todas as suas forças e tornar-se na única sobrevivente daqueles divertimentos bárbaros...

The Hunger Games é baseado no livro com o mesmo título escrito por Suzane Collins. Não o li,portanto não poderei fazer quaisquer comparações (para quem é fã convicto dos livros, pode não impressionar). Porém, é importante referir que Suzanne Collins é produtora e co-argumentista do filme, pelo que o seu envolvimento directo no filme deve ter contribuído para uma adaptação cinematográfica minimamente fidedigna. Relativamente ao argumento adaptado,creio que o enredo do filme é credível e ambicioso, deixando o expectador sempre a querer mais. Intrigou-me bastante este mundo excêntrico, incrível e futurista, como também as personagens inquietantes e multidimensionais. A película foi realizada por Gary Ross, e este ganha ao não conferir ao filme uma atmosfera ultra-romântica e cliché, mas aposta num ambiente duro e real: consegue pegar num romance destinado a adolescentes e conferir-lhe uma visão perturbante de uma sociedade em decadência. Este mundo retrata uma dicotomia entre a pobreza e a riqueza, entre os oprimidos e os agentes de poder. O sofrimento dos pobres oferece um entretenimento para os ricos, e mesmo a tecnologia envolvida faz lembrar uns tão familiares reality shows.

Um aspecto negativo que devo realçar em The Hunger Games é que este está subdividido em dois pequenos filmes: o primeiro, coerente e interessante, em que as personagens são devidamente desenvolvidas ao ritmo ideal e a crítica à sociedade está bem intríseca - apesar de pensarmos que a excentricidade das personagens poderosas e a transposição de jogos de fome no mundo real são irrisórias, se pensarmos um pouco existem essas “personagens” por aí, nomeadamente em Hollywood ou mesmo no jet set português. Aliás, digo com certeza que é na forte crítica à sociedade que o filme ganha, e que confere à narrativa um carácter maduro e ambicioso.
O segundo pequeno filme começa precisamente na segunda metade, em que este perde substância. Esperava que, à medida que os jogos desenrolavam, a narrativa se fosse tornando mais forte e entusiasmante, mas ao invés disso torna-se apenas uma corrida de cenas banais e previsíveis. Creio que existem cenas cruciais que deveriam ter sido mais trabalhadas, pois só assim funcionariam. O filme é muito longo, e talvez isso corte a força da narrativa. Esperava um final mais completo e explosivo, o que não acontece.
O foco de The Hunger Games é mesmo Katniss, a rapariga em chamas, e o seu instinto de sobrevivência. Jennifer Lawrence desempenha Katniss de forma brilhante e carismática, levando o filme às costas, principalmente na segunda metade do filme. Ela insere-se na personagem de forma natural e sem qualquer esforço.

Em suma, apesar The Hunger Games ter falhas inegáveis,constitui de facto uma boa revelação, sendo um filme muito interessante e que vale a pena esperar pelos capítulos que vêm. (Depois do Cinema)

EXAME

Realização: 8/10
Actores: 8/10
Argumento/Enredo: 7/10
Duração/Conteúdo: 5/10
Efeitos/Fotografia: 8/10
Transmissão da ideia principal do filme para o espectador: 8/10

Média Global: 7.3/10

Crítica feita por Joana Queiroz