Sobre Marinho Pinto I - Marinho Pinto e os políticos
por A-24, em 24.09.14
Mariana MortáguaOs 'foros populistas tão em voga' na Europa estão a fazer uma entrada ruidosa em Portugal. Curiosamente, vêm pela mão, entre outros, de quem, ainda em 2007, apelidava a proposta de redução de deputados como... um foro populista. Temos, aliás, a agradecer a António José Seguro a elaboração de um relatório que prova como a relação entre o número de deputados e a população está bem dentro da média europeia. Na verdade, em Portugal, cada um dos 230 eleitos representa 42.406 eleitores, bastante mais que a média da Europa a 28, que é de 1 para 34.133. Mais razão para António José Seguro de 2007.
Pena é que o secretário-geral do partido socialista tenha mudado de opinião e que venha propor agora a redução de 230 para 181 deputados. A medida só tem dois resultados. O primeiro é o reforço do carrossel do centrão, com a diminuição da pluralidade política, das vozes divergentes dos pequenos partidos. O segundo é a perda de representantes provenientes das zonas do interior.
Em abono da verdade, embora de carácter menos populista, admita-se, esse será também o resultado prático da transformação do sistema eleitoral proporcional português em círculos uninominais, como parece propor António Costa. Em ambos os casos, perde a democracia.
De qualquer das formas, a fórmula populista que permitiu a Marinho e Pinto eleger-se, e a mais um representante do Movimento Partido da Terra, parece estar a fazer caminho em outras áreas do sistema político português. Compreende-se. O antigo bastonário foi mestre na mais fina arte populista: a caça ao voto com o tiro aos políticos. O que é surpreendente nesta história é que Marinho não tenha sequer aguentado 3 meses sem se revelar, ele mesmo, a mais perfeita representação dos políticos que caricaturava.
Marinho Pinto pediu os votos para o MPT, que hoje admite ter usado apenas como barriga de aluguer, apresentando-se como de esquerda, apesar de hoje estar integrado no grupo europeu dos liberais. Bem sabemos que foi uma solução de recurso. Os Verdes europeus - a primeira escolha - é que não levaram muito a bem a declarações homofóbicas do então candidato português.
Marinho e Pinto prometeu ser um "formiguinha" em Bruxelas, mas já disse que não cumprirá o mandato para se poder candidatar às legislativas e, logo a seguir, às presidenciais. O formigueiro de Bruxelas não era senão um trampolim político para o homem que, quem sabe, ainda vamos ver um dia candidatar-se à Casa dos Segredos, se achar que as noites com a Teresa Guilherme lhe podem dar mais votos que as manhãs do Goucha.
Marinho Pinto foi eleito porque denunciava os privilégios dos políticos, os seus salários e regalias. Cresceu com o "são todos iguais". Hoje, acha que o salário de eurodeputado é "vergonhoso" mas que, por via das dúvidas, vai mantê-lo até saber se consegue ser eleito deputado nacional. Um sacrifício pela pátria, está visto, já que o salário de bastonário, €4800, "não dá para muito", e muito menos o de deputado nacional, muito abaixo desse valor.
E é assim que, em pouco mais de três meses, Marinho e Pinto consegue contrafazer tudo o que prometeu em campanha. O seu populismo revelou-se inversamente proporcional ao contributo político que teve para oferecer. Ainda não vimos o deputado europeu a lutar por menos impostos, por salários dignos, por mais direitos. Até agora, só a atrocidade de lamentar um salário de €4800 no mesmo país em que a média das pessoas não ganha mais de €900, e que mais de meio milhão vive com €485 mensais.
O populismo que toma os políticos como um todo, que se alimenta do descontentamento popular oferecendo respostas fáceis, exagerando os factos, encontrando bodes expiatórios, em nada contribui para a democracia. Pelo contrário, descredibiliza-a, afasta-a das pessoas, menoriza-a, sem resolver nenhum dos problemas de fundo: a pobreza, o rotativismo incessante, a certeza de poder pouco perante a corrupção e os grandes interesses financeiros.
Se há abusos, acabe-se com eles, mas com a coragem de rejeitar as derivas populistas que em nada contribuem para aprofundar a democracia portuguesa e para fazer da política um verdadeiro instrumento de cidadania ao serviço daqueles que cá vivem. Tem de ser possível. Afinal, não somos todos iguais a Marinho e Pinto.