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A-24

Rússia desiste de Ianukovitch, mas não desiste da Ucrânia

por A-24, em 24.02.14
Os órgãos de informação controlados pelo Kremlin não poupam adjectivos pejorativos para classificar Victor Ianukovitch, Presidente da Ucrânia afastado do cargo pela oposição: “traidor”, “cobarde”, “fraco”, etc., etc.
O principal “pecado” que lhe é apontado consiste em que ele não esmagou à nascença os protestos que conduziram ao seu derrube e, depois, tal como Kadhafi e Gorbatchov, acreditou nas promessas do Ocidente, de segurança no caso do primeiro e de não alargamento da NATO a Leste no caso do segundo.
Isto tem uma explicação: o Kremlin receia que os acontecimentos no país vizinho seja um mau exemplo para os cidadãos russos, mesmo que a diferença entre a situação política, económica e social dos dois países seja grande. É verdade que a economia russa está a entrar em recessão, o rublo está a sofrer uma desvalorização diária e, em pouco mais de um mês, perdeu cerca de 10% do seu valor em relação ao dólar e ao euro, e o país mergulha-se cada vez mais na corrupção.
Porém, ao contrário da Ucrânia, na Rússia não existe uma oposição numerosa e séria, o aparelho propagandista e repressivo está bem mais afinado. Mas Vladimir Putin guia-se sempre pelo princípio: “mais vale prevenir do que remediar”.
Por essas e outras razões de que venho falado, a Rússia não vai ficar indiferente ao que se passa na Ucrânia e irá fazer tudo para aproveitar os erros dos novos senhores do poder em Kiev. Hoje, domingo, o embaixador russo na Ucrânia, Mikhail Zurabov, foi chamado a Moscovo para consultas e só deverá regressar quando a situação na capital ucraniana estiver mais calma, ou poderá ser mesmo substituído, pois tem sido acusado de não ter sido activo durante os últimos acontecimentos no país vizinho.
Em Moscovo, são muitos os que acreditam que os novos/velhos dirigentes da Ucrânia não conseguirão conter os radicais do Sector de Direita, irão cometer os mesmos erros cometidos em 2004 e que nem a União Europeia, nem os EUA estão dispostos a investir dinheiro numa economia perto da falência. Além disso, Moscovo não esconde o seu apoio aos separatistas do Leste e do Sul da Ucrânia, nomeadamente sob a capa da “federalização do país”, ou seja, a uma divisão gradual do território ucraniano.
Quanto a Iúlia Timochenko, ela apresentou-se como uma mártir do regime de Ianukovitch que, desta vez, promete mesmo salvar a Pátria. Sentada numa cadeira de rodas, talvez para puxar mais a lágrima aos manifestantes, poderá já, nos próximos dias, aparecer a andar com todo o vigor e forças.
Mas não é disso que se trata. Timochenko tem grandes ambições, já fez saber que não quer o cargo de primeiro-ministro, pois, hoje, aceitar isso seria um suicídio político e as eleições presidenciais estão à porta. Ela quer mais, quer ser “Mãe da Nação” no cargo de Presidente da Ucrânia. Ambição não lhe falta, mas não é a única que sofre desse mal entre os vencedores.

Mas ainda é preciso sobreviver até às eleições presidenciais marcadas para 15 de maio, pois, até lá, tudo pode acontecer, tanto mais se os radicais realizarem uma política de aumento da “caça às bruxas” e de humilhação dos vencidos. O facto de terem publicamente espancado e humilhando alguns dirigentes locais, para obrigá-los a assinar a demissão, não enobrece um movimento que diz querer a liberdade e a democracia. Também não será boa ideia se as novas autoridades proibirem os partidos das Regiões e Comunista, pois eles representam parte significativa dos cidadãos ucranianos. Como sabem, eu não morro de amores pelos comunistas, mas a única forma de derrotá-los é actuar melhor do que eles, dar ao povo aquilo que eles não conseguiram dar.

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