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A-24

"Querem mais férias? Não, dizem os suíços"

por A-24, em 12.03.12
Depois de ter lido a meio da semana no Le Temps que as empregadas domésticas vão ter direito a um dia de folga semanal em Singapura, uma filipina que viva em Genebra (e que saiba já francês) descobrirá hoje no jornal que os suíços recusaram em referendo estender as suas férias de quatro para seis semanas. E perceberá que o mundo dos trabalhadores vive a várias velocidades, mesmo quando em causa estão duas das economias mais prósperas.
Em Singapura, cidade-Estado gerida por chineses, foram precisos anos de pressões para que o Governo ordenasse aos empregadores que dessem uma (!) folga às domésticas.
São 200 mil essas mulheres, oriundas de países pobres tipo Filipinas (o maior contingente). Como recebem uns meros 400 dólares mensais (bagatela num país onde o rendimento médio é de 51 mil dólares anuais), quase não há família que não empregue uma destas imigrantes que além de trabalhar só pensam na remessa de dinheiro que enviarão aos filhos.
As filipinas são emblemáticas porque vêm de um país que se tornou um megaexportador de mão de obra. As autoridades calculam que partam todos os dias três mil emigrantes e a maioria são mulheres. De Singapura à Suíça (poucas), passando pelas monarquias petrolíferas, em regra acabam numa casa a assegurar que a família de classe média que as emprega tem o jantar feito quando chega.
O dia de folga em Singapura foi anunciado pelo ministro do Trabalho. Mas sem pressas. O direito só passa a existir a 1 de janeiro de 2012 e mesmo assim o patrão pode oferecer um pagamento extra para que a folga não seja gozada. Entre pressões e a necessidade de mais uns trocos, adivinha-se que muitas não pararão.
Já na Suíça, a proposta dos sindicatos para aumentar as férias foi recusada pela população. Nenhum cantão votou pela ideia, se bem que os suíços alemães fossem os mais convictos na recusa comparados com os de língua francesa e italiana.
Em tempos de crise na vizinha União Europeia, os suíços (19.ª economia mundial, 1,3% de crescimento em 2011) quiseram manter a fama de que vivem para o trabalho. Nada que surpreenda uma filipina que por lá more. E se tiver uma irmã em Singapura saberá que na Ásia as férias são no máximo duas semanas.
Entre as duas notícias do Le Temps, sindicatos de 14 países reuniram-se na Turquia para exigir regras únicas para os trabalhadores da sueca Ikea pelo mundo fora. Incluindo em Singapura e na Suíça.
O argumento é bom. Dizem que em todas as lojas se vestem igual, vendem o mesmo e até comem almôndegas. Por isso, direitos iguais também. Esquecem que esta globalização passa pela competição entre trabalhadores. Com sorte, na lógica do sistema, todos ficam a viver um pouco melhor que antes. É o que esperam as domésticas filipinas.

                                                                                              LEONÍDIO PAULO FERREIRA in DN