Por as coisas em perspectivas
por A-24, em 06.05.14
Via Blasfemias
Às vezes dá-me para isto: olhar para os números, fazer umas contas, e ver como elas coincidem, ou não, com algumas narrativas dos tempos correntes.
Primeira conta: quanto nos custou a austeridade?
Quem leia os jornais ou veja televisão achará que o país está mais pobre do que nunca e que a nossa austeridade foi a pior de todas, porventura com excepção da grega. Vamos então ver quanto é que o rendimento nacional caiu desde o último ano sem crise, 2007. Os números são os seguintes, começando pelos países onde a recessão foi maior (base de dados AMECO):
Primeira conta: quanto nos custou a austeridade?
Quem leia os jornais ou veja televisão achará que o país está mais pobre do que nunca e que a nossa austeridade foi a pior de todas, porventura com excepção da grega. Vamos então ver quanto é que o rendimento nacional caiu desde o último ano sem crise, 2007. Os números são os seguintes, começando pelos países onde a recessão foi maior (base de dados AMECO):
Grécia -20,96%
Luxemburgo -14,65%
Irlanda -10,26%
Croácia -9,85%
Itália -9,22%
Islândia -9,18%
Eslovénia -6,40%
Lituânia -6,13%
Portugal -6,01%
Finlândia -4,54%
Espanha -4,32%
Reino Unido -2,65%
Ou seja, há oito países onde o rendimento nacional bruto caiu mais do que em Portugal no período que vai do início de 2008 ao fim de 2013. Seis por cento é bastante, mas menos do que se imaginaria face à temperatura do debate pública. E é, sobretudo, menos do que o sofrido por outros países onde a troika nem chegou a pousar.
O que me leva à segunda conta: o que é nos aconteceu desde que entrámos no terceiro milénio? Ou seja, desde 2000. Os números, e a ordanação dos países, ficam bem diferentes:
Itália 3,14%
Portugal 3,37%
Grécia 8,12%
Luxemburgo 10,47%
Dinamarca 15,45%
Holanda 17,12%
França 18,54%
Bélgica 19,17%
Malta 22,56%
Alemanha 22,68%
Espanha 25,30%
Islândia 25,67%
Agora Portugal já é o segundo pior. No período que vai de 2000 a 2013 só a Itália cresceu menos do que nós. O que significa que, se calhar, os nossos problemas não derivam só, nem sobretudo, da austeridade recente. Têm raízes mais antigas.
Chegou assim à terceira conta: e o que foi que aconteceu até a crise estalar no final de 2007? Aqui estão os números para o período que vai do início de 2000 ao final de 2007:
Portugal 9,97%
Noruega 13,09%
Itália 13,61%
Estados Unidos 15,13%
Malta 16,86%
Alemanha 17,06%
Bélgia 17,43%
França 17,82%
Dinamarca 17,98%
Holanda 19,93%
Áustria 21,83%
Suíça 23,38%
Aqui é que se vê o nosso real problema: no tempo em que o crédito era barato, em que o investimento público era abundante, em que os pensionistas e os funcionários públicos não se queixavam, em que o país inteiro andava a comprar casa e a trocar de carro, ou a encomendar o novo plasma, a economia não crescia. Nem com SCUT\u2019s, nem com estádio do Euro 2004, nem com capitais da cultura a economia era capaz, se quer, de acompanhar o ritmo das outras economias europeias. Foi nessa altura que ficámos em último lugar \u2013 não foi com a austeridade.
É bom ver as coisas com algum sentido de perspectiva.