Polícia britânica mentiu na tragédia de Hillsborough
por A-24, em 14.09.12
Desde Maio de 1985 que os adeptos do Liverpool carregavam o estigma de serem os “rostos” do hooliganismo. Quatro anos depois do Heysel, Hillsborough apenas reforçou essa convicção. Descobriu-se agora, graças ao trabalho de uma comissão independente de investigação, que esta última “sentença” é falsa: as 96 mortes no estádio de Sheffield podem ser imputadas ao mau trabalho da polícia e serviços de emergência médica britânicos.
Mas há mais. As autoridades não só foram incompetentes nesse dia como agiram deliberada e sistematicamente nos tempos que se seguiram para camuflar a sua responsabilidade na tragédia – a polícia fez todos os esforços para passar a ideia de que os adeptos do Liverpool que invadiram a bancada estavam alcoolizados e eram violentos. Mentira.
O próprio primeiro-ministro britânico, David Cameron, já assumiu a “dupla injustiça” sofrida pelos adeptos do Liverpool: não só foram vítimas da incompetência das autoridades, como depois foram alvo da “indignidade” de serem caluniados e apontados como responsáveis pelas 96 mortes registadas nesse dia. Na sequência das conclusões da comissão de inquérito, liderada pelo reverendo James Jones, bispo de Liverpool, o Governo britânico apresentou “profundas desculpas” públicas.
Em Bruxelas, no velhinho estádio do Heysel, o comportamento violento dos adeptos do Liverpool esteve claramente na origem dos incidentes que causaram 39 mortes (33 deles adeptos da Juventus) minutos antes do início da final da Taça dos Campeões Europeus de futebol. As imagens chocantes de pessoas esmagadas contra as vedações por uma multidão em pânico repetiram-se quatro anos depois, em Sheffield. E os adeptos do Liverpool estavam novamente em cena...
Só que, para além do estado degradado de ambos os estádios, não há outros pontos de contacto entre estas duas histórias. Desta vez, após prolongada espera, os adeptos do Liverpool entraram no estádio de Hillsborough, para sectores já com lotação esgotada, porque os responsáveis lhes abriram as portas. O jogo estava prestes a começar e os adeptos correram para os lugares que, afinal, já estavam ocupados. O pânico fez o resto.
Na altura, não foi difícil apontar o dedo ao hooliganismo, em geral, e aos adeptos do Liverpool, em particular. Mas a análise de 450.000 páginas de documentos até aqui mantidas longe dos olhos do público conta uma história bem diferente. E preocupante: entre os depoimentos recolhidos pela polícia de South Yourkshire, 164 foram “significativamente alterados” (116 foram mesmo manipulados para remover comentários negativos acerca da actuação da polícia). Entre as 96 vítimas, quase metade (41) poderiam ter sido salvas se os serviços de emergência médica tivessem sido mais rápidos a actuar. Todas foram declaradas mortas às 15h15, pouco mais de 15 minutos após os primeiros sinais de esmagamento.