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A-24

Os campos por onde passaram portugueses

por A-24, em 03.07.14
PATRÍCIA CARVALHO (TEXTO) e CÉLIA RODRIGUES (INFOGRAFIA)

Durante a II Guerra Mundial, dezenas de portugueses que moravam em França foram presos, colocados em campos de internamento e deportados, posteriormente, para campos de concentração na Alemanha ou na Polónia. Alguns acabaram por ser transferidos para outros campos, na Áustria ou em França. Todos eles estão aqui identificados, a par com os portugueses que passaram por cada um dos campos.

Royallieu-Compiègne
Situada na calma cidade de Compiègne, a cerca de 60 quilómetros de Paris, a caserna de Royallieu foi construída em 1913 e os seus 25 edifícios ocupavam uma área de 16 hectares. O local era querido aos franceses, uma vez que fora a poucos quilómetros da cidade, nos bosques que rodeiam Compiègene, que a 11 de Novembro de 1918 fora assinado o Armistício que marcava a capitulação alemã e o fim da Grande Guerra. Agora, em 1940, quando o marechal Pétain pediu um cessar-fogo, Adolf Hitler exigiu que este novo Armistício, de carácter totalmente oposto ao anterior, fosse assinado exactamente no mesmo sítio. A 22 de Junho de 1940 era, assim, consumado o acordo que punha fim às hostilidades alemãs contra a França, Bélgica, Holanda e Luxemburgo. O território francês foi dividido, ficando Pétain com a gestão do Sul, com a capital em Vichy, e o resto do país sob ocupação alemã.

No final de Junho, o complexo de Royallieu foi confiscado pelos alemães, para ali internarem prisioneiros franceses e britânicos. Um ano depois, as SS instalaram em definitivo um campo de internamento e de trânsito no local e Royallieu-Compiègne haveria de se transformar no mais importante local de deportação dos opositores do regime de Vichy.

Levados para ali de todos os pontos de França, os prisioneiros, sobretudo políticos e membros da Resistência, mas também judeus ou criminosos de delito comum, permaneciam no campo de internamento até serem encaminhados, a pé, para a estação de comboio da cidade, enchendo os vagões que os haveriam de levar para os campos de concentração do Reich. Entre 1942 e 1944 cerca de 45 mil pessoas foram deportadas em comboios que partiram de Compiègne.

Hoje, o que sobrou do antigo campo de internamento está transformado num Memorial e, no exterior, um monumento aos que por ali passaram, lembra: “Aqui, em Royallieu, 53 mil homens, mulheres e crianças vítimas da Alemanha Nazi foram internados, deportados e fuzilados, entre Julho de 1941 e Agosto de 1944”. Dos principais transportes que dali partiram com destino aos campos de concentração, o maior foi o Comboio da Morte que, com 2152 pessoas a bordo, deixou Compiègne a 2 de Julho de 1944, em direcção a Dachau.
Em pelo menos oito transportes iam portugueses, num total de mais de 30 pessoas. Os portugueses também foram deportados para os campos de concentração nazis em comboios que partiram directamente da ilha de Bordéus, Lyon, Toulouse e do campo de internamento de Pithiviers.

Pithiviers
O campo de Pithiviers foi construído no início da II Guerra Mundial com o objectivo de acolher os prisioneiros de guerra alemães. Após o Armistício de 22 de Junho de 1940, foi utilizado para os prisioneiros de guerra franceses. Com a ordem de apresentação em massa (e consequente detenção) dos judeus que habitavam em França, a 14 de Maio de 1941, conhecida como rafle du billet vert, o governo de Vichy transformou Pithiviers num campo de trânsito para os judeus. No ano de 1942, seis comboios partiram de Pithiviers nos dias 25 de Junho, 17 de Julho, 31 de Julho, 3 Agosto, 7 de Agosto e 23 de Setembro, transportando 6079 judeus para Auschwitz.
BUNDESARCHIV BILD 183-S69236, FRANKREICH, INTERNIERUNGSLAGER PITHIVIERS CC-BY-SA-3.0

Destes, apenas 115 sobreviveram até à libertação. O campo francês foi evacuado em Outubro de 1943 para ser transformado num campo de internamento para os detidos políticos. Michael Fresco ia a bordo do primeiro comboio a deixar Pithiviers, a 25 de Junho de 1942, com mil judeus. Ele é o único português que consta dos registos recuperados de Auschwitz.
Auschwitz
O campo de concentração de Auschwitz começou a ser instalado em 1940, a três quilómetros da cidade polaca de Oswiecim, aproveitando instalações militares pré-existentes. Esta primeira parte do campo, conhecida como Auschwitz I e à qual se acede através do portão com a famosa inscrição “Arbeit Macht Frei” (O trabalho liberta), foi concebida para receber prisioneiros políticos polacos. A função e cenário de Auschwitz iriam, contudo, mudar rapidamente.
Em 1941, o comandante do campo, Rudolf Hoess, recebeu instruções para ampliar Auschwitz, com o objectivo de ali receber os judeus destinados à “solução final” nazi. Na sua aubiografia Comandante de Auschwitz, que escreveu na prisão já depois de ter sido condenado à morte (acabaria por ser enforcado em Auschwitz I), Hoess recorda: “No Verão de 1941, [Heinrich] Himmler [comandante das SS] chamou-me a Berlim para me informar da ordem fatal que previa o extermínio dos judeus de quase todos os cantos da Europa e que faria com que Auschwitz se tornasse no maior matadouro humano que a história já conheceu”.

Começava, por isso, a nascer Birkenau (ou Auschwitz II), instalado a poucos quilómetros do primeiro campo e cuja construção obrigou à evacuação e destruição de aldeias polacas. Birkenau estava subdividido em diversos campos e a linha ferroviária terminava no seu interior, o que permitia fazer uma selecção dos prisioneiros que seriam enviados para as câmaras de gás, mal estes chegavam.
A destruição sistemática e premeditada dos registos dos prisioneiros do campo torna praticamente impossível saber quantas pessoas, na sua maioria judeus, foram assassinadas em Auschwitz, mas os números flutuam entre 1,5 milhões e os três milhões.
Nos registos do campo que sobreviveram à guerra consta apenas o nome de um português. Michael Fresco, nascido em Lisboa em 1911, morreria ali a 24 de Julho de 1942,menos de um mês depois de ter sido deportado.
Em Janeiro de 1945, com a aproximação dos russos, os alemães procuraram apagar as provas dos crimes cometidos em Auschwitz, queimando documentos, fazendo explodir os crematórios e pegando fogo ao bloco onde eram guardados os bens dos prisioneiros, conhecido como Canadá. Milhares de prisioneiros foram forçados a integrar as marchas de morte, com destino a outros campos, enquanto outros foram assassinados. O Exército Vermelho entrou em Auschwitz a 27 de Janeiro de 1945, encontrando cerca de sete mil prisioneiros.

Bergen-Belsen
Bergen-Belsen é, para muitas pessoas, ainda mais poderoso como sinónimo do horror nazi do que Auschwitz. E isto deve-se, em grande parte, à rápida divulgação de fotografias e vídeos do que os Aliados ali encontraram, durante a libertação do campo. O exército britânico chegou a Bergen-Belsen a 15 de Abril de 1945.
Bergen-Belsen começou por ser um campo de prisioneiros de guerra, mas em 1943, as SS assumiram o controlo de parte desta área, transformando-a num campo de concentração e criando uma zona para judeus “especiais”, que os nazis esperavam poder trocar por alemães capturados pelas forças Aliadas. Nesse ano foi também estabelecido o chamado “Campo Neutro”, onde se encontravam cidadãos de países neutros, como Espanha, a Turquia e Portugal. Neste campo estiveram detidos 19 judeus da Salónica, com um passaporte colectivo português passado pela legação de Berlim a 11 de Julho de 1944, que chegaram a abandonar Bergen-Belsen, mas cujo destino final se desconhece.
Quando eles deixaram Bergen-Belsen, o campo já se tornara no inferno de fome e epidemias de tifo e desinteria que haveriam de dizimar milhares de prisioneiros, incluindo as duas irmãs Anne e Margot Frank.
O livro Remembering Belsen – Eyewitnesses Record of the Liberationcongrega um conjunto de depoimentos de soldados, pessoal de auxílio e prisioneiros de Bergen-Belsen, nos primeiros dias após a libertação do campo. O brigadeiro H. L. Glyn-Hughes, o médico mais graduado entre os britânicos e que assumiu a organização do auxílio às vítimas, descreve o que encontrou: “O campo todo foi originalmente construído para albergar 8 mil pessoas e quando chegamos tinha 40 mil vivos, enquanto no solo estavam espalhados dez mil corpos, e foi-nos reportado que outros 17 mil tinham morrido no mês de Março. Depois de uma rápida vistoria a toda a área, percebemos que 25 mil prisioneiros precisavam de hospitalização imediata e que deste número, dez mil provavelmente morreriam.”

Os ingleses optaram por queimar todas as barracas dos prisioneiros, à medida que iam sendo esvaziadas, pelo que hoje nada dessa parte do campo permanece. Além do Memorial construído em Bergen-Belsen, e dos monumentos erigidos no interior do perímetro do campo em honra dos que morreram, o que se passou ali tem como principais testemunhas as elevações de terreno, cobertas de erva e flores na Primavera, que são, afinal, as sepulturas comuns que guardam os corpos dos milhares de vítimas.
Alguns dos portugueses deportados para os campos de concentração nazis foram transferidos para Bergen-Belsen, com o aproximar do fim da guerra. Dos nomes recolhidos, só uma pessoa sobreviveu, Maria Barbosa. Sem que Maria o saiba, o seu irmão Francisco, mais novo dois anos, chegou a Bergen-Belsen a 20 de Março de 1945 e morreu ali, em data e de causa desconhecidas.
Tal como Francisco terão morrido no campo de concentração de Bergen-Belsen Prosper Colomar (10 de Abril de 1944), Manuel João (morto a 25 de Abril de 1945, dez dias após a libertação), Richard Lopes (morto a 21 de Maio de 1945, pouco mais de um mês após a libertação) e Francisco Ferreira. Deste último desconhece-se a data da morte, mas o seu nome ainda aparece numa lista de sobreviventes, feita a 19 de Abril pelos próprios prisioneiros, pelo que terá sido também uma das quase 14 mil pessoas que morreram após a libertação de Bergen-Belsen.

Buchenwald
Buchenwald, que acabaria por se tornar no maior campo de concetração dentro da Alemanha, começou a ser construído em 1937, em Ettersberg, perto da cidade alemã de Weimar. Ao longo dos anos, o complexo cresceu até se tornar o epicentro de 136 subcampos e foi o local de detenção de 250 mil pessoas. Estima-se que 56 mil delas terão morrido.
O portão de Buchenwald, com a irónica inscrição “Jedem Das Seine” (A cada um o que lhe é devido), ainda lá está, com o relógio da torre de entrada parado na hora (15h15) a que os prisioneiros do campo, sabendo da aproximação das tropas americanos, se revoltaram, a 11 de Abril de 1945. Também é possível ver as celas em que os prisioneiros eram enforcados ou mortos com um tiro na nuca e o poste em que eram pendurados pelos pulsos, braços cruzados atrás das costas. O local das antigas barracas está marcado por pedras negras e blocos de granito com o número de cada um dos blocos.
Buchenwald foi o destino inicial de muitos dos portugueses deportados de França. Dos dez transportes que deixaram Compiègne com destino a este campo, quatro levavam portugueses a bordo.

Os portugueses que seguiram para Buchenwald a partir de França são Manuel Alves, João Faria de Sá, Augusto José Rodrigues, Prosper Colomar, Emílio Pereira, Julien Laranjo, Duarte da Paixão, Aníbal dos Santos, Venâncio Dias, Cândido Ferreira, Luís Ferreira e António Ribeiro. Todos eram prisioneiros políticos.
Por Buchenwald passaram também Maria d’Azevedo, inicialmente enviada para Ravensbrück, e o seu filho, Maurice d’Azevedo, nascido a 8 de Julho de 1924. Maurice foi enviado para Buchenwald no transporte que saiu de Compiègne a 22 de Janeiro de 1944, e em que também seguiam Prosper Colomar, Julien Laranjo e Emílio Pereira. O jovem está identificado como francês, embora existam dados que também colocam o seu local de nascimento no Porto. Mãe e filho, também prisioneiros políticos, terão sobrevivido ao campo. De todos os portugueses que passaram por Buchenwald, pelo menos quatro morreram, dois dos quais – José Augusto Rodrigues e Cândido Ferreira – neste campo de concentração.

Dachau
Dachau foi o primeiro dos campos de concentração nazis e, por isso, o modelo que todos os outros deveriam seguir. Fundado a 22 de Março de 1933, apenas algumas semanas depois de Adolf Hitler ter sido nomeado Chanceler (30 de Janeiro de 1933), tinha como função inicial receber prisioneiros políticos, mas a guerra tornou a sua população muito mais diversificada. As contas do Memorial do campo indicam que 200 mil pessoas de toda a Europa foram internadas em Dachau e nos seus subcampos entre 1933 e 1945. Destas, 41.500 morreram.
Dachau foi o destino de pelo menos dois transportes franceses, que partiram de Compiègne, em 1944. Um deles, que deixaria a França a 2 de Julho de 1944, ficou conhecido como o Comboio da Morte, pelas condições dramáticas a que os prisioneiros foram sujeitos, e que deixariam sem vida, ao longo do percurso, cerca de 520 dos 2152 passageiros iniciais. Um dos que não resistiu à viagem foi o único português a bordo deste transporte. Bernardino da Silva, nascido a 17 de Março de 1923, em Santo Tirso, morreu algures entre 2 e 5 de Julho, no trajecto entre Compiègne e Dachau. Tinha 21 anos.

No transporte que deixou Compiègne a 18 de Junho de 1944, com 2143 pessoas, seguiam quatro portugueses: Acácio Pereira, Manuel Pires, André ou Mário de Sousa e Joaquim Sequeira. O campo nazi, nas imediações de Munique, foi também o destino final do “Comboio Fantasma”, que partiu de Bordéus a 9 de Agosto de 1944. Com 656 pessoas a bordo, este transporte levava nove portugueses, o maior número de nacionais num comboio de França com destino aos campos de concentração. Naquele mês de Agosto chegaram, por isso, a Dachau, Américo da Costa, Delfim da Cunha, António Ferreira, Casimiro Martins, Alberto Mateus, José Agostinho das Neves, José Oliveira Varjia (muito provavelmente um erro), Tomás Vieira e Abel Carvalho. Um décimo homem, João Fernandes, também nasceu em Portugal, mas está identificado como francês. Para Dachau seguiu ainda um comboio que saiu de Lyon a 29 de Junho de 1944, com dois portugueses a bordo – Francisco Barbosa da Costa e Alberto de Oliveira, nascido a 27 de Março de 1893. Pelo menos cinco destes portugueses haveriam de morrer em campos de concentração nazis.
A tentativa desesperada dos alemães de destruir todos os vestígios documentais do que acontecera no campo, a proximidade das tropas norte-americanas e um ataque da Resistência alemã, auxiliada por antigos prisioneiros de Dachau que tinham conseguido escapar a uma das marchas forçadas, impedem que uma ordem para a aniquilação total dos prisioneiros seja cumprida e a 29 de Abril de 1945, um domingo, os norte-americanos entram finalmente no campo. No livro Le Bataillon d’Eysses, editado pela Amicale dos Antigos Detidos Patriotas da Central de Eysses, em 1962, reproduz-se o relato de um prisioneiro sobre esse momento: “Uma calma enganadora plana sobre o campo, onde reina a inquietude. A espera prolonga-se. De súbito, às 17h34 o primeiro jipe entra no campo. Já era tempo. Uma divisão SS devia queimar o campo com um lança-chamas na noite de domingo para segunda-feira. As tropas americanas, prevenidas pelos prisioneiros que tinham fugido, tinham antecipado em um dia o seu avanço. Apesar da ordem para permanecermos nos blocos, instala-se a confusão total. Somos livres!”.

Flossenbürg
Flossenbürg começou a ser construído em Maio de 1938 e a sua localização foi escolhida pelas SS pela proximidade das pedreiras de granito que se encontravam nas colinas em torno de pequena localidade no Sul da Alemanha. No final desse ano, Flossenbürg tinha já 1500 detidos.
Os primeiros prisioneiros de Flossenbürg eram alemães, considerados “criminosos” ou “associais” e no final de 1938 chegaram os primeiros prisioneiros políticos. Após o início da guerra, o campo e os seus subcampos de trabalho, que se espalhavam até à Checoslováquia, receberam prisioneiros de toda a Europa. Segundo os dados do Memorial do campo, até Maio de 1944, as SS e a Gestapo autorizaram a deportação de 22 mil homens para o campo. As condições iriam deteriorar-se muito no último ano de guerra, quando ali chegaram mais 78 mil prisioneiros, incluindo 16 mil mulheres. Estima-se que cerca de 30 mil pessoas tenham morrido em todo o sistema prisional sob a alçada de Flossenbürg.
Por lá passaram, pelo menos, quatro portugueses. Um deles, António Ferreira, nascido a 22 de Março de 1895, em Vila Real, tinha chegado a Dachau, a 28 de Agosto de 1944, a bordo do “Comboio Fantasma”, e foi transferido, alguns meses depois, para Flossenbürg, onde chegou a 2 de Fevereiro de 1945. O seu número de prisioneiro era o 45.484. Ferreira esteve, muito provavelmente, no subcampo de Leitmeritz, que entre 24 de Março de 1944 e 8 de Maio de 1945 recebeu mais de 16 mil prisioneiros. O português não permaneceu ali muito tempo, uma vez que a 7 de Março de 1945, pouco mais de um mês depois de chegar a Flossenbürg foi transferido para o campo de Bergen-Belsen.

PD-USGOV-MILITARY-ARMY.
Manuel Alves, nascido a 29 de Novembro de 1910, em Vila Verde, foi deportado de França para o campo de concentração de Buchenwald, em Janeiro de 1944. Cerca de um mês depois foi transferido para Flossenbürg, tendo recebido o número de prisioneiro 6670. Manuel Alves foi enviado para o subcampo de Hradischko, a sul de Praga, a 3 de Março de 1944, e ali terá permanecido até à evacuação do campo, a 14 de Abril de 1945. A pé ou de comboio, os prisioneiros são encaminhados para Leitmeritz. Ao contrário de António Ferreira, cujo destino se desconhece, Manuel Alves terá sobrevivido à guerra.
Final diferente teve Alberto Oliveira, nascido a 27 de Março de 1893, no Porto. Deportado de França para Dachau em Junho de 1944, é transferido para Flossenbürg em 23 de Julho desse ano. Enviado para o subcampo de Leitmeritz, é reconduzido ao campo principal a 11 de Agosto. Com 41 anos, Alberto Oliveira, que era casado, morre no campo. O certificado de óbito indica que ele morreu às 7h20 do dia 21 de Setembro de 1944, vítima de insuficiência cardíaca.
Também José da Silva, sobre quem existe muito pouca informação, terá morrido em Flossenbürg, a 10 de Dezembro de 1944, depois de ter sido transferido para este campo a partir de Dachau. Desconhece-se quando é que o português foi deportado para a Alemanha.
As tropas norte-americanas entraram em Flossenbürg a 23 d Abril de 1945, encontrando 1500 prisioneiros em estado muito debilitado.

Mauthausen
O campo de concentração de Mauthausen, na Áustria, foi criado em 1938. A sua localização, tal como acontecera com Flossenbürg ou Natzweiler-Struthof, foi decidida graças à presença de pedreiras nas imediações. Contudo, o principal objectivo deste campo foi, desde o início, a aniquilação dos prisioneiros e não o aproveitamento do seu trabalho por razões económicas. Esta situação só se iria alterar a partir de 1943, quando a falta de mão-de-obra e a necessidade de intensificar a produção de armamento, em unidades que estavam, entretanto, a ser transferidas para o subsolo, obrigaram a uma utilização cada vez maior dos prisioneiros para o trabalho forçado.
Das cerca de 200 mil pessoas que passaram por Mauthausen e pelos campos de trabalho que lhe estavam associados, estima-se que 100 mil morreram. O campo foi libertado pelos norte-americanos a 5 de Maio de 1945.
Pelo menos quatro portugueses passaram pelo campo de Mauthausen e dois morreriam ali. Tomás Vieira, nascido 7 de Março de 1890, em Albufeira, foi deportado para Dachau, a 9 de Agosto de 1944, no “Comboio Fantasma”, com oito outros portugueses. A 14 de Setembro desse ano foi transferido para o comando Ebensee de Mauthausen, uma unidade subterrânea de produção de armamento, a que os nazis deram vários nomes de código (Kalk/Calcário ou Zement/Cimento são apenas alguns) com o objectivo de disfarçar a sua função. Entre os campos satélite de Mauthausen era considerado como um dos que tinha piores condições, e uma das taxas de morte mais elevadas. O Livro dos Mortos do campo refere que Tomás Vieira morreu às 17h45 do dia 16 de Novembro de 1944. A causa de morte que lhe é atribuída, e que será, muito provavelmente, falsa, é broncopneumonia e problemas cardíacos.
BUNDESARCHIV BILD 192-334, KZ MAUTHAUSEN, GARAGENHOFEINFAHRT CC-BY-SA-3.0

Delfim Ribeiro da Cunha, deportado para Dachau no mesmo comboio de Tomás, também acabou por encontrar a morte no campo de Mauthausen, para onde foi transferido no mesmo dia que o seu companheiro. Casado e com dois filhos, Delfim tinha nascido a 1 de Março de 1887, provavelmente em Lousada (Lozade é a referência que aparece nos registos nazis). Não há dados que indiquem a causa de morte, mas sabe-se que o português morreu a 4 de Abril de 1945.
Os dois outros portugueses que passaram por Mauthausen conseguiram sobreviver-lhe. Um deles foi João Fernandes. Deportado de França, em Agosto de 1944, para Dachau, esteve cerca de um mês no campo de Mauthausen, antes de ser transferido para o campo de Natzweiler-Struthof.
Por fim, nos registos do ITS – International Tracing Service, surge ainda como tendo passado por Mauthausen Julien (Júlio?) Laranjo, nascido a 24 de Feveireiro de 1919, em São Tiago (ou Santiago). Deportado de França para Buchenwald num comboio que deixou Compiègne a 22 de Janeiro de 1944, Júlio foi transferido para Mauthausen um mês depois, a 22 de Fevereiro. Aparentemente, conseguiu sobreviver aos rigores do campo durante mais de um ano, tendo sido libertado a 5 de Maio de 1945, quando as tropas americanas ali entraram.

Natzweiler-Struthof
No campo de Natzweiller-Struthof, o único campo de concentração nazi instalado em França, estão elencadas as nacionalidades dos prisioneiros que ali morreram e nesta lista surge “1 Português”. Este cidadão, Emil Rolsa ou Rozsa, tinha, de facto, papéis portugueses, mas, ao que se sabe, não nasceu em Portugal nem alguma vez visitou o país. Os serviços do campo indicam à Revista 2 que Emil, nascido a 15 de Abril de 1894, chegou a Natzweiler-Struthof, na região da Alsácia, a 24 de Novembro de 1944, transferido do campo de Dachau. Tinha a categoria de “preso político”, com o número 43.954, e não sobreviveria muito mais do que um mês aos rigores do trabalho nos campos satélite para onde foi enviado. No livro Portugueses no Holocausto, Esther Mucznik também se refere a Emil Rozsa, identificando-o como húngaro, nascido em Budapeste.
Dois outros portugueses passaram pelos subcampos de Le Struthof, mas ambos sobreviveram.
O campo de Natzweiler-Struthof abriu a 21 de Abril de 1941, meses depois de, em Setembro de 1940, os alemães terem descoberto que as montanhas da região estavam cobertas de granito rosa. Além de fornecer mão-de-obra escrava para a indústria de guerra alemã, o campo também foi palco de experiências, relacionadas com o tifo e o uso de gás pimenta e fosfeno.
Com o avanço das tropas Aliadas em território francês, os nazis decidiram evacuar Natzweiler-Struthof em Setembro de 1944, pelo que quando os norte-americanos chegaram ao campo, a 23 de Novembro de 1944, o encontraram quase vazio. O mesmo aconteceu com os cerca de 70 subcampos de Le Struthof, para onde cerca de 35 mil deportados tinham sido enviados nos anos anteriores sem sequer passar pelo campo principal.
Foi, provavelmente, o que aconteceu com os dois portugueses João Fernandes e Joaquim Sequeira. De João Fernandes sabe-se que nasceu numa localidade identificada como Gondariz, a 5 de Junho de 1911. Nos documentos que o referem tanto aparece identificado como português como francês, o que pode ser uma mera confusão, por ele ter sido detido em França ou, mais provavelmente, porque terá adquirido a nacionalidade francesa depois de emigrar para aquele país. João foi enviado para Dachau no “Comboio Fantasma”, que deixou Bordéus a 9 de Agosto de 1944, e passou os meses seguintes a ser enviado de campo para campo. Depois de estar cerca de um mês em Dachau passou por Mauthausen também durante um mês e, a 18 de Outubro de 1944, foi transferido para o subcampo de Schomberg, incluído na rede de Natzweiler-Struthof. Há informações de que João Fernandes sobreviveu à guerra e regressou a França, em Maio de 1945.
Joaquim Sequeira também passou por um dos campos satélite de Natzweiler-Struthof, o de Markirch, por um curto período. Deportado de França para Dachau, em Junho de 1944, o português é transferido para Markirch a 19 de Julho e aí permanece até 4 de Outubro, quando é reenviado para o universo de Dachau – primeiro para o subcampo de Allach e depois para Trostberg. Joaquim, casado e com um filho, sobreviveu à sua passagem pelos campos de concentração, e regressou a Lacapelle Biron, onde vivia.

Neuengamme
Muito próximo da cidade de Hamburgo, o campo de concentração de Neuengamme começou a ser construído em 1938, inicialmente como um campo satélite de Sachsenhausen, nas instalações de uma antiga fábrica de tijolos. Rapidamente, contudo, se autonomizou, tornando-se o maior do noroeste alemão e criando a sua própria rede de subcampos, sobretudo ligada à produção de armamento e à construção.
Pelo complexo de Neuengamme passaram mais de cem mil prisioneiros de toda a Europa, dos quais 42.900 não sobreviveram às condições de vida e de trabalho classificadas como “assassinas”.
Os subcampos de Neuengamme começaram a ser esvaziados a 24 de Março de 1945 e o campo principal recebeu ordem de evacuação a 19 de Abril. Quando os britânicos entraram em Neuengamme, a 2 de Maio, relataram ter encontrado “um campo vazio”.
O português Casimiro Martins morreu em Neuengamme, para onde fora transferido, depois de 52 dias em Dachau, a 22 de Outubro de 1944. Casimiro tinha 38 anos quando morreu, às 7h50 de 18 de Dezembro de 1944, alegadamente de uma infecção no intestino.

Nos registos do campo de concentração não existem dados sobre Casimiro. Os dois únicos prisioneiros identificados como portugueses pelos responsáveis pelo Memorial de Neuengamme são um homem apresentado como Dominique Dagougna (provavelmente Domingos da Cunha), nascido em 27 de Dezembro de 1904, que ia a bordo de um transporte que saiu de Compiègne a 21 de Maio de 1944. O outro era um companheiro do mesmo transporte, identificado como Manuel Barrera-Gornez (provavelmente Manuel Barreira Gomes), nascido a 9 de Fevereiro de 1899. Em ambos os casos, desconhece-se o destino.
Curiosamente, o campo também não tem qualquer indicação sobre Paulo da Silva, nascido a 10 de Janeiro de 1908, em Vinha, e que seguia a bordo do mesmo transporte. Entre os pertences de prisioneiros recolhidos em Neuengamme e guardados pelo ITS está um relógio que pertenceu a este português, sobrevivente da guerra. A lista de bens recolhidos em Neuengamme inclui também um relógio e uma aliança em ouro de Manuel João – outro passageiro do mesmo transporte. Apesar de ter nascido em Loulé, a 31 de Dezembro de 1891, Manuel João aparece identificado como francês, talvez por se ter naturalizado. João sobreviveu a Neuengamme mas não resistiu a Bergen-Belsen, para onde foi transportado, tendo morrido já depois da libertação do campo.
Outro passageiro do mesmo transporte de 21 de Maio, identificado como francês mas nascido em Lisboa, a 8 de Agosto de 1888, é Richard (Ricardo) Lopes. Ricardo foi um dos que também não sobreviveu ao inferno de Bergen-Belsen e que ali morreria, já depois da libertação do campo.
As informações relativas a Francisco Ferreira e a Maria Barbosa também indicam que ambos passaram por Neuengamme. Ele já passara anteriormente pelo campo de Sachsenhausen e seria posteriormente transferido para Bergen-Belsen, onde terá morrido. Maria Barbosa foi transferida para Neuengamme depois de ter passado por Ravensbrück. Maria também seria levada para Bergen-Belsen, onde conseguiu sobreviver, tendo sido repatriada para França a 17 de Maio de 1945.

Ravensbrück
Situado a cerca de 90 quilómetros a norte de Berlim, o campo de Ravensbrück foi criado exclusivamente para mulheres. As primeiras prisioneiras chegaram ali em Maio de 1939, e eram, sobretudo, “associais” transferidas do campo de concentração de Lichtenburg, que encerrou na mesma altura.
Apesar de marcadamente feminino, Ravensbrück haveria de mudar ao longo dos anos de guerra – em Abril de 1941 foi criado na sua área um pequeno campo para homens e em Junho de 1942 abriu um campo para jovens, o Uckermark. A partir de meados de 1944, e graças à sua posição geográfica, Ravensbrück foi sendo inundado de prisioneiros, forçados a abandonar os campos que iam caindo nas mãos dos Aliados. As condições degradaram-se de forma acentuada e a exterminação em massa de prisioneiros passou a fazer parte da rotina do campo.

Por este campo passaram duas portuguesas, deportadas de França a 31 de Janeiro de 1944: Maria Barbosa (27.864) e Maria d’Azevedo (27.650). O grupo de mulheres incluído neste transporte ficou conhecido como as “27.000”, por causa dos números de prisioneiras que lhes foram atribuídos, entre 27.030 e 27.988.
Apesar dos trabalhos forçados, das doenças e da fome que sempre tiveram de enfrentar, os detidos de Ravensbrück iriam ver a sua vida mudar drasticamente com a sobrelotação do campo resultante da chegada de milhares de outros prisioneiros. “Nos últimos meses de existência, o sistema concentracionário enfrenta novas dificuldades. Este período é caracterizado pelo caos absoluto em que a pouca força que resta é posta ao serviço de uma barbárie calculada”, afirma Pierre-Emmanuel Dufayel no livro Un Convoi de Femmes, sobre o transporte em que seguiram as duas portuguesas.
Cerca de 200 mil pessoas (132 mil das quais eram mulheres e crianças) passaram pelo sistema de Ravensbrück. O campo seria libertado pelo Exército Vermelho a 30 de Abril de 1945.

Sachsenhausen
Sachsenhausen, às portas de Berlim, foi construído em 1936 e considerado como o campo perfeito. Mais de 200 mil pessoas foram ali detidas e muitos milhares terão morrido.
O local serviu também como local privilegiado para “treinar” futuros comandantes de outros campos de concentração, como Rudolf Hoess, que viria a liderar Auschwitz. Na sua autobiografia Comandante de Auschwitz, Hoess recorda como foi transferido de Dachau para Sachsenhausen, a 1 de Agosto de 1938, e como se tornou responsável pelo pelotão de fuzilamento, tendo assistido a execuções quase diárias de prisioneiros após o início da guerra, a 1 de Setembro de 1939. Nessa mesma noite, aliás, Hoess presidiu à primeira execução em tempo de guerra. “Era um comunista que se recusara a continuar a trabalhar na fábrica Junkers, em Dessau.”
Sobre o campo, Hoess diz ainda: “Se Dachau era predominantemente vermelho, porque tinha sobretudo prisioneiros políticos, Sachsenhausen era verde”. O oficial referia-se à cor dos triângulos identificativos colocados nas vestes dos prisioneiros e em que o verde se referia aos “criminosos”.
Há indicações de que pelo menos dois portugueses passaram pelo campo de Sachsenhausen. De acordo com a Fundação para a Memória da Deportação, Francisco Ferreira, nascido em Guimarães a 13 de Outubro de 1916 esteve em Sachsenhausen, antes de ser enviado para os campos de concentração de Neuengamme e Bergen-Belsen, onde terá morrido.
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Inácio Augusto Anta é o outro. A sua história é resumida no livro Salazar Portugal e o Holocausto, de Irene Flunser Pimentel e Cláudia Ninhos. Aí, conta-se que o português, formado na Escola do Exército, saiu de Portugal em 1936, para se dirigir a Paris. Contudo, havia de parar em Barcelona, onde casou. O relato da história de Inácio Augusto Anta, feito a partir de um artigo censurado, publicado no jornal O Século, em 1945, diz que o militar perderia o filho de seis meses na fuga através dos Pirenéus, após a derrota do Exército Republicano, acabando por se sediar em Bordéus, onde se envolveria com a Resistência. Detido pela Gestapo, Inácio seria enviado para Sachsenhausen, onde contraiu tuberculose e foi morto na câmara de gás.
Não há registo de Inácio Augusto Anta na lista de transportes franceses para os campos de concentração da Fundação para a Memória da Deportação, mas há uma referência a um Ignácio Anta Gomes, nascido a 5 de Abril de 1906, sem que seja indicado como foi deportado para a Alemanha. Não se sabe se este será o mesmo Inácio Augusto Anta já referido e a historiadora Cristina Clímaco também não sabe se alguma destas pessoas é o mesmo Inácio Anta que ela refere no artigo Nos Campos de Sudoeste de França (1939-41), sobre o internamento de portugueses.
Neste artigo, Cristina Clímaco refere-se a Inácio Anta como estando, primeiro, em San Juan de las Abadesas, a comandar um grupo de “mais de três centenas” de pessoas, aquando da fuga que se seguiu à queda de Barcelona, durante a Guerra Civil Espanhola. Depois, Anta é identificado no campo de internamento francês em Argelès-sur-Mer, onde chefiou o grupo português aí colocado. “Contestado pelos comunistas, acabará por abandonar o campo português e instalar-se no espanhol. Perco-lhe aí o rasto”, admite a historiadora à 2.
O campo de Sachsenhausen foi libertado a 22 de Abril de 1945 por tropas soviéticas e polacas.