O salário mínimo
por A-24, em 30.04.14
Ricardo Arroja Só assim se entende que os partidos e sucessivos governos percam tanto tempo com uma matéria que se define essencialmente ao nível das empresas privadas, e que resulta em primeiríssimo lugar da produtividade que estas conseguem gerar. Em todo o caso, saliente-se que o salário mínimo em Portugal, atendendo ao custo de vida no País, é de facto baixíssimo, e que a competitividade da economia nacional não deve, evidentemente, assentar numa vantagem de baixos salários. Deve, sim, assentar numa lógica de valor acrescentado, que no entanto nada tem a ver com a definição de um salário mínimo deste ou daquele valor; tem sobretudo a ver com a realização de mais investimento na nossa economia.
Regressando ao salário mínimo, este aplica-se essencialmente ao sector privado, onde o nível médio de qualificações é mais baixo, e onde as empresas concorrem com as suas congéneres nacionais e internacionais, não apenas pelo valor acrescentado que produzem mas também pela estrutura de custos que exibem. Pelo contrário, na administração pública, onde os rendimentos mensais médios são mais altos - quem quiser números específicos pode consultá-los na DGAEP -, a aplicação do salário mínimo será a excepção; o mesmo sucedendo no sector empresarial do Estado. No total, existirão em Portugal cerca de 420 mil empregados por conta de outrem naquele escalão remuneratório - 13% do total de emprego dependente.
Enfim, o salário mínimo nacional, em termos absolutos, é mesmo uma lástima - que não restem dúvidas quanto a isso. Porém, em termos relativos, representando 58% do salário mediano praticado em Portugal, encontra-se acima da média da OCDE (onde o valor correspondente é de 48%). O problema está pois na remuneração mediana, e não na mínima. Mais: o problema está na reduzida produtividade do trabalho em Portugal, onde cada hora de trabalho resulta numa produtividade média de apenas 17 euros por hora (dados do Eurostat). Na União Europeia o valor correspondente é 32 euros, e na zona euro de 37 euros por hora. Evidenciamos, portanto, uma produtividade que é metade daquela que se observa no resto da Europa, e que resulta exclusivamente do nosso padrão de especialização no comércio internacional. Dito de outra forma, os nossos sectores mais competitivos no comércio externo continuam a ser muitos daqueles ditos sectores tradicionais que, tendo progredido na cadeia de valor acrescentado, recorrem ainda a mão-de-obra relativamente barata.
Em suma, sem desprimor por aquele universo de empresas - muitas seriam magníficas empresas em qualquer parte do mundo -, a alteração daquela realidade requer um "upgrade" da tipologia empresarial em Portugal, e do seu posicionamento competitivo na cena internacional. Um "upgrade" que promova salários tendencialmente mais elevados. Ora isto só será possível com níveis de produtividade bem superiores aos actuais, e estes apenas serão alcançáveis com investimento maciço. É, pois, precisamente neste ponto - na captação de investimento, que está hoje miseravelmente reduzido a 15% do PIB -, e não na discussão do salário mínimo, e se este é de 485 ou de 515 euros, que o debate deveria estar centrado. Infelizmente, há alturas em que parece não estar.