O delirio politico
por A-24, em 03.07.13
É normal os primeiros-ministros reagirem disparatadamente quando o parceiro de coligação lhes tira o tapete. Mário Soares, no Governo PS/CDS, quis manter-se no cargo quando os ministros centristas se demitiram do Governo, propondo a Eanes a sua substituição por ministros socialistas. Eanes, que era um Presidente no verdadeiro sentido do termo, respondeu a essa proposta com a imediata demissão de Mário Soares. Por esse motivo, a revisão de 1982 condicionaria a possibilidade de o Presidente demitir o Governo. No entanto, Mário Soares aprendeu que não poderia manter um Governo quando o parceiro de coligação se despede. Por esse motivo, quando Cavaco Silva foi eleito líder do PSD e Mário Soares viu posto em causa o seu Governo do Bloco Central fez uma comunicação ao país garantindo que podiam contar com ele, mas logo a seguir apresentou a demissão. Sentindo-se vingado, Eanes só aceitou essa demissão depois de um compasso de espera.
Nada disso tem paralelo com o discurso hoje de Passos Coelho que corresponde ao mais absoluto delírio político. Depois de o líder do segundo partido de coligação se demitir do Governo, Passos Coelho continuou como se nada se passasse, mantendo a posse de uma ministra contestada, rodeada de uma equipe de secretários de Estado que nem deve chegar a aquecer o lugar. À noite fez uma comunicação ao país em estilo de menino queixinhas, quase apelando ao CDS que não seguisse Portas e que lhe permitisse continuar no cargo, dizendo que se recusava a propor a demissão de Portas ao Presidente da República. Manteve inclusivamente uma viagem a Berlim, para espanto dos europeus, que devem achar que anda tudo doido em Portugal. Pelo caminho, até parece que admitiu sacrificar a própria Maria Luís Albuquerque, a troco da manutenção do CDS no Governo, como se fosse possível desfazer agora o colapso do Governo que ele próprio causou.
Passos Coelho não percebeu manifestamente o que lhe aconteceu. A forma como tratou o CDS constitui a maior afronta já feita a um partido político em Portugal e vai ter como resposta imediata a demissão em catadupa de todos os Ministros e Secretários de Estado centristas. No fim o Primeiro-Ministro ficará sozinho, apenas com Maria Luís Albuquerque, se esta tiver capacidade para aceitar esta última desfeita de Passos Coelho, mais o Ministro encarregado dos briefings governamentais. Mas nem assim Cavaco Silva demitirá o Governo, deixando provavelmente o regime, de que é o último garante, afundar-se com ele.
O PSD já deveria ter percebido que, se continuar a ser envolvido neste delírio político, acabará reduzido à dimensão do PASOK grego. A incompetência e a irresponsabilidade demonstradas por Passos Coelho nesta substituição de Vítor Gaspar levariam em qualquer país do mundo um partido democrático a mudar imediatamente de líder. De que é que se está à espera?
Luis Menezes Leitao