Momentos de glória
por A-24, em 15.08.12
por Alberto Gonçalves
Em 2012, o exacto sujeito que em 2008 justificou a derrota com a preferência pela "caminha" explicou que as medalhas são, cito, uma distracção. Eis um risco que a comitiva portuguesa em Londres não corre. E não corre mesmo. Nem lança. Nem salta. Nem nada, nada, nada.
É difícil distinguir se a "nossa" participação nas Olimpíadas é sincera ou uma paródia. No mínimo trata-se de uma paródia sincera: há atletas que desaparecem, atletas que perdem com os últimos do respectivo ranking, atletas que aproveitam para fazer os seus piores tempos dos últimos tempos, atletas que celebram oitavos lugares e, em geral, atletas que concentram todo o esforço no acto de esclarecer a populaça que não estão ali para ganhar coisa nenhuma. Se estivessem, os desgostos seriam sucessivos. A delegação nacional só é óptima nos preliminares, desde a escolha das roupas até ao desfile na cerimónia inaugural. O resto, leia-se as provas de facto, é uma mera formalidade que os campeões lusitanos cumprem, se cumprem, com enfado.
Causas? Em vez de procurar causas, é melhor aceitar os factos: não temos jeito para desportos, olímpicos ou não. Se no futebol, que preenche cerca de 74% do noticiário caseiro, Portugal nunca ganhou o que se visse (ao contrário de dez outros países europeus; invocar os clubes repletos de estrangeiros não vale), a que título haveria de ser diferente nas modalidades que sobram, de cuja existência apenas nos lembramos no momento em que os representantes pátrios nelas concorrem e invariavelmente desiludem, para usar o termo em voga?
Portugal iniciou a epopeia olímpica há exactamente cem anos e com grandes esperanças na prestação do maratonista Francisco Lázaro. Lázaro, que morreu em serviço após cobrir o corpo com sebo, deglutir estricnina e descobrir a cabeça sob um sol de 32 graus, foi a primeira desilusão. As inúmeras que se seguiram ao longo de um século tiveram, felizmente, desfecho menos trágico: daí em diante, o martírio coube exclusivamente aos espectadores.
Somar as desilusões é impossível. Somar as medalhas não custa: 22 (quatro de ouro), um pedacinho acima da Eslováquia, que se estreou em 1996 (sete de ouro). A Suíça ganhou 202 (53 de ouro). A Dinamarca ganhou 185 (44 de ouro). A Holanda ganhou 246 (71 de ouro). A Noruega ganhou 144 (54 de ouro). O poderoso Luxemburgo ganhou 5 (três de ouro). Os EUA, para tornarmos a comparação verdadeiramente divertida, ganharam 2341 (944). Sozinho, Michael Phelps regressará a Baltimore com tantas medalhas quanto Portugal, salvo o pormenor de 18 das conquistas de Phelps serem de ouro.
Dito isto, importa também dizer: a nossa falta de vocação para os Jogos Olímpicos, aliás um entretenimento inconsequente, não é grave. Grave é aproveitar os sucessivos fracassos para reclamar sucessivos apoios. Um frigorífico avariado não resolve funcionar porque crescentemente o cobrimos de ímanes coloridos. Se os atletas portugueses dispensam vitórias, de qualquer modo pessoais e intransmissíveis, é justo que dispensem igualmente os fundos públicos que lhes subsidiam as derrotas. Sob que argumento se atribui pensões de alta competição a sujeitos que insistem em optar pela baixa? A que pretexto derrotados crónicos prometem proezas a quatro anos de distância e juram que da próxima é que vai ser?
Quando muito, em 2016, o País desportivo dispõe de uma excelente oportunidade de fazer história no Rio de Janeiro: basta não ir lá. Na pior das hipóteses, tentava-se a notoriedade pela ausência, visto que pela presença é escusado.