Mais um excelente artigo sobre a atual situação política na Grécia
por A-24, em 25.03.12
Nos seus relatórios, as páginas estão cheias de análises sobre a dívida, a competitividade da economia e as reformas estruturais, mas agora, quando se fala com alguém pertencente à equipa da troika em Atenas, a conversa vai rápida e invariavelmente parar à política. A Grécia prepara-se para, dentro de pouco mais de um mês, realizar as primeiras eleições desde o início da crise e, entre os técnicos da Comissão Europeia e do FMI, o ambiente é de receio e incerteza em relação ao que irá resultar desta consulta popular. Têm motivos para isso.
Após cinco meses de um Governo com maioria parlamentar liderado pelo tecnocrata e escrupuloso cumpridor do programa de ajustamento Lucas Papademos, a Grécia pode passar, dentro de poucas semanas, para um cenário em que nenhum partido controla sozinho o Parlamento, em que líderes políticos há muitos anos de costas voltadas uns para os outros vão ter de negociar coligações e, aquilo que atormenta especialmente a troika, em que os partidos que apoiam de forma incondicional o programa de ajustamento podem, mesmo coligados, não ser maioritários.
"Os partidos políticos não se suportam uns aos outros, uma coligação é algo que não querem mesmo fazer", afirma preocupado um dos responsáveis da troika presentes em Atenas, que prefere manter o anonimato.
Publicamente, vários líderes políticos europeus têm feito apelos ao entendimento entre os principais partidos. Sexta-feira, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, defendeu numa entrevista a jornal alemão Bild que, mesmo depois do perdão da dívida e da aprovação do segundo empréstimo, a Grécia, "para ultrapassar a crise, precisa de uma situação política estável".
Mas tudo aponta para que, após as eleições - que esta semana deverão ser agendadas para 29 de Abril ou 6 de Maio -, encontrar essa estabilidade se torne ainda mais difícil. O desânimo da população em relação à situação do país e ao desempenho dos partidos é tal que o cenário mais provável neste momento, olhando para as diversas sondagens de opinião, é o colapso do equilíbrio político que imperou na Grécia durante as últimas quatro décadas.
A entrar no quinto ano consecutivo de recessão, com dolorosas medidas de austeridade a serem implementadas e com o país submetido às exigências dos credores estrangeiros, o descontentamento dos gregos em relação à sua classe política atingiu novos máximos. Cerca de 94% dos gregos dizem não confiar nos partidos políticos, o valor mais alto em toda a União Europeia (a média da UE é de 81%). E recentemente, têm-se sucedido os ataques violentos a políticos, que já levaram as autoridades a formar cordões policiais permanentes em torno das sedes dos principais partidos.
"As pessoas que estão no poder agora são as mesmas que estivavam no passado e nos conduziram para esta situação. São as mesmas 300 ou 400 pessoas e elas precisam de ser penalizadas", diz Stavros Messinis, um empreendedor na área das novas tecnologias em Atenas, que mesmo assim não mostra grande esperança no que possa vir a sair das eleições. "Não espero muito, não é pela actual classe política que vamos resolver os nossos problemas", afirma.
Entre os mais jovens, a desilusão ainda é mais evidente. "Sinto raiva. Há anos que nos prometem que as coisas vão mudar, que a corrupção vai acabar e agora estamos nesta situação. Acho que nestas eleições, vou votar em branco", diz Giannis Christidis, estudante na Faculdade de Economia da Universidade de Atenas.
Colapso do PASOK
Apesar do sentimento negativo em relação aos políticos ser geral, as forças mais visadas são aquelas que, sem interrupção, se foram alternando no poder desde que foi deposta, em 1974, a junta militar que dominava o país.
De um lado, está o PASOK, o partido de centro esquerda que em 2009, com George Papandreou na liderança, venceu as eleições com 40% dos votos e que, nas últimas três décadas esteve dois terços do tempo no poder. Agora, está em autêntico colapso, aparecendo com pouco mais de 10% das intenções de voto em todas as sondagens e enfrentando uma crise financeira interna grave (os seus funcionários já têm salários em atraso há quatro meses).
Há uma semana, Evangelos Venizelos substituiu Papandreou à frente do partido. O ex-ministro das Finanças é, com a sua reconhecida persistência e capacidade de comunicação, a única esperança do PASOK para conseguir manter alguma importância no panorama político grego.
Os seus eleitores (e também os dirigentes) estão a fugir, na maior parte dos casos, mais para a esquerda. O movimento Esquerda Democrática, criado em 2009 por Fotis Kouvelis, conta com vários "desertores" do PASOK nas suas fileiras e identifica-se como um partido de esquerda que é também pró-europeu. Nas sondagens tem aparecido sistematicamente à frente do PASOK, aproximando-se dos 20% dos votos.Mais à esquerda, a coligação Syriza tem vindo a conquistar cada vez mais espaço com a sua forte contestação ao acordo feito com a troika e consegue, em quase igualdade com o histórico Partido Comunista, mais de 10% dos votos.
Na semana passada, dois outros dirigentes do PASOK - Louka Katseli e Haris Kastanidis - abandonaram o partido e criaram um movimento para concorrer às eleições, o Pacto Social, que parece também ter condições para garantir um lugar no parlamento.
Juntos, todos estes partidos à esquerda do PASOK ameaçam chegar aos 40% dos votos e são o maior pesadelo da troika, já que todos se opõem às políticas definidas no programa de ajustamento. A concretização de uma coligação entre eles é considerada extremamente improvável, mas o seu peso no futuro Parlamento vai ser determinante, até porque pode evitar a existência de uma maioria ao centro.
Maioria difícil
À direita, a situação não é muito mais fácil para o histórico do centro-direita, a Nova Democracia, apesar de as sondagens mostrarem que será, com toda a probabilidade, a força mais votada nas próximas eleições.
O partido governava o país em 2009, quando a crise orçamental grega se tornou mais evidente. O seu novo líder, Antonis Samaras, começou por adoptar um discurso de forte oposição ao primeiro acordo com a troika, criticando sobretudo as subidas de impostos. No entanto, acabou por apoiar o segundo acordo, sendo parte integrante do actual governo liderado por Lucas Papademos. Esta inconstância faz com que a Nova Democracia, normalmente a alternativa quando o PASOK perde terreno, não se consiga aproximar dos 30% dos votos nas sondagens, ficando portanto longe de uma maioria absoluta.
Os votos têm fugido mais para a direita, para o LAOS, e mesmo para os radicais de extrema-direita Chryssi Avghi, que podem entrar pela primeira vez no Parlamento. Na semana passada, Pannos Kammenos, dirigente de longa data da Nova Democracia, abandonou o partido para formar um movimento que aposta num discurso anti-troika - os Gregos Independentes -, que promete roubar mais votos a Samaras.
Neste cenário de enorme desagregação, apesar da lei grega facilitar a criação de maiorias parlamentares através da entrega de um bónus de 50 deputados à força mais votada, já ninguém acredita que um partido sozinho possa garantir uma maioria absoluta. E existe mesmo a dúvida que os dois partidos pró-troika e que apoiam o actual Governo interino consigam ter votos suficientes para, em coligação, formarem Governo.
"As sondagens que têm vindo a ser feitas não dão uma maioria à Nova Democracia e ao PASOK. Mesmo assim, acredito que nas próximas semanas vamos assistir a uma recuperação dos dois partidos. Vai ser apertado", prevê Panagis Galiatsatos, jornalista da secção de Política do diário Kathimerini.
Subida dos extremos
Pavlos Geroulanos, ministro da Cultura e do Turismo e membro do PASOK, não acredita numa maioria ao centro para já. "Os extremos vão subir, não acredito que se consiga uma maioria na primeira eleição, vai ser preciso uma segunda ou mesmo uma terceira", afirma.
Depois não é certo que, mesmo na eventualidade da Nova Democracia e o PASOK conseguirem juntos uma maioria parlamentar, os dois partidos sejam capazes de se coligar, dado o longo historial de desentendimentos graves entre os seus dirigentes. Theodoros Pangalos, vice-primeiro-ministro do actual Governo, anunciou ontem o seu abandono da política, dando como razões o facto de o sistema político ser "corrupto" e prevendo que não se irá conseguir chegar a acordo para uma grande coligação.Será em clima de incerteza política pós-eleitoral que a troika irá, mês a mês, continuar a avaliar o desempenho das autoridades gregas para decidir se entrega as tranches do empréstimo assinado há duas semanas. A política, para a troika, permanecerá, nos próximos tempos, como o tema mais importante.
O jornalista viajou a convite da Comissão Europeia
"Os partidos políticos não se suportam uns aos outros, uma coligação é algo que não querem mesmo fazer", afirma preocupado um dos responsáveis da troika presentes em Atenas, que prefere manter o anonimato.
Publicamente, vários líderes políticos europeus têm feito apelos ao entendimento entre os principais partidos. Sexta-feira, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, defendeu numa entrevista a jornal alemão Bild que, mesmo depois do perdão da dívida e da aprovação do segundo empréstimo, a Grécia, "para ultrapassar a crise, precisa de uma situação política estável".
Mas tudo aponta para que, após as eleições - que esta semana deverão ser agendadas para 29 de Abril ou 6 de Maio -, encontrar essa estabilidade se torne ainda mais difícil. O desânimo da população em relação à situação do país e ao desempenho dos partidos é tal que o cenário mais provável neste momento, olhando para as diversas sondagens de opinião, é o colapso do equilíbrio político que imperou na Grécia durante as últimas quatro décadas.
A entrar no quinto ano consecutivo de recessão, com dolorosas medidas de austeridade a serem implementadas e com o país submetido às exigências dos credores estrangeiros, o descontentamento dos gregos em relação à sua classe política atingiu novos máximos. Cerca de 94% dos gregos dizem não confiar nos partidos políticos, o valor mais alto em toda a União Europeia (a média da UE é de 81%). E recentemente, têm-se sucedido os ataques violentos a políticos, que já levaram as autoridades a formar cordões policiais permanentes em torno das sedes dos principais partidos.
"As pessoas que estão no poder agora são as mesmas que estivavam no passado e nos conduziram para esta situação. São as mesmas 300 ou 400 pessoas e elas precisam de ser penalizadas", diz Stavros Messinis, um empreendedor na área das novas tecnologias em Atenas, que mesmo assim não mostra grande esperança no que possa vir a sair das eleições. "Não espero muito, não é pela actual classe política que vamos resolver os nossos problemas", afirma.
Entre os mais jovens, a desilusão ainda é mais evidente. "Sinto raiva. Há anos que nos prometem que as coisas vão mudar, que a corrupção vai acabar e agora estamos nesta situação. Acho que nestas eleições, vou votar em branco", diz Giannis Christidis, estudante na Faculdade de Economia da Universidade de Atenas.
Colapso do PASOK
Apesar do sentimento negativo em relação aos políticos ser geral, as forças mais visadas são aquelas que, sem interrupção, se foram alternando no poder desde que foi deposta, em 1974, a junta militar que dominava o país.
De um lado, está o PASOK, o partido de centro esquerda que em 2009, com George Papandreou na liderança, venceu as eleições com 40% dos votos e que, nas últimas três décadas esteve dois terços do tempo no poder. Agora, está em autêntico colapso, aparecendo com pouco mais de 10% das intenções de voto em todas as sondagens e enfrentando uma crise financeira interna grave (os seus funcionários já têm salários em atraso há quatro meses).
Há uma semana, Evangelos Venizelos substituiu Papandreou à frente do partido. O ex-ministro das Finanças é, com a sua reconhecida persistência e capacidade de comunicação, a única esperança do PASOK para conseguir manter alguma importância no panorama político grego.
Os seus eleitores (e também os dirigentes) estão a fugir, na maior parte dos casos, mais para a esquerda. O movimento Esquerda Democrática, criado em 2009 por Fotis Kouvelis, conta com vários "desertores" do PASOK nas suas fileiras e identifica-se como um partido de esquerda que é também pró-europeu. Nas sondagens tem aparecido sistematicamente à frente do PASOK, aproximando-se dos 20% dos votos.Mais à esquerda, a coligação Syriza tem vindo a conquistar cada vez mais espaço com a sua forte contestação ao acordo feito com a troika e consegue, em quase igualdade com o histórico Partido Comunista, mais de 10% dos votos.
Na semana passada, dois outros dirigentes do PASOK - Louka Katseli e Haris Kastanidis - abandonaram o partido e criaram um movimento para concorrer às eleições, o Pacto Social, que parece também ter condições para garantir um lugar no parlamento.
Juntos, todos estes partidos à esquerda do PASOK ameaçam chegar aos 40% dos votos e são o maior pesadelo da troika, já que todos se opõem às políticas definidas no programa de ajustamento. A concretização de uma coligação entre eles é considerada extremamente improvável, mas o seu peso no futuro Parlamento vai ser determinante, até porque pode evitar a existência de uma maioria ao centro.
Maioria difícil
À direita, a situação não é muito mais fácil para o histórico do centro-direita, a Nova Democracia, apesar de as sondagens mostrarem que será, com toda a probabilidade, a força mais votada nas próximas eleições.
O partido governava o país em 2009, quando a crise orçamental grega se tornou mais evidente. O seu novo líder, Antonis Samaras, começou por adoptar um discurso de forte oposição ao primeiro acordo com a troika, criticando sobretudo as subidas de impostos. No entanto, acabou por apoiar o segundo acordo, sendo parte integrante do actual governo liderado por Lucas Papademos. Esta inconstância faz com que a Nova Democracia, normalmente a alternativa quando o PASOK perde terreno, não se consiga aproximar dos 30% dos votos nas sondagens, ficando portanto longe de uma maioria absoluta.
Os votos têm fugido mais para a direita, para o LAOS, e mesmo para os radicais de extrema-direita Chryssi Avghi, que podem entrar pela primeira vez no Parlamento. Na semana passada, Pannos Kammenos, dirigente de longa data da Nova Democracia, abandonou o partido para formar um movimento que aposta num discurso anti-troika - os Gregos Independentes -, que promete roubar mais votos a Samaras.
Neste cenário de enorme desagregação, apesar da lei grega facilitar a criação de maiorias parlamentares através da entrega de um bónus de 50 deputados à força mais votada, já ninguém acredita que um partido sozinho possa garantir uma maioria absoluta. E existe mesmo a dúvida que os dois partidos pró-troika e que apoiam o actual Governo interino consigam ter votos suficientes para, em coligação, formarem Governo.
"As sondagens que têm vindo a ser feitas não dão uma maioria à Nova Democracia e ao PASOK. Mesmo assim, acredito que nas próximas semanas vamos assistir a uma recuperação dos dois partidos. Vai ser apertado", prevê Panagis Galiatsatos, jornalista da secção de Política do diário Kathimerini.
Subida dos extremos
Pavlos Geroulanos, ministro da Cultura e do Turismo e membro do PASOK, não acredita numa maioria ao centro para já. "Os extremos vão subir, não acredito que se consiga uma maioria na primeira eleição, vai ser preciso uma segunda ou mesmo uma terceira", afirma.
Depois não é certo que, mesmo na eventualidade da Nova Democracia e o PASOK conseguirem juntos uma maioria parlamentar, os dois partidos sejam capazes de se coligar, dado o longo historial de desentendimentos graves entre os seus dirigentes. Theodoros Pangalos, vice-primeiro-ministro do actual Governo, anunciou ontem o seu abandono da política, dando como razões o facto de o sistema político ser "corrupto" e prevendo que não se irá conseguir chegar a acordo para uma grande coligação.Será em clima de incerteza política pós-eleitoral que a troika irá, mês a mês, continuar a avaliar o desempenho das autoridades gregas para decidir se entrega as tranches do empréstimo assinado há duas semanas. A política, para a troika, permanecerá, nos próximos tempos, como o tema mais importante.
O jornalista viajou a convite da Comissão Europeia
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