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A-24

"Guardiola. Vou só ali e já venho."

por A-24, em 25.05.12
O Athletic Bilbao é provavelmente a equipa mais romântica da Europa. Joga na Catedral San Mamés, o único estádio espanhol ainda de pé desde os primórdios da 1.a divisão em 1929. Há mais de cem anos que o plantel é inteiramente basco, seja formado em Bilbau ou não (imagine-se um Sporting ou Benfica só com lisboetas ou um FC Porto com portuenses). Para romantizar ainda mais, Marcelo Bielsa é o treinador. Aliás, treinador-poeta. Cada vez que fala naquele tom elegante, o argentino puxa por nós, obriga-nos a pensar, não se limita a debitar banalidades. Isto é o Athletic Bilbao, mais que um clube por supuesto.
Acontece que esse romantismo, evidente e plural, está a fazer história para o lado errado. Se hoje perder a final da Taça do Rei para o Barcelona, o Athletic arrisca-se a passar à história como a equipa mais ineficaz do século, depois de ter assistido à coroação do Real Madrid como campeão espanhol (3-0 na Catedral) e à do Atlético Madrid como vencedor da Liga Europa (outro 3-0, numa catedral recém-montada em Bucareste). Hoje, em Madrid, ver-se-á de que é feito este Athletic.
Do outro lado, está a equipa mais eficaz da época (actual campeão mundial e vencedor da Supertaça europeia e espanhola). É o Barcelona, outra equipa romântica mas já casada com títulos. Ao todo, são 13 desde 2008, quando Guardiola aceita passar da equipa B para a principal. Esse salto de Pep atira o Barça para a estratosfera e começam as comparações com o Milan de Sacchi. Por volta de 2010, 2011, o Milan de Sacchi é já um recuerdo. Ao futebol de alta qualidade, com muitos golos marcados e poucos sofridos (Valdés é o guarda-redes menos batido do campeonato espanhol há quatro anos consecutivos), alia-se a finesse tecnico-táctica de virtuosos da bola como Daniel Alves, Xavi e Messi. Estes três nomes não são chamados para aqui ao acaso… (as reticências servem para criar um ambiente tenso)
O Barça-Atheltic de hoje marca a despedida de Guardiola. Anunciado o adeus há um mês, numa conferência de imprensa acompanhada por centenas de jornalistas, Guardiola diz-se fisicamente desgastado. Antes de se dirigir à comunicação social, Pep reúne os jogadores e comunica-lhes a decisão. “São os melhores e estou orgulhoso de vocês. Fizeram-me sonhar muito mais do que pude imaginar mas agora falta-me a energia para continuar e é o momento de sair.”
A admiração de Guardiola pelos seus jogadores é enorme e vice-versa, mas 2011/12 significa o aparecimento dos primeiros sinais de turbulência num plantel vencedor. O primeiro desencontro de ideias é logo em Setembro. O Barça joga com a Real Sociedad no Anoeta e Guardiola deixa Messi no banco por o considerar cansado da recente viagem a Buenos Aires para representar a selecção. A ganhar por 2-0, os catalães deixam-se empatar e perdem dois pontos fáceis. O argentino joga a segunda parte mas isso não lhe chega. O enfado é notório no dia seguinte, quando Messi falha o treino. A partir daí, o argentino não volta a falhar um jogo. Com ou sem selecção pelo meio. O princípio é básico: Messi quer jogar sempre desde que esteja em condições e não há nenhum Guardiola que lhe barre o caminho.
Outro problema surge com Daniel Alves. O lateral chega mais tarde das férias de Natal no Brasil (onde é que já ouvimos isto?) e menos delgado. A dupla infracção é só a ponta do icebergue – Guardiola e Dani têm frequentes choques, provocados por questões tácticas. E chega-se ao episódio mais inesperado de todos. “Necessito a tua alegria, o grupo necessita a tua alegria”, diz Guardiola a um dos capitães, que lhe responde. “Agora não me venhas com essas histórias.” Credita-se este desabafo a Xavi, cujas dores musculares obrigam-no a representar um papel mais secundário (e indesejável).
Guardiola sai hoje. Será sempre em ombros, quer levante ou não a Taça do Rei. Com energia, ganha 13 troféus, que lhe permitem ultrapassar em títulos (73-72) o Real Madrid, curiosamente o adversário mais goleado na sua era (33 golos em 15 jogos).