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A-24

Futebol é como o país: joga-se quase só no eixo da Auto-Estrada do Norte

por A-24, em 02.01.11
Clubes concentrados no litoral. Há dez anos que não há representantes do interior na I Liga. Norte do Mondego em maioria, apesar de alguma quebra no Grande Porto. Viragem a norte ocorreu no final dos anos 1970.
Sabe qual é o clube de futebol da I Liga que está mais longe do mar? É o Vitória de Guimarães, sediado numa cidade que fica apenas a 41 quilómetros da praia em linha recta. Este é um exemplo de como também o futebol português está concentrado no litoral, não havendo há dez anos qualquer representante do interior na I Liga: o último foi o Campomaiorense, em 2000-01."Mais do que a relação Norte-Sul, a maior característica é haver uma concentração de clubes no eixo da Auto-Estrada n.º 1", destaca Paulo Reis Mourão, professor de Economia na Universidade do Minho.
E esta concentração não é uma mera coincidência. "A nível europeu, constatamos que há três grandes características para um clube ser competitivo: estar numa área industrializada e com bom rendimento per capita, ter boas infra-estruturas e saber desenvolver talentos", refere este professor.O território português não está bem representado na I Liga de futebol, mas em termos populacionais o cenário é bem diferente. Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, nos distritos com equipas no principal campeonato vivem 7,2 milhões de habitantes, quase 70 por cento da população - e a localização dos clubes coincide com as zonas de maior densidade populacional.Outro dado relevante para justificar esta distribuição inclinada para o litoral é o facto de a existência (e o sucesso dos clubes) "depender da capacidade da economia local gerar excedentes, que permitam apoiá-los", destaca Reis Mourão. E dados de 2007, também do INE, demonstram que dos actuais 16 clubes da I Liga apenas seis (V. Guimarães, Rio Ave, Paços de Ferreira, Naval, Leiria, e Olhanense) se situam em concelhos com poder de compra inferior à média nacional.Além da exclusividade do litoral, uma análise à distribuição geográfica dos clubes também permite concluir que a maioria se situa a norte do Mondego, apesar de nesta época o Sul estar mais bem representado, com Olhanense e Portimonense.Viragem nos anos 1970Nos primórdios do campeonato (1934-35), os clubes a sul do Mondego dominavam, estando sobretudo concentrados na Grande Lisboa. "Era o pólo mais forte do futebol do país", sublinha Ricardo Serrado, autor de dois volumes sobre a História do Futebol Português. O cenário manteve-se praticamente inalterado até meados dos anos 1970, salvo raras excepções, até que no final dessa década ocorreu a transição.Após o 25 de Abril, as equipas acima do Mondego ganharam mais expressão e as ilhas também passaram a estar representadas. 
Clubes históricos da Grande Lisboa, como o Oriental (74-75), CUF (75-76), Atlético e Montijo (76-77) e Barreirense (78-79), participaram pela última vez na I Divisão, abrindo espaço para a ascensão de mais clubes a norte, como Famalicão, Penafiel, Rio Ave e Sp. Espinho, entre outros."As empresas do Sul do Tejo entraram num processo de estagnação", comenta Paulo Reis Mourão, destacando, por outro lado, o surgimento em força da indústria têxtil no Norte. A mesma indústria que entrou em crise nos últimos anos, levando atrás clubes como Tirsense, Famalicão e Aves.A crise económica no Norte é também apontada como uma das razões para alguma perda de influência do Grande Porto, esta época representado por três clubes e sem históricos como Salgueiros e Boavista. De qualquer modo, e numa altura em que a Grande Lisboa tem a menor representação da sua história (só duas), não se vislumbram grandes alterações a curto e médio prazo, sendo previsível que o futebol continue no litoral e mais a norte do que a sul.É que a II Liga de futebol é formada maioritariamente por clubes acima do Mondego: as excepções são Estoril, Belenenses, Fátima e Santa Clara. E mesmo o regresso do interior ao principal campeonato português está nas mãos de apenas um clube, o Sporting da Covilhã, que já esteve 15 anos na I Divisão e agora participa na II Liga.Mas será que é benéfico para um clube haver muitos outros na mesma região? As opiniões dividem-se. "Uma teoria diz que, quando temos mais equipas à nossa volta, nos tornamos mais competitivos", aponta Paulo Reis Mourão. "Outras dizem que só é bom até certo ponto, porque os clubes passam a partilhar recursos e ficam menos competitivos." 
Uma ideia sublinhada por Ricardo Serrado, lembrando o caso de muitos clubes da Grande Lisboa, que foram "engolidos por Benfica e Sporting", porque a capital deixou de ter "capacidade para ter tantos clubes grandes e médios".Geografia influencia resultados?A ascensão do FC Porto e de Pinto da Costa coincidiu com o aumento do número de equipas nortenhas na I Divisão. Será que há alguma relação entre uma coisa e outra? "Penso que não", responde o historiador Ricardo Serrado. "Entre 1974 e 94, o Benfica ganhou mais do que o FC Porto [dez títulos contra oito]", lembra o autor de dois volumes sobre a História do Futebol Português. Certo é que o centro do poder do futebol nacional se deslocou para norte, como salienta Cunha Leal, ex-director executivo da Liga, um organismo cuja sede fica no Porto. "A concentração geográfica gera centros de poder", diz Cunha Leal.