Chipre rejeita chantagens
por A-24, em 19.03.13
O Parlamento de Chipre acaba de dar um exemplo a todos os povos europeus, rejeitando sem um único voto a favor a grosseira chantagem que lhe tinha sido realizada pelo Eurogrupo. Neste momento a Europa chegou a tal ponto que é uma conferência de Ministros de Finanças estrangeiros que se julga capaz de dar ordens aos Estados-Membros da União sobre a sua política fiscal. A sagrada regra da democracia segundo a qual só os representantes do povo podem votar o lançamento de impostos ao povo — no taxation without representation — estava a ser descaradamente espezinhada pela União Europeia, com a complacência dos parlamentos dos países resgatados. Mas finalmente houve um parlamento verdadeiramente democrático que não aceitou ser fantoche de Ministros estrangeiros reunidos em conferência telefónica. Chipre está de parabéns.
Esta decisão do Parlamento cipriota vai ter provavelmente consequências dramáticas para o Chipre, lançando-o na bancarrota e implicando a saída do euro. Mas não deixa de ser um gesto de liberdade, de um país que finalmente rompeu as correntes com que o queriam agrilhoar. Lembra-me neste aspecto a revolução húngara de 1956, o primeiro grito de revolta contra a opressão soviética. Na altura os revoltosos eram aconselhados a terminar com a revolta, já que a União Soviética nunca permitiria que a Hungria se libertasse, pelo que as consequências poderiam ser terríveis. Os revoltosos respondiam com a canção de Doris Day, "Que sera sera", não se importando com esta ameaça. E efectivamente verificou-se a prometida invasão soviética e uma feroz repressão na Hungria, mas a semente lançada em 1956 floresceu e foi decisiva para a queda do bloco de Leste 30 anos depois. Atrevo-me a dizer que o Parlamento do pequeno Chipre acaba de provocar o rombo no navio-pirata em que se transformou a União Europeia e que a partir de hoje nada ficará como dantes. Que sera sera.
Delito de Opinião por Luís Menezes Leitão