Adrian Newey: O engenheiro genial é a chave do sucesso da Red Bull
por A-24, em 21.11.10
Ter dinheiro e bons pilotos é fundamental, mas não é suficiente para vencer um Campeonato do Mundo de Fórmula 1. É sempre obrigatório ter um bom carro. Esse factor foi ainda mais decisivo no campeonato que terminou no domingo, porque os pilotos da Red Bull cometeram alguns erros que podiam ter custado caro. Valeu-lhes a superioridade do monolugar criado por Adrian Newey, um engenheiro que ganha tanto como um bom piloto (oito milhões de euros por ano) e que é considerado um génio da Fórmula 1.
"Adrian Newey foi o homem-chave deste Mundial e o facto de ser pago ao nível de um piloto de ponta justifica o investimento", diz ao P2 Luís Vasconcelos, o único jornalista português que acompanha ao vivo o Mundial de Fórmula 1. "Um piloto tem altos e baixos. O Newey não tem baixos."
Newey não é um desconhecido na Fórmula 1. Em 30 anos de carreira transformou-se no mago do design e, desde a década de 1990, ajudou a ganhar sete campeonatos de pilotos, apenas menos um do que Ross Brawn, o homem que acompanhou Schumacher na Benetton (1994 e 1995) e na Ferrari (2000 a 2004) e Button na Brawn (2009). Depois de ter sido campeão na Williams e na McLaren, Newey repete agora a façanha na Red Bull, igualando Ross Brawn como campeão em três equipas diferentes.
O mérito de Newey nos triunfos de Sebastian Vettel e da Red Bull é ainda maior se tivermos em conta que a equipa austríaca apenas foi criada em 2005. Em pouco tempo, este engenheiro e os seus companheiros transformaram uma novata em campeã do mundo.
É por isso que esta é também a vitória mais pessoal de Newey. Na Williams, ajudou nos títulos de Nigel Mansell (1992), Alain Prost (1993), Damon Hill (1996) e Jacques Villeneuve (1997), mas era o "número dois" de Patrick Head. Na McLaren, criou o carro que deu o bicampeonato a Mika Hakkinen (1998 e 1999), mas na equipa britânica "não há individualidades", como destaca Luís Vasconcelos.
Agora, a Red Bull foi construída à sua imagem. "A Red Bull era uma folha de papel em branco. Muita gente disse a Adrian Newey que ele era louco em vir para cá, mas ele provou que estavam errados", disse ao diário britânico TheGuardian Christian Horner, chefe da equipa, elogiando a "tremenda criatividade e o olho para o detalhe" do engenheiro que é também director técnico.
Mas, afinal, o que distingue Newey de outros engenheiros da Fórmula 1? "É um génio. Ele nasceu para aquilo", responde Domingos Piedade, um profundo conhecedor da F1 e amigo do britânico. "Ele encontra soluções sensacionais para tornar os carros mais rápidos. Muitas vezes os outros copiam, mas não sabem por que funciona. Mas ele sabe", completa Piedade.
"Adrian é o último dos génios que nos restam", acrescenta Luís Vasconcelos, sublinhando como ele criou este ano um carro muito superior aos da concorrência. Tão superior que foi capaz de resistir aos erros dos pilotos, a azares mecânicos (com os motores Renault) e também a algumas más decisões estratégicas da equipa.
O homem do lápis
Nascido em Stratford-upon-Avon, Adrian, 51 anos, é filho de um cirurgião veterinário e começou muito cedo a andar nos karts - ainda hoje gosta de pilotar, participando em corridas de clássicos e até nas 24 Horas de Le Mans, sendo conhecido por alguns acidentes aparatosos. Além, provavelmente, de alguma falta de jeito, Adrian nunca teve muito sucesso nas corridas porque não tinha dinheiro. À falta de meios, o miúdo entreteve-se então a arranjar karts velhos e a encontrar maneiras de os melhorar.
Começou assim a paixão pela mecânica, transformada depois num saber. Formou-se em aeronáutica e astronáutica na Universidade de Southampton, Reino Unido, e fez uma tese sobre o efeito-solo, um tema que atraiu imediatamente a atenção das equipas de Fórmula 1.
Mal saiu da universidade, Newey foi trabalhar para a March e passou a década de 1980 entre as corridas de F1 e as competições de carros nos EUA, antes de em 1990 se mudar para a Williams, onde começou a construir a sua lenda.
Uma lenda que o apresenta hoje como o dinossauro do design. Tudo porque recusa desenhar os seus carros no computador. Usa antes o papel e o lápis. "Talvez seja o último dinossauro", confessou o próprio Newey ao Guardian. "Mas tenho sorte. Sou o último de uma geração de engenheiros em que o automobilismo era pequeno e podíamos estar envolvidos em diferentes áreas."
O mais rápido
Esse conhecimento transversal é também um dos segredos do sucesso deste engenheiro, cuja genialidade se manifesta mais quando há mudanças radicais de regulamentos, como aconteceu em 2009. É nessas alturas que ele consegue descobrir mais depressa do que os outros as soluções mais eficazes. A Red Bull só não foi campeã no ano passado porque a Brawn encontrou uma lacuna no regulamento e construiu um difusor traseiro duplo, que todos os outros julgavam ser ilegal.
Mas este ano Newey aperfeiçoou o carro de 2009 e criou algo inalcançável para os rivais. Um monolugar em que depositou muito trabalho, até porque tem fama de ser workaholic. O próprio confessa que, às vezes, acorda a meio da noite com ideias e as transforma em desenhos. E Domingos Piedade - que partilha com ele a admiração por Ayrton Senna e o gosto por pins do mítico piloto brasileiro - lembra que Newey é conhecido por, antes das corridas, passar o tempo de olhos no chão, a avaliar os outros monolugares:"Está continuamente a olhar para os outros carros, vê a altura do chão, a aerodinâmica. Os olhos estão a filmar tudo."
O gosto de Newey por desafios e a sua aversão à rotina geraram muitos rumores sobre a sua partida para outras áreas, até porque é conhecido o desejo de um dia desenhar um iate para vencer a Taça América em vela. Mas Luís Vasconcelos acredita que esse objectivo será adiado. "Este Mundial garante mais cinco anos de Adrian Newey na F1", diz o jornalista do Autosport sobre um homem que considera genial e que tem, como todos os génios, algumas peculiaridades. Na McLaren, pintou as paredes do seu escritório de azul e no ano passado festejou de uma forma sui generis a "dobradinha" da Red Bull na Grã-Bretanha: usou um Ferrari California para fazer piões no jardim de Christian Horner, o chefe da Red Bull. Agora ficamos todos à espera de saber como terão sido os festejos de mais um título mundial.