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A-24

A Eterna Indefinição do PSD

por A-24, em 10.11.12

A indefinição política tem sido uma constante ao longo a curta vida democrática em Portugal. Principalmente da parte dos partidos da chamada “Direita”. Hoje, esta está patente no abismo que separa as acções da coligação do seu programa, os discursos dos ministros das suas propostas e na própria dualidade das reacções dos militantes de ambos os partidos. Os próprios nomes são confusos. Partido Social Democrata e Centro Democrático Social. O PSD, principalmente, tem sido um case study até por académicos estrangeiros. As suas características de catch all party apresentam vantagens e destanvagens. A principal vantagem é a sua capacidade em captar uma massa significativa de quadros dos vários quadrantes políticos que o compõem, com opções políticas totalmente distintas (eu próprio já fui militante do PSD).
Mas o mais significativo e que o distingue de muitos dos partidos estrangeiros à Direita são as constantes jogadas e alinhamentos, imprevisíveis e que superam em muito a fixação ideológica. E aí temos um Passos Coelho na sua primeira candidatura, por exemplo. Apresentou um programa de cariz bastante liberalizante, incluíndo o cheque-saúde e o cheque-ensino e um leque de privatizações, CGD incluída. Curiosamente o seu principal apoiante em termos de “barões” foi precisamente Luís Felipe Menezes, assumidamente de “Centro-Esquerda” e Social Democrata – a adjectivação é sua – e com uma política autárquica que faz jus à sua posição política. Muito poderia ser dito sobre estas jogadas, que são típicas da política. O que surpreende é a escala e a frequência com que acontecem neste caso. Erradamente, a constituíção do PSD como um partido em que entram pessoas de todos os quadrantes é atribuída ao Cavaquismo.
Eu discordo. É verdade que desde esse período existiu uma abertura a novos militantes e uma idefinição ideológica bastante rara. É certo que a estranha fusão entre keynesianismo económico, expansão do estado social e conservadorismo social faz parte dessa indefinição. E está claro um partido cujos presidentes nas últimas décadas tiveram propostas que vão desde um choque no IRS a aumentar o mesmo tem sérias dificildades é seguir uma linha.
Mas retornemos à sua fundação. Os dois primeiros anos de vida deste partido foram de caos. Sá Carneiro, muitas vezes tido como um líder estabelecido ficou perto de perder o primeiro congresso do, à época, PPD – estes acontecimentos estão muito bem detalhados nos dois volumes de “A Revolução e o Nascimento do PPD”, por Marcelo Rebelo de Sousa. Não perdeu por mérito de alguns dos seus apoiantes à esquerda, como Marcelo Rebelo de Sousa e pela sua habilidade em criar consensos – cuja falta normalmente lhe é atribuída. A outra facção, liderada por Jorge Sá Borges, daria muitas dores de cabeça, até à primeira cisão do partido em finais de 75. Antes, Emídio Guerreiro, esquerdista ferrenho – até para a ala mais à esquerda da JSD, que por sinal expunha bustos de Marx nos Congressos – assumiria a presidência do Partido. E durante o resto da década assistiríamos a diversos cenários de guerrilha interna e grandes ou pequenas cisões. O clima constante de divergência interna, nos temos em que o observamos no PPD\PSD não resulta apenas do habitual debate democrático, resulta, de facto, da mistura de gentes com pensamentos demasiado diferentes para se sentarem à mesma mesa, interesses esses apenas arrefecidos por interesses pessoais ou políticos. Há que recordar que, por exemplo, a facção que os Sá Carneiristas combatiam em 74\75 defendia uma coligação com – pasme-se – o PCP. Há que ter em conta que as Opções Inadiáveis de 78 defendiam a reafirmação do “cariz Social-Democrata” do paritdo e do pedido que o PPD havia feito para se filiar na Internacional Socialista. E o próprio desconforto em relação à área Balsemista, por parte dos principais Sá Carneiristas – como Rebelo de Sousa ou Helena Roseta – e mesmo de Cavaco Silva, durante a AD-pós Sá Carneiro demonstra um período em constante crise. Sá Carneiro teve muitas culpas no cartório. Os seus constantes zigue-zagues políticos, que foram desde o modelo sueco – bastante estatizante à altura – até encabeçar um programa de cariz liberalizante com a AD – para logo de seguida meter parte dele na gaveta. A incapacidade do seu Governo e do seguinte em conter a despesa foi uma causa directa da intervenção do FMI. Se tivesse criado um novo partido, como muitas vezes afirmou ou definido realmente o PSD – causando uma nova cisão – a política em Portugal teria sido muito diferente e, provavelmente, muitos erros derivados de certas escolhas eleitorais não teriam acontecido. Mas não, a confusão manteve-se.

Até o  nome, como disse anteriormente, Social-Democrata, é curioso. O PSD, na oposição, tem um discurso à Direita, governa à Esquerda em tempos de vacas gordas e assume um pragmatismo com laivos de imbecilidade quando governa em tempos de crise. Logo, o principal contributo do Cavaquismo não foi a transformação do PSD num partido catch all, ele sempre o foi, mas sim o estabelecimento de um conjunto de interesses, privados e políticos e o aprofundamento do caciquismo e do carreirismo, aliados a uma crescente indefinição ideológica e que pacificou as divergências internas ao ponto de, na situação actual e com um orçamento que gera discordância não só nos militantes, mas nos próprios ministros, nenhum deputado (do continente) se apressa a divulgar o seu voto contra ou, pelo menos, a sua abstenção. É triste.