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A-24

A bipolarização e a lição açoriana

por A-24, em 16.10.12

Os resultados nas eleições regionais dos Açores devem ser analisados tendo em conta a realidade açoriana. E só podemos concluir uma de duas coisas: ou que o PS foi premiado pelo seu trabalho, ou que nas regiões, assim como nas autarquias, quem está no poder tende a ser reeleito, fruto de pequenez do meio, que contribui para a construção de redes de dependência que demoram a romper. Pode até dar-se o caso de serem as duas coisas em simultâneo. Neste caso, no entanto, Carlos César abandonou o cargo sem que a tal fosse obrigado, coisa rara quando a derrota não é mais que certa. E pelo menos nisso, deve ser um exemplo para muitos políticos, a começar pelo seu congénere madeirense.
No entanto, não faltou quem tivesse tentado tirar conclusões nacionais. Pelo menos Paulo Portas e Passos Coelho, que se responsabilizaram pelos resultados, e Luís Fazenda, que considerou que a derrota do PSD e do CDS é de leitura nacional, seguiram esta linha.
Não sei se estas leituras são legítimas. Sei que elas devem ser coerentes. Se não forem legítimas, Carlos César, pelo seu trabalho, e Vasco Cordeiro, pela sua campanha, são os principais responsáveis por este resultado. E os restantes candidatos foram incapazes de se apresentar como alternativas. Apenas isto. Se forem legítimas, o PSD e o CDS estão em apuros. Mas não são os únicos: BE e PCP também foram penalizados, com perdas significativas de votos. No caso do Bloco, trata-se da quarta derrota consecutiva (presidenciais, legislativas, Madeira e Açores). Fazem então pouco sentido as conclusões do dirigente bloquista: se a derrota do PSD (que até subiu) vem do continente, teríamos de concluir que as do Bloco e do PCP também viriam. Que a sua mensagem, na oposição, não está a passar. E teriam de tirar alguma conclusão deste facto.
Devo dizer que não tendo a tirar conclusões nacionais tão evidentes destes resultados. Mas as alguns ensinamentos podem dali vir. Os partidos à esquerda (e o mesmo poderia dizer o CDS) responsabilizaram a bipolarização pelos resultados. A bipolarização acontece quando os partidos fora do centrão não conseguem mostrar aos eleitores a sua utilidade. Quando os resultados podem parecer mais incertos (e afinal não eram), os eleitores tendem a desprezar o papel da oposição e a querer apenas saber quem vai governar. Se os partidos mais à esquerda, mal ou bem, não é agora esse o debate, não parecem disponíveis para fazer parte de soluções de governo, tendem a ser ignorados pelos eleitores. Foi o que aconteceu nos Açores, com os votos a concentrarem-se no PS e no PSD.

Juntemos os resultados da Madeira, nas últimas eleições, onde aconteceu exatamente o oposto - dispersão de votos por pequenos partidos - para tentar compreender o comportamento dos eleitores. Se, como aconteceu na Madeira, o resultado é mais do que previsível, os eleitores descontentes tendem a dedicar o seu voto ao protesto. E, como ele tem apenas essa função, podem escolher o os sinal protesto mais eloquente. Foi o que aconteceu com o partido de José Manuel Coelho, que com muito circo roubou muitos votos à esquerda.
Não acho que se possam tirar grandes conclusões das eleições açorianas para o País. Mas acho que se podem aprender alguma coisa. A nenhum partido chega existir, ou até ter razão, para justificar a sua utilidade aos olhos dos cidadãos. A sua utilidade pode estar, está muitas vezes, na oposição. Mas chega um momento, quando os eleitores sentem que a escolha de quem governa está em causa, que isso pode não chegar.
Se querem fazer alguma transposição para a situação nacional, vale a pena ter isto em conta. Quer a esquerda à esquerda do PS depender da falta de credibilidade do líder socialista de cada momento para garantir o seu crescimento? Se sim, a grande aposta do Bloco e do PCP terá de ser o desgaste do PS, deixando evidentes as suas fragilidades e contradições. Cavar o fosso e atirar o PS, em todas as oportunidades, para os braços da direita e da troika. Ou quer ser um elemento fundamental de pressão, firme, eficaz e pragmática, para que a alternativa à esquerda seja o mais ampla possível? Se sim, a grande aposta do Bloco e do PCP é ganhar cada vez mais sectores socialistas para esta posição, levando o PS a inverter o seu posicionamento.
Tudo depende onde se traça a fronteira das alianças sociais e políticas que se fazem e qual é o objectivo destes partidos: reforçarem-se na oposição, à custa da tragédia, ou reforçarem as suas posições como alternativa à tragédia. As duas escolhas têm riscos e elas não são branco e preto. Não vale tudo para crescer sozinho, não vale tudo para construir uma alternativa. Mas são duas posturas diferentes.

por Daniel Oliveira, publicado no Expresso Online