"Agora que me conhecem como fraco líder, insistem mesmo em mim?". A pergunta de António José Seguro aos militantes socialistas é imaginada por Ferreira Fernandes, na última página do "Diário de Notícias". "E se o PS insistir, olhem, paciência", conclui o cronista.
Esta é uma das muitas colunas de opinião publicadas na impressa desta quarta-feira sobre o desafio pela liderança do PS lançado na véspera por António Costa a Seguro. Ferreira Fernandes parece assim defender a convocatória de um congresso. "Seguro, não indo embora, engana os socialistas."
Não é o único. Nem foi o primeiro. Ontem, na SIC, Miguel Sousa Tavares afirmava pelas 20h que "se Seguro não convocar um congresso é um suicídio político". No Expresso Diário, às 18 horas, Pedro Santos Guerreiro titulava que "
a eleição no PS é inevitável " e que deve ser o próprio Seguro a marcar um congresso. Se não, "será um ano penoso. Em vez de debatermos o assalto ao poder de António Costa, vamos discutir o apego ao poder de António José Seguro."
No mesmo jornal, também Henrique Monteiro usava a palavra, mas no sentido inverso. "
Apear Seguro é um suicídio político ", escrevia. "A forma de o PS recuperar o poder é um caminho estreito, difícil e lento. Não é a partir tudo, numa espécie de revolução por que anseiam alguns dos mais exaltados esquerdistas." Henrique Monteiro é de opinião que "Seguro vai aguentar". É o único entre os colunistas a escrevê-lo.
É melhor guerra do que paz podre
Regra geral, a opinião publicada concorda que Seguro e Costa devem enfrentar-se. Em editorial, o "DN" escreve que "Seguro tem um problema para resolver. E não se vê como possa fugir ao repto que António Costa ontem lhe lançou. Se encontrar argumentos estatutários para inviabilizar as intenções de Costa, deixará o PS (e o País) a pensar que tem medo de enfrentar o seu adversário."
António Costa, o diretor do "Diário Económico", concorda: "Pior do que a paz de conveniência, só mesmo a paz podre em que o PS necessariamente entrará se não houver uma clarificação, se mantiver o lugar de secretário-geral na secretaria, se se barricar no Largo do Rato." Se isso suceder, Seguro "será também responsabilizado pela provável decadência eleitoral do PS nas próximas legislativas, será um líder fraco".
Já é? Seguro "optou pela estratégia do assim-assim, convencido de que bastaria esperar pelo apodrecimento de um governo em desagregação para se tornar primeiro-ministro", escreve Ana Sá Lopes no "i". Seguro "crispou-se, fechou-se, refundiu-se numa trincheira. Abrir-se à sociedade não é só fazer uma convenção num hotel com Joana Amaral Dias".
O problema, diz Eduardo Dâmaso no "Correio da Manhã", é que "as vitórias de Seguro e as sondagens projetam uma ideia de crise absoluta nas próximas legislativas". "O avanço de António Costa para disputar a liderança do PS tem o mérito de acabar com as águas pantanosas em que o PS tem navegado".
Ainda no "CM", Carlos Rodrigues escreve que "o Governo prepara-se para assistir no cadeirão a uma guerra fratricida entre os socialistas. Esse é o sintoma mais claro de que o país precisa de um novo líder do PS".Há ou não congresso?
Além da vontade, há a formalidade. "Os estatutos que um dia Seguro blindou, as polcas do aparelho, as valsas dos militantes, a trabalheira que é convocar um, congresso, as trapalhadas burocráticas", escreve Maria João Avillez no "Observador". "Vai ser um calvário doloroso", antevê Ana Sá Lopes. Mas "Seguro sabe que, ainda que não convoque um congresso extraordinário, não serão as formalidades dos estatutos a travar a candidatura de António Costa", escreve o "Público" em editorial.
"O pior que pode acontecer a António José Seguro é derrotar o seu rival na secretaria, ou seja, porque Costa não consegue reunir os apoios necessários dentro da comissão nacional ou junto das federações. Isso implicaria que o PS chegaria às legislativas dividido e com uma liderança contestada." Em notícia, o "Público" pergunta em título: "O PS vai finalmente escolher entre António José e António Luís?".
E Costa, quem é?
António Costa "precisa de ter um projeto alternativo. Ou dois. Um alternativo a Seguro, outro alternativo ao Governo", escreve o diretor do "Económico". Paulo Ferreira, no "JN", diz-se mesmo pouco interessado em Costa candidato ao PS: "Interessa-me, isso sim, saber o que pensa Costa (eventual) candidato a primeiro-ministro". No "Observador", José Manuel Fernandes não crê em grandes diferenças face a Seguro. E afirma que "as propostas de Costa-candidato-a-primeiro-ministro serão sempre muito mais escrutinadas do que alguma vez foram as ideias de Costa-candidato-a-presidente-de-câmara."
Ora, escreve Ana Sá Lopes, "António Costa é corresponsável pela fraca vitória do PS" nas eleições de domingo. "Foi ele que achou que estava tudo bem e recuou numa famosa noite no Largo do Rato depois de ter tudo preparado para ser candidato à liderança do partido. Aquele era o momento certo para começar a construir a alternativa interna", sentencia. Foi Costa "que nos disse que tinha chegado a um acordo com Seguro sobre não sei o quê". Agora, resume Ana Sá Lopes, "não se lhe pode exigir menos do que a maioria absoluta. Quer dizer, se houver congresso e ele ganhar". Porque, como diz António Costa no "Económico", "é mais fácil ganhar o País do que o partido"
Fernando Sobral é menos crente. Não se referindo diretamente a António Costa, o cronista do "Negócios" sublinha que "nenhuma sociedade séria avança sem conceitos alternativos. O problema é que esta geração de políticos nasceu do mesmo aviário: são profissionais que divergiram uns para o lado direito e outros para o lado esquerdo. Mas a sua leitura da realidade é a mesma. E, por isso, não há alternativa no centro político. Para mal dos portugueses."
A boa imprensa
Tudo isto é escrito na impressa portuguesa, onde, como vimos, apenas Henrique Monteiro criticou a ação do atual presidente da Câmara de Lisboa. O diretor do "Económico" afirma que "António Costa Já tem o apoio da opinião publicada - será, provavelmente o político em Portugal com a melhor imprensa". E exemplifica: "promoveu obras antes de eleições e ninguém o acusou de eleitoralismo".
No "Correio da Manhã" (onde Eduardo Cabrita toma posição a favor de Costa, que "tem o sentido do risco e da mensagem que une"), o socialista recebe seta para cima, por mostrar "decisão que faz esquecer hesitações passadas". Costa sobe também no barómetro do "Económico", por ter dado "o passo político que faltava".José Manuel Fernandes concorda que "Costa tem, sobre Seguro, a vantagem de beneficiar de uma boa imagem pública." E isso também se vê fora dos jornais. Como titula o "Jornal de Notícias", "se dependesse das redes sociais António Costa já estaria eleito".