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A-24

O lixo em Lisboa

por A-24, em 28.12.13
Luis Menezes Leitão

Só há uma função absolutamente imprescindível a uma Câmara Municipal: é tratar da higiene urbana, onde se inclui obviamente a recolha diária do lixo. No entanto, António Costa, que sempre encarou a gestão da Câmara como um trampolim para outras funções, acha naturalmente que a recolha do lixo é demasiado prosaica para ser uma função camarária, decidindo por isso atirá-la para as juntas de freguesia. Os trabalhadores da recolha do lixo é que obviamente não gostaram de serem assim atirados às juntas, pelo que decidiram fazer greve. Essa greve está a ter um impacto tal que hoje, dia 28 de Dezembro, o lixo acumula-se nas ruas de tal forma que praticamente não se pode circular. O que faz, no entanto, António Costa? Pede aos lisboetas candidadamente que esperem até 10 de Janeiro, altura em que conta ter o problema resolvido. E entretanto propõe-se colocar contentores de obras nas ruas, como se um contentor tivesse algum efeito prático perante o lixo já acumulado. Conclui-se assim que Lisboa vai ficar por mais 13 dias a ter o lixo a acumular-se nas ruas, com os inúmeros problemas inclusivamente de saúde que isto acarreta. No dia 10 de Janeiro a maioria dos lisboetas já nem deve conseguir sair de casa, tal o lixo em frente das portas. Resta-lhes apenas o consolo de estarem a contribuir para a glória da reforma autárquica imaginada pelo Senhor Presidente da Câmara. Esta pode traduzir-se por um slogan: "o lixo às freguesias — e se for preciso aos munícipes — rapidamente e em força".

F1 - Epílogo de 2013, Antevisão de 2014

por A-24, em 28.12.13
A. Carvalho

O ano de 2013 foi péssimo para os fãs da competição em si. Apenas os apoiantes de Sebastian Vettel se salvam neste capítulo, pois assistimos a um verdadeiro "one man show" por parte do piloto alemão. Tetracampeão, aos 26 anos, igualou o maior número de vitórias numa época (13 em 19), bem como superou o maior número de vitórias consecutivas (9), o que lhe permitiu terminar o campeonato numa incrível série de 231 dias sem conhecer o sabor de qualquer outro lugar que não o primeiro no pódio. Nem nos tempos de Michael Schumacher assistimos a algo do género (não fosse a sua diferença para o segundo classificado, Fernando Alonso, também um recorde). Alonso e Nico Rosberg, com duas vitórias cada, Lewis Hamilton eKimi Raikkonen, com uma, foram os únicos que conseguiram contrariar o domínio da Red Bull-Renault em corrida, equipa que consequentemente, venceu o quarto título mundial consecutivo de construtores (a Mercedes foi a segunda classificada). 



Notas marcantes do ano foram também o fim da série de provas consecutivas nos pontos de Raikkonen (que constitui um recorde), iniciada no Bahrain, em 2012, com término no Grande Prémio da Bélgica, 27 provas depois. A McLaren realizou uma temporada para esquecer, já que foi apenas o quarto ano em que a escuderia terminou sem qualquer lugar no pódio, o primeiro em 33 anos. A Mercedes conseguiu, mesmo que por poucas vezes contrariar o domínio da Red Bull, enquanto que a Lotus, apesar dos problemas financeiros conseguiu 14 classificações no pódio (8 através de Kimi e 6 por parte de Grosjean). Mark Webber realizou a sua última temporada no escalão máximo do automobilismo, tendo sido mais notícia pelos momentos caricatos onde esteve presente, entre os quais a ultrapassagem de Vettel ao australiano contrariando a ordem da equipa, além da "boleia" que recebeu de Fernando Alonso, no Grande Prémio de Singapura, do que propriamente pelos resultados obtidos.

2014 
Para bem da competição, é urgente mudar os índices de competitividade da prova. Mais um passeio da Red Bull e será bastante prejudicial para as audiências televisivas, entre outros aspectos. Muitas mudanças importantes a ter em conta, como a existência de novos motores V6 em vez de V8, uma versão mais potente do sistema de recuperação de energia, bem como alterações a nível da aerodinâmica. "Dança das cadeiras" em algumas equipas, onde Daniel Ricciardo (ex-Toro Rosso) substitui Mark Webber na Red Bull, Pastor Maldonado substitui Raikkonen na Lotus, sendo que o finlandês segue para a Ferrari, onde formará uma dupla espectacular com Fernando Alonso. Não existirá piloto número 1 dado o temperamento dos dois, pelo que existe uma grande expectativa do que poderão fazer, na luta com Vettel. Daniil Kvyat assumiu uma vaga na Toro Rosso, lugar esse que todos os portugueses queriam que fosse para António Félix da Costa. O número total de Grandes Prémios vai manter-se nos 19: para compensar a saída dos GP da Índia e Coreia do Sul teremos o regresso do GP da Áustria e a estreia do GP de Sochi, na Rússia. O elevado número de alterações pode levar a que todas as equipas iniciam os trabalhos praticamente "a partir do zero", mas quem conta com Christian Horner, e principalmente Adrian Newey, leva logo vantagem.

Economia britânica pode ultrapassar a alemã em 2030

por A-24, em 27.12.13
A economia britânica poderá tornar-se, no espaço de década e meia, na mais poderosa da Europa, destronando, assim, da liderança o actual motor económico do velho continente, a Alemanha.


A previsão é avançada pelo Centro de Pesquisa em Economia e Negócios (CEBR, na sigla em inglês) e apoia-se no facto de o Reino Unido dispor de condições de base que não têm réplica, actualmente, na Alemanha. Entre essas condições contam-se uma população em crescimento e um regime fiscal muito mais favorável do que o germânico.

O centro adianta que o facto de a Alemanha estar unida, pelo euro, aos países periféricos que enfrentam graves limitações financeiras, tornou-se num problema que não é sentido no Reino Unido, que mantém a sua própria moeda e, por isso, conseguiu evitar os impactos mais profundos da chamada crise da dívida.

Neste contexto, o CEBR adianta que a dimensão do produto interno bruto britânico superará o da Alemanha por volta de 2030. Mas o crescimento previsto para alguns dos países emergentes como o Brasil, a Índia e a Rússia, poderá fazer com que a economia do Reino Unido caia alguns lugares noranking mundial.

“A Alemanha, teoricamente, deverá manter um bom desempenho económico no futuro próximo. Todavia, uma possível combinação de um baixo crescimento económico na zona euro, depreciação do euro, apoio a economias fragilizadas e tendências populacionais adversas faz crer que a Alemanha deverá perder a liderança europeia”, afirma o CEBR.

A maior economia do mundo é, actualmente, a dos Estados Unidos, seguida pela economia chinesa que, há dois anos, ultrapassou a dimensão do produto interno bruto japonês. Mas com ritmos de crescimento diferentes, é provável que, nas próximas décadas, o top-ten das economias sofra alguns abanões. A China, por exemplo, deverá ultrapassar a economia norte-americana já em 2018, e a Índia deverá superar o Japão no espaço de 15 anos.


O centro defende que a política anti-deflacionista lançada pelo primeiro-ministro Shinzo Abe (Abenomics) acabará por depreciar o yen com efeitos negativos sobre o desempenho económico japonês.

Kalashnikov morreu, a guerra não

por A-24, em 26.12.13
Alfredo Leite

Sudão do Sul, República Centro-Africana (RCA), Síria, Congo, Mali, Somália, Iémen, Afeganistão, Palestina, Curdistão, Líbano, Iraque, Colômbia. Todos estes conflitos e tantos outros, mais ou menos esporádicos, fizeram mortes em 2013, sendo mais do que certo que as vão continuar a causar no ano novo que se aproxima. Todos eles têm um denominador comum (e não falo da estupidez e ganância do Homem): a abundância de homens, mulheres e, não raramente, crianças empunhando metralhadoras AK47, a arma de fogo que mais matou em todo o Mundo e cujo criador morreu nas vésperas deste Natal.

Calcula-se que tenham sido fabricadas desde 1947 mais de 100 milhões de Kalashnikov, mas o número pecará por defeito. Tantos foram os acordos de fabrico com terceiros e as cópias mais ou menos autorizadas, que se tornaria impossível calcular o número de AK47 em circulação. Sabe-se, isso sim, que é uma quantidade assustadoramente letal. A razão do sucesso desta máquina de morte é mais ou menos conhecida. Não é uma arma de precisão, mas, por ser construída com pouquíssimas peças, raramente avaria. É fácil de desmontar e tolera sem dificuldade elementos fatais para os soldados, como a humidade, areia ou lama. A juntar a tudo isto, é fácil de encontrar no mercado negro e é barata.

Já vi de quase tudo o que os homens conseguem fazer com uma Kalashnikov. Na aridez do Sudão, vi meninos exaustos a dormir numa esteira rota com a metralhadora ao lado, como se de um inofensivo urso de peluche que nunca tiveram se tratasse. Lembro-me, no Curdistão, do miliciano que me obrigou a fotografá-lo com uma "Kalash" de colecionador tão impecavelmente prateada, que quase esqueci o quão mortífera era a peça exibida com despudorado orgulho. Em Angola, olhei um polícia bêbado a disparar a sua AK47 só porque sim e no Paquistão vi os amigos de um noivo a comemorarem o casamento com rajadas para o ar, no cumprimento de uma tradição difícil de aceitar aos olhos ocidentais. Ali perto, no Iraque, testemunhei o papel das Kalashnikov no que de mais horrendo tem a guerra.

Mikhail Kalashnikov - que criou a AK47 como metralhadora defensiva - disse, antes de morrer, que não seria culpa sua "se as armas fossem usadas onde não deviam". Essa era para ele uma "culpa dos políticos". Por mais cínica que pareça, é bem provável que a afirmação faça sentido.

Com tantos conflitos ativos nos vários continentes, especialmente no africano, não surpreendeu a habitual mensagem papal "Urbi et Orbi", a primeira de Francisco. Tal como não foi surpresa a escolha dos destinatários indiretos dos seus recados.

O Papa referiu os "ódios" entre os rebeldes sírios e o regime de Bashar al-Assad e lembrou o "esquecimento" da violência na RCA. Jorge Bergoglio apelou ao "feliz término das negociações de paz entre israelitas e palestinianos" e ao "caminho do diálogo" para acabar com os conflitos religiosos na Nigéria. Era bom, como pediu Francisco, que 2014 fosse o ano. É utópico, mas bastaria a vontade política. Dos políticos.

Só descobriremos se o estado é bom ou não se a iniciativa privada puder competir com ele

por A-24, em 23.12.13
Ludwig Von Mises

Nós nascemos na natureza, temos de construir formas de viver melhor e de conseguir sobreviver. Não é direito adquirido que todos nascerão com direito a tudo. Existem pessoas desassistidas no mundo inteiro e temos que lidar diretamente com esses desassistidos. Mas sempre temos de ter a confiança, pelo menos como liberais, que quanto mais liberdade para empreender e agir você tiver, maior a prosperidade. Isso tem lógica, funcionou no passado e melhorou o padrão de vida do indiano, por exemplo, que hoje vive muito melhor que um cidadão há 200 anos na Inglaterra.

Se o estado é bom no que se propõe, qual o motivo de não permitir que isso seja feito de forma voluntária e não-obrigatória? Se ele (estado) é um bom provedor de um determinado serviço, seja ele qual for, então não precisa colocar na cadeia quem compita com ele. Eu acho que o estado pode fazer tudo e também pode não fazer nada, mas só descobriremos se o estado é bom ou não se permitirmos que a iniciativa privada possa fazer o mesmo bem ou serviço em igualdade de condições. É preciso também que o estado não use o dinheiro tomado à força da população para fazer tal bem ou serviço, o que configura um privilégio gigantesco em relação à iniciativa privada e é, claramente, pouco produtivo. 

O Brasil é hoje uma economia mista, com alguma liberdade para operar no mercado e uma quantidade bastante grande de intervenção estatal. Intervenção que não agrega valor, que atrapalha, gera burocracia, desesperança, corrupção, favorecimento a grupos de interesse. Essa mistura é o que a gente tem no Brasil hoje. Acho que o mundo em geral adotou esse modelo, em maior ou menor grau, porque viu que o socialismo puro, abolindo o mercado, não funciona de forma alguma. Mas ao mesmo tempo não queriam adotar o livre mercado. Dessa forma, adotaram uma solução mista.


Os gajos porreiros

por A-24, em 23.12.13
Rui A.

Anda por aí uma lacrimejeirice pegada e politicamente correcta de homenagem às excelsas virtudes do comediante Ricardo Araújo Pereira, fazendo-se apelo a que se distinga, na sua dimensão de homem público, o actor talentoso do protagonista político equivocado.

A alma portuguesa é pródiga neste tipo de tolerância de salão, como se não fosse suficiente a um talento a sua existência para ser reconhecido, tornando-se necessária a exaltação enfática do mesmo, exercício que, em regra, visa mais a exaltação própria da virtude do tolerante que exalta, do que a verdadeira exaltação das qualidades do tolerado exaltado. Por via da regra, o exercício consiste no apelo a que se reconheçam as grandes qualidades profissionais e humanas do visado, deixando-se de lado outras suas facetas tidas como menos recomendáveis. Assim se compõe a moral social portuguesa dos “gajos porreiros”.

Isto faz-me lembrar um episódio recente da vida cultural brasileira, no qual algumas almas igualmente generosas pediram publicamente para se usar de compreensão absoluta para com os artistas vanguardistas da esquerda histórica do país, entre eles, Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, que, ferozmente incomodados com a ameaça de publicação de algumas biografias não autorizadas das suas vidas exemplares, apelaram ao “visto prévio” das mesmas, o mesmo é dizer, à reposição da censura que eles tanto tinham combatido no passado, e logo agora em proveito próprio. A este propósito, retorquindo a tão inspirados apelos, um comentador sagaz aceitou o repto e declarou: “Eu não confundo e distingo muito bem a pessoa do Caetano Veloso da sua obra musical; e considero ambos uma merda!”.

Não direi o mesmo de Ricardo Araújo Pereira, que sempre me pareceu um comediante acima da média nacional, eventualmente só abaixo de um Herman José da era jurássica e dos clássicos dos anos 50 e 60. Mas parece-me que dar importância pública às suas posições políticas para lhe salientar os méritos profissionais é um exercício muito dispensável. As escolhas políticas de Araújo Pereira só poderão dizer respeito a quem o estime como actor se se confundirem com o exercício da sua profissão. Por mim, no momento em que ele começar a fazer humor comprometido com a luta de classes e com os malefícios do neoliberalismo, se isso alguma vez acontecer, mudarei imediatamente de canal. É só isto.

Um país de imbecis

por A-24, em 23.12.13
Nuno Castelo-Branco

A propósito deste video promocional de um escritório de advogadas, depressa chegou à superfície o diabretezinho da inveja recauchutada em bons costumes. Ainda há pouco e em plena televisão estatal, grasnou indignações um representante da classe ofendida, neste caso, a dos advogados cujo cinzentismo e habilidade para certas práticas trouxeram o país à actual situação. Antes de criticarem colegas que estão no seu pleno direito de promoção publicitária, deveriam as sumidades passar em revista a longa carreira de nulidades que fornada após fornada e regime após regime, de incompetência e descaramento rechearam a história política, económica e social deste Portugal.

O fait-divers seria outro se em vez destas elegantes e bem independentes mulheres, o filme nos mostrasse os coirões do costume, precisamente aqueles que nos surgem no debatório televisivo pago ao minuto e que por sinal até é omnipresente no Parlamento, Câmaras disto e daquilo, Comissões e até foi exportável para o areópago à beira-Reno. Esse é que é a verdadeira e neo-realista República do Portugalete de sempre e que se quer tresandando a decência dependente dos mesmos de sempre, verrugas a eito, grossa papada, sapatinho raso e cambo, meias de vidro de malhas caídas e saias-saco a rigor.

Ainda sobre o exame dos professores

por A-24, em 23.12.13
João Vaz

As declarações de alguns docentes antes e após a realização (ou não ) da prova mostram, claramente, a necessidade da mesma. Indivíduos que nem sequer sabem falar português em condições estão capacitados para ensinar o quê?

Fora isso, registe-se, mais uma vez, a presença marxista no ensino, com todos os rituais que lhe estão associados, desde as cançõezinhas idiotas, os lemas pré-definidos e reveladores de uma esterilidade imaginativa que dá pena, o espírito de milícia, a intimidação do número disfarçada de esforço argumentativo - coisa que muitos desconhecem em absoluto. São quarenta anos, no fundo. Ou mais, até. Quarenta anos em que os marxistas e sequazes têm feito do ensino aquilo que querem, ao ponto de o terem levado a esta situação miserável em que está hoje.

O mundo é um lugar estranho

por A-24, em 23.12.13
Na região de Shravasti, no Uttar Pradesh, uma rapariga de oito anos de idade foi a mulher mais nova a divorciar-se na Índia. Sim, leu bem: oito anos de idade. Fatima Magree casou (casaram-na, melhor dito) com Arjun Bakridi quando tinha quatro anos de idade. Sim, leu bem: quatro anos de idade. Quatro anos depois, quando perfez oito anos – uma mulher feita, portanto –, o marido quis levantar a mercadoria. O pai de Fatima opôs-se, dizendo que preferia que a rapariga ficasse até aos 18 anos no lar paterno. Após algumas peripécias, a coisa resolveu-se, e Fatima ficou onde quis, na casa de seus pais. A UNICEF estima que, naquela região, 32,9% das mulheres casem antes da idade legalmente permitida. O distrito de Shravasti tem a maior percentagem de casamentos de menores de idade da Índia. Pormenor relevante: a literacia feminina situa-se nuns baixíssimos 19% da população.

via Malomil

Os filhos mandam nos pais

por A-24, em 23.12.13
Inês Teutónio Pereira

Pai e mãe que façam o que bem lhes apetece ao fim-de-semana são seres em vias de extinção, uns resistentes do antigo regime

Os filhos de hoje são uma espécie de hitlerzinhos sem bigode, uns verdadeiros déspotas domésticos. A época em que os filhos temiam os pais acabou e assistimos agora a um período revolucionário doméstico em curso (PRdEC). Hoje quem manda são os filhos; os pais foram depostos e vivem sujeitos a uma espécie de escravatura dos filhos. 
Num destes dias, durante esta época feliz em que os pais correm freneticamente nos centros comerciais para satisfazerem os desejos dos filhos a propósito do Natal, deparei-me com a cena da Sara (de 13 anos no máximo) e da mãe. Estava a Sara a experimentar chapéus ao espelho de uma loja enquanto a mãe esperava pacientemente que ela deixasse de fazer posses e escolhesse um dos chapéus. A criança vestia calções do tamanho de umas cuecas, umas meias cuidadosamente rasgadas e uma camisola que não lhe tapava o umbigo. Sem dúvida que estava na moda. Está claro que o chapéu preferido acabou por ser o mais caro, 50 euros. A mãe, de semblante carregado, chamou a atenção da menina para o facto de o chapéu ser muito caro e perguntou-lhe se ela não podia escolher outro. Qual quê: "É deste que eu gosto por isso é este que me vais dar." E assim foi: a mãe obedeceu, pagou e calou-se. 
Fui dali para outra loja e travei conhecimento com outra menina mais ou menos da mesma idade. Esta passeava-se com um telemóvel última geração, uma mochila de marca de surf, uns cabelos compridos e lisos como elas todas usam e calções do tamanho dos da outra. A criança dava guinchos ao mesmo tempo que falava com duas amigas em simultâneo (através do telemóvel) e mostrava-se excitadíssima porque a música que tocava naquela loja era dos One Direction (razão que a levou a ligar às amigas). O pai e a mãe, entretanto, esperavam à porta da loja que a música acabasse para se poderem ir embora: é que a filha só saía dali quando a música acabasse. 
De histórias como estas estão as escolas, os centros comerciais e as famílias portuguesas cheias. São os filhos quem mais ordena e não há reforma agrária, operários ou nacionalizações que se lhes comparem. A luta da filharada, ao contrário da luta do operariado, está mais que ganha. Um filho de hoje faz o que quer, tem o que quer, come o que quer e não recebe ordens de ninguém. Os pais obedecem. Eles acham que os desejos dos seus meninos e meninas são ordens e cumprem--nas. As regras que imperam são as regras dos gostos: se eles gostam tem de ser assim. Tudo o resto é secundário, como por exemplo o acordo dos pais. Um pequeno exemplo desta realidade são os fins-de-semana. Aos fins--de-semana os pais entretêm-se com quê? Com passear os meninos entre festas e eventos desportivos das inúmeras actividades em que a criançada participa. Pai e mãe que façam o que bem lhes apetece ao fim-de-semana são seres em vias de extinção, uns resistentes do antigo regime. É por isso que ter filhos hoje em dia é considerado uma loucura - ninguém adere por opção à condição de escravo. 
A verdade é que o regime familiar não é democrático, nunca foi: dantes mandavam os pais, agora mandam os filhos. Mas daqui a uns anos logo veremos qual é o melhor regime - os nossos filhos o dirão.

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