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A-24

Análise: Campeão com defeitos demasiado à mostra

por A-24, em 30.04.12
por Bruno Prata
Pode um título ser ganho também contra o próprio treinador da equipa campeã? Não é normal nem razoável que assim seja, mas acaba por ser essa a convicção com que se fica depois de se ouvir e ler não só boa parte da opinião pública e publicada, mas também uma grande fatia dos adeptos do FC Porto. “Somos campeões, apesar de Vítor Pereira” – eis a opinião-síntese de muitos portistas, que teimam em não admitir os méritos do seu próprio técnico.
A frase encerra alguma injustiça, porque Vítor Pereira é um treinador conhecedor e competente na maioria das vertentes do seu trabalho. Mas reflecte, por outro lado, as debilidades de alguém que mostrou não ter o necessário sentido de liderança e de comunicação. Tirando uma outra excepção, as prestações nas conferências de imprensa foram apenas sofríveis ou até pior do que isso. Do que se sabe, fica a ideia de que a sua verve também nunca resultou empolgante no balneário. Mais, alguns jogadores terão aproveitado o seu trato dócil, que já era conhecido desde o tempo em que era apenas o braço direito, de André Villas-Boas, para cometerem alguns excessos disciplinares. Nesse aspecto ter-se-á destacado um grave episódio protagonizado por Cristian Rodríguez, em que os factos terão ido muito para além da troca de palavras agressiva que constou na altura. Antes de ser definitivamente afastado, o uruguaio terá ainda agredido João Moutinho.
Tudo isto acabou por não impedir Vítor Pereira de chegar ao sucesso basicamente à custa da conjugação de três circunstâncias: o FC Porto tem um plantel de qualidade superior, como pode ser comprovado pelo orçamento que já ultrapassa os cem milhões de euros; os portistas continuam a ser clube com uma retaguarda forte e capaz de servir de “pára-raios” nos momentos de maior tensão; e, finalmente, o Benfica de Jorge Jesus não soube aproveitar os tropeções portistas e, mais do que isso, acabou ele próprio por cometer demasiados erros não forçados, voltando a ficar provado que o seu técnico tem dificuldades em gerir o desgaste nos finais de épocas.
A época seria sempre complicada para qualquer técnico do FC Porto. Porque lidar com o sucesso seria uma realidade ainda mas difícil de gerir depois de uma época inesquecível e quase irrepetível como foi a de 2010-11. Seria mais difícil até para o próprio André Villas-Boas, se este não tivesse trocado a sua cadeira de sonho pelos rublos de Roman Abramovich. O termo de comparação iria sempre funcionar como um obstáculo suplementar. As múltiplas conquistas de há ano atrás acabaram por ajudar a inflacionar a sensação de que no domingo foi garantido um título com sabor agridoce. Porque pioraram de forma substancial os resultados (não só para consumo interno mas também nas provas europeias) e, não menos importante, a nota artística dos espectáculos baixou de forma evidente.
Alguns factores alheios à vontade e às opções de Vítor Pereira acabaram de contribuir para as dificuldades. Desde logo a venda de Falcao ao Atlético de Madrid. Porque o plantel ficou claramente sem um dos melhores pontas-de-lança do futebol mundial, mas ainda porque o clube confiou em demasia na ideia de que a juventude de Kléber e os quilos em excesso de Walter não iriam impedir os dois brasileiros de se afirmarem como alternativas suficientes. Isso é tanto mais estranho quanto o FC Porto investiu mais de 51 milhões de euros em reforços, quase 30 milhões dos quais na contratação dos jovens defesas Danilo e Alex Sandro, que chegaram ao clube em Janeiro.


O outro aspecto com influência negativa resultou da instabilidade que começaram por revelar alguns jogadores que, no final da época, tinham algumas expectativas de serem protagonistas de transferências milionárias para campeonatos mais atractivos. Estão neste lote Álvaro Pereira, Rolando, Fernando, Hulk e João Moutinho, mas principalmente os três primeiros. O FC Porto não conseguiu, desta vez, o que havia logrado com grande sucesso em 2004, quando convenceu todos os principais craques, designadamente Deco, de que valia a pena esperar mais um ano antes de assinarem contratos ainda mais milionários noutras paragens para poderem perseguir (e, naquele caso, conquistar) o título de campões europeus. Claro que para isso fez diferença o facto de o FC Porto ser então treinado por José Mourinho e não pelo adjunto de André Villas-Boas...
Na área técnica, as principais críticas a Vítor Pereira resultaram da colocação de Maicon a lateral direito durante um longo período a meio da época, isto depois de Fucile (entretanto transferido para os brasileiros do Santos) e Sapunaru terem sido ostracizados sem motivo aparente, sendo que o romeno acabou mais tarde por ser recuperado. Outros reparos surgiram da colocação de Hulk na posição 9, mas a verdade é que essa solução já tinha sido utilizada aqui e ali por Villas-Boas. Nalguns jogos de maior grau de exigência acabou por ser uma opção razoável, até porque não houve paciência suficiente para com Kléber (e este também não tem ainda a estaleca psicológica para lidar com a pressão).
No final do ano, quando o Benfica ainda dispunha de cinco pontos de vantagem e o bicampeonato começava a parecer uma miragem para os portistas mais pessimistas, o FC Porto resgatou Lucho, depois de ter percebido que o Marselha andava a contar os tostões para pagar ao argentino. Apostou assim na experiência e na qualidade de um jogador que tinha ainda a vantagem de dar estabilidade e liderança a um balneário à beira de um ataque de nervos. Mas nem isso tornou suficientemente entendíveis as cedências, por empréstimo, de Belluschi, Guarín e Souza. Face ao reduzido número de médios disponíveis, valeu a Vítor Pereira as poucas lesões e castigos que afectaram os quatro médios sobrantes.

Em Janeiro também chegou Janko, um avançado austríaco de estatura elevada. Inicialmente marcou alguns golos, mas acabou por ter um rendimento de acordo com o seu preço reduzido (três milhões de euros). Trata-se de um avançado sem a mobilidade de outros que passaram com sucesso recentemente pelo Dragão, e a verdade é que o FC Porto, compreensivelmente, também não mudou o seu modelo de jogo para melhor aproveitar as suas características.

O FC Porto até entrou bem na época. Perdeu a Supertaça Europeia para o Barcelona num jogo em que até foi elogiado pela qualidade de jogo. Venceu os primeiros quatros jogos com exibições interessantes e em que Vítor Pereira até pareceu inclinado em investir cada vez mais na posse de bola e na mobilidade do meio campo para a frente.
O empate sem golos com o Feirense, em Aveiro, trouxe as primeiras nuvens negras, até porque na jornada seguinte aconteceu um empate perigoso no Dragão com um Benfica em crescendo de confiança. Mesmo assim, os portistas mantiveram o primeiro lugar até meio de Dezembro, mas perderam-no na 14 jornada, após um empate sem golos em Alvalade. Foi um período difícil para o FC Porto, fruto da comprometedora derrota em Barcelos (3-1), mas também da péssima exibição em Coimbra que custou o afastamento da Taça de Portugal. Pior do que isso, a carreira europeia foi um fracasso num grupo da Champions tido por acessível.
O FC Porto só voltaria a recuperar, ao Benfica, a liderança da Liga portuguesa na 20.ª jornada, em Fevereiro, quando bateu o Feirense no Dragão por 2-0. No mês seguinte, o Sporting de Braga ainda chegou a passar transitoriamente pelo primeiro posto, numa semana em que os “dragões” empataram em Paços de Ferreira (1-1) e voltaram a não aproveitar um deslize do Benfica, que cedeu dois pontos em Olhão.
A definição do campeonato aconteceu nas duas jornadas seguintes. Na 25.ª, o Braga começou a ver desvanecidos os seus sonhos secretos, ao perder na Luz, enquanto o FC Porto aproveitava para bater o Olhanense. Uma semana depois, no início de Abril, foi a vez de o Benfica sofrer um comprometedor desaire em Alvalade, enquanto os portistas foram a Braga alcançar uma importante e justa vitória. Jorge Jesus ainda procurou manter minimamente motivadas as suas tropas, lembrando as peripécias várias deste campeonato atípico, mas o próprio técnico do Benfica percebeu que já não havia volta a dar quando o FC Porto foi à Madeira conseguir uma das vitórias mais fáceis de sempre sobre o Marítimo.

Jogadores em destaque

Na caminhada para o título foram absolutamente determinantes alguns jogadores. Hulk apontou claramente menos golos do que na época anterior (e uma parte substancial deles na sequência de penáltis), mas foi sempre o elemento mais desequilibrador. Manteve pelo menos o seu valor de mercado. Mas o jogador com o rendimento médio mais elevado é bem capaz de ter sido o guarda-redes Helton, que valeu muitos pontos em jogos em que a equipa portista andou à deriva. Muitas vezes foi ele a disfarçar o rendimento irregular dos seus colegas de sector, designadamente Rolando, que perdeu estatuto e a titularidade. Apesar de sacrificado por vezes na direita, Maicon acabou por sobressair na defesa, até porque o jovem Mangala (o central com mais classe e futuro) ainda está num processo de maturação.
Fernando só fez 19 jogos como titular, prejudicado que foi por algumas lesões, mas rapidamente ficou claro que a equipa não tinha nenhuma outra boa solução para a posição seis. Vítor Pereira insistiu em demasia no duplo pivot formado por João Moutinho e Defour, que por demasiado idênticos nunca foram capazes de se complementar. Apesar de tudo, Moutinho foi sempre um dos portistas com rendimento mais influente, enquanto Lucho funcionou mais como reforço emocional e elemento estabilizador do que outra coisa.
Na frente, para além de Hulk, o talento de James Rodríguez foi determinante em muitas situações. Varela foi inconstante, Djalma é um jogador normal, enquanto a equipa não ofereceu a tranquilidade necessária a Kléber. Iturbe, que chegou com o rótulo de novo Messi, quase passou incógnito, sem oportunidades.
Há anos em que o treinador é considerado o pai da vitória. Noutros, o mérito é atribuído à equipa ou, no mínimo, a um ou dois craques que fizeram a diferença. No FC Porto, muitas vezes os dividendos acabam por ser principalmente atribuídos à estrutura que Pinto da Costa lidera há três décadas e que ajuda a disfarçar as debilidades e a exponenciar as virtudes. Até nisso este foi um ano atípico, porque os defeitos estiveram demasiado à mostra.

Novas definições de neoliberalismo

por A-24, em 30.04.12
O Neo-Liberal é o dragão das direitas políticas. Há sempre que o tema ou admire e, simultâneamente, todos falam sobre ele, apesar de nunca ninguém ter visto um e qualquer homem intelectualmente bem preparado ter certas dúvidas quanto à sua existência. No entanto o dragão está presente na literatura, no cinema, na mitologia. E também o Neo-Liberal está presente, em manifestos, programas  e almanaques de teoria politico-filosófica que, de certa forma, nos presenteiam com tanta ou mais fantasia que muitos dos  clássicos de dragões. Mesmo recorrendo à etimologia – arte que não domino – numa tentativa de tentar descobrir o grande mistério do neo-liberal, as dúvidas intensificam-se, não se evaporam. Ora vejamos, Neo implica novo. E eu até estou bem mais confortável a ler os velhinhos, os clássicos, que de novos nada têm. Só se fôr pela idade, mas se assim for, faria sentido começar a chamar Neo-Socialista a todo o desgraçado que me vier com estatisses. Também não me recordo de muitos casos de Liberais a la Insurgente em Governos, mas quem souber pode avisar-me, já que, ao que vejo, sofro de défice de informação. Porque Neo-Liberal é um termo abrangente. O Sócrates é Neo-Liberal e o Blair. O Papa é Neo-Liberal? Provavelmente. Enfim, com o passar dos anos, o azedar dos debates e a desinformação doutrinária o “Neo-Liberal” tornou-se o “Fáxista” dos tempos modernos. E como o Fáxista, o Neo-Liberal é culpado de todas as desgraças do mundo, a começar na crise financeira e a acabar nas hemerróides de um qualquer coitado.

In O Insurgente em resposta a:

Eu não acho que os neoliberais tenham apreço pela liberdade, ou deixem de ter. Nem acho que os neoliberais tenham uma filosofia. A "filosofia" deles é a "filosofia" da Ayn Rand: possidónia, lambida, infantil, pomposa e dramática. Há 14 anos a ouvi-los aqui no Texas, todos os dias, há muito que deixei de considerar "as ideias" da direita neo-liberal como uma coisa séria. Os argumentos deles são argumentos de miúdos com uma idade mental de sete anos. São contra ou a favor do estado consoante a discussão em que se empenham em cada dado momento. Quando se apanham no governo gastam mais que os socialistas, apertam os direitos dos cidadãos o mais que podem, impõem as ideias da semana com uma raiva evangélica e um desprezo total pela democracia ou pela liberdade. Não há lógica no discurso deles, nem regras, nem coerência interna. Por isso é tão cansativo lê-los e ouvi-los, ou tentar discutir com eles. O discurso da direita neo-liberal é um discurso fora da lógica e das regras do discurso intelectual. Não vale a pena lê-los nem ouvi-los. O Hayek está para a economia como o Paulo Coelho está para o estudo das filosofias orientais. Por isso teve uma vida insignificante até a Margaret Thatcher o desenterrar do esquecimento merecido a que o mundo o tinha votado, e o promover da mesma forma que Alan Greenspan promoveu a Ayn Rand. O Hayek e a Ayn Rand são os Thierrys Guettas da direita. 

in Esquerda Republicana

Quem Tem Mais Fobia da Ciência? A Direita (religiosa) ou a Esquerda?

por A-24, em 30.04.12
O Insurgente - Nesta entrevista, o sociobiólogo David Sloan Wilson (autor de obras como “Darwin’s Cathedral” ou “Unto Others”) entrevista o psicólogo social  Jonathan Haidt (autor de obras como “The Righteous Mind: Why Good People Are Divided By Politics and Religion“) e discutem as posições anti ciência vindas da direita religiosa e da esquerda. Apesar de a direita religiosa ser promovida na imprensa como a principal facção anti-ciência, Jonathan revela que na realidade, e apesar de se apresentar sempre como “open minded”,  a esquerda apresenta iguais níveis de antagonismo. À direita o dogma é conhecido: se a ciência revela dados diferentes do que está escrito na bíblia, (i.e. a idade do planeta), nega-se imediatamente. À esquerda, porque o seu dogma religioso é a igualdade,  quando a ciência revela diferenças inatas entre sexos, raças ou diferenças hereditárias ao nível do QI, esta é a primeira a acusar a ciência de falsidade.
Ademais, eles discutem igualmente o papel da “revisão de pares” na academia e o que acontece a estes “checks and balances” quando em determinados campos das ciências sociais (como a psicologia social) quase 100% dos pares são de esquerda.

(Grécia) Como a crise grega está a afectar as crianças

por A-24, em 29.04.12
A sala de espera do centro de cuidados primários para crianças de Kaisariani é simples: uma secretária com uma telefonista risonha que parece estar lá colada, sofás-pretos-paredes-brancas, dois tons pontuados pelas cores de dois ou três jogos e livros infantis. Lá fora, na grande janela de vidro de onde se vê a rua, um homem pinta umas grades: foram colocadas após dois assaltos. Efeito da crise.
Mas os assaltos estão longe de ser uma preocupação grande neste centro em Kaisariani, um subúrbio de Atenas conhecido por aí se terem concentrado refugiados expulsos da Turquia em 1922. Cada vez cá vêm mais pessoas e cada vez os seus problemas são maiores. Há crianças que não comem antes de ir para a escola – e desmaiam durante as aulas. 
Há um ano escolar, entre a primária e o ciclo, em que os alunos devem levar almoço de casa. Mas algumas crianças não estão a frequentar este nível porque os pais não têm nada para lhes pôr na lancheira. Há mães a dizer "o meu bebé chora e eu dou-lhe água". Quem conta tudo isto é a assistente social Katerina Zolota: "O que é que fazemos? Temos de lhes encontrar leite – agora", diz, o olhar penetrante por cima dos óculos, avermelhados tal como o cabelo, para sublinhar o efeito do que diz. E aqui o trabalho profissional no centro mistura-se com trabalho voluntário. Katerina já estava envolvida num grupo de acção social, que se dedicava mais aos imigrantes. Agora, dedica-se a todos, imigrantes e gregos. Tenta responder às necessidades que apareceram com a crise, e que são muitas.
Os voluntários vão às populares "tavernas", ao mercado, às lojas locais, e todos têm contribuído. O que vem dali é distribuído por cabazes conforme as necessidades das famílias. Os cabazes estão no centro, território neutro. "Não queremos dar ajuda na escola para não estigmatizar as pessoas", diz Katerina. Embora com a crise isto aconteça cada vez menos - agora é Electra Batha, a antropóloga social do centro, a comentar - "porque ninguém sabe se vai ter trabalho amanhã", diz enquanto põe o cabelo liso para trás da orelha. 
A associação sabe quais são as famílias que precisam, porque um voluntário já foi perguntar nas escolas quais os pais que pedem ajuda. Outra equipa angaria dinheiro para pessoas que não conseguem pagar as contas (tudo apontado num livro de contabilidade e contra um recibo, do qual a associação se orgulha, pois a prática de ter registos e passar comprovativos ainda é uma raridade). "Os pais que ajudamos depois ajudam-nos a ajudar", diz Katerina. "Vão limpar a casa de uma idosa, ou pintam a casa de outra família, por exemplo. As pessoas querem muito ajudar."


Teste do pezinho em risco

Mas o centro de Kaisariani arrisca-se, como outras instituições de saúde na Grécia, a ficar sem financiamento. A redução do orçamento do Instituto de Saúde Infantil, de que dependem (recebem metade do instituto, metade das autoridades municipais), atrasou em quatro meses o pagamento dos ordenados que tinham já sido cortados em pelo menos 20%. Os salários andam agora na ordem dos 1000 euros, alguns um pouco mais, para pessoas com décadas de experiência, ou com doutoramentos. 

Os cortes no Instituto de Saúde Infantil estão também a pôr em causa que todos os recém-nascidos façam gratuitamente o teste do pezinho, uma análise simples em que se tira uma gota de sangue do calcanhar do bebé e que permite verificar se o bebé tem doenças congénitas. O teste é importante porque algumas das doenças são tratáveis, se identificadas. 
Não foi, claro, só a saúde infantil a levar uma machadada. A saúde sofreu um corte de 13% em dois anos na Grécia. Nos hospitais, há médicos a relatar falta de tudo: de papel higiénico a seringas. Os mesmos médicos que, diz-se, levavam para casa partes do stock hospitalar de fraldas ou de pensos. E que, ouve-se uma e outra vez, esperam um pagamento extra dos pacientes. Mas já ninguém se queixa disto. Queixam-se de estar a ficar sem coisas básicas.

Um exemplo: várias farmácias de hospitais fecharam, e as que resistiram deixaram de ter alguns medicamentos ou exigem dinheiro mesmo a quem tem seguro ou segurança social, por medo de não serem reembolsadas. Medicamentos para o cancro de repente não existem (ou os médicos não os receitam, por serem demasiado caros). O cancro parece o exemplo mais chocante mas não é o único. "Tínhamos aqui uma mãe com um problema psiquiátrico que correu sete farmácias de hospitais - sete! - e não encontrou o medicamento de que precisava", conta Katerina. "E toda a gente sabe como é perigoso parar a medicação nestes casos."Além de tudo isto, como as contribuições para a saúde são feitas pelo empregador, quem fica desempregado pode usar os serviços mais um ano... "e depois não tem direito a nada", diz Electra. Mesmo quem tem segurança social deve pagar cinco euros de taxa e uma parte do tratamento no sistema público. Há relatos de mulheres que não têm dinheiro para pagar o parto - ficam sem certificado de nascimento do bebé. 

As crianças que não nascem

Os cortes no Instituto de Saúde Infantil também significam que, nos últimos quatro meses, o centro pagou apenas meio mês de salário. A assistente social tem, agora, de ser ajudada: Katerina tem dois filhos, um no liceu e outro na universidade, que sustenta sozinha. "Tenho outro emprego, de aconselhamento de pais, três vezes por semana. Esse paga-me a renda. O resto, a minha mãe ajuda-me. Vejam lá, com esta idade", dispara. Mas não diz a idade, nem perde o ar bem-disposto. Aliás, é desconcertante como conversam sobre tudo isto. Há indignação, claro, não há sinais de desespero ou depressão – não se percebe se será por optimismo ou orgulho. 
"O que havemos de fazer?", suspira Katerina, e encolhe os ombros. "Este não é um trabalho em que possamos dizer "vão embora e venham quando houver dinheiro"." Ainda falamos das eleições do próximo domingo, mas elas preferem não dizer as suas posições políticas num artigo sobre a sua vida profissional.
As crianças estão a ser muito afectadas pela crise. Não são só os desmaios, a falta de comida e de cuidados de saúde. É também a depressão e desespero dos pais, sublinha Giota Mavrika, responsável pelas visitas domiciliárias do centro de saúde, até aqui mais calada do que as faladoras Katerina e Electra. "Perguntámos a uma criança da 4.ª classe o que é que ela queria. Normalmente dizem "um campo de férias", "o meu prato preferido", ou "um jogo de vídeo". Esta disse: "Quero que a crise económica passe"." 
E há ainda as crianças que ficam por nascer, nota Electra. "As pessoas hesitam em ter filhos. Uma amiga minha de 38 anos abortou. Ela já mal consegue sobreviver com o que ganha... como ia sustentar uma criança?" 


Maria João Guimarães in Público 

O fim do turismo da canábis na Holanda

por A-24, em 29.04.12
Um tribunal holandês aprovou a decisão do governo que quer proibir a venda de canábis a turistas nas coffee shops desse país.
Apesar dos fortes protestos dos donos das coffee shops e de membros do setor turístico holandês, a decisão de proibir a venda de canábis a turistas foi aprovada hoje por um juiz do Tribunal de Haia. A restrição a turistas será imposta a partir de 1 de maio em cidades fronteiriças (Brabant, Limburg e Zeeland) mas em breve a medida deverá ser aplicada a nível nacional, incluindo a mundialmente famosa Amesterdão, a partir do próximo ano.
Esta medida irá tornar as coffee shops em clubes privados, ou seja, exclusiva a membros da casa e cada coffee shop terá um máximo de dois mil membros. Neste caso, os requisitos serão ter residência em terras holandesas. Nada de turistas. Aos locais será atribuído um weed pass, uma licença atribuída por cada coffee shop, que terão de mostrar para poder comprar canábis.
A decisão do tribunal, contrariando a política dos últimos 40 anos que tornou a Holanda o símbolo da liberdade no que diz respeito ao consumo de drogas leves, é justificada com o número de crimes associados ao consumo de droga, lê-se em nota do juiz favorecendo o argumento do advogado Eric Daalder que representou o Governo holandês neste caso.
As autoridades holandesas alegam também que esta é a forma mais eficaz de travar os turistas-da-droga, aqueles que viajam até às localidades junto à fronteira com a Bélgica e Alemanha comprando enormes quantidades de droga para vender depois nos países vizinhos. O objetivo será tornar as coofee shops em pequenos locais para servir os que pertencem à comunidade.
Do outro lado deste caso, e representado as pequenas coffee shops e o turismo de Amesterdão, esteve o advogado Maurice Veldman que admitiu pedir recurso da sentença reconhecendo que não o deverá conseguir até à primeira data instaurada para que a lei tenha efeito (próxima terça-feira, 1 de maio). "O juiz falha completamente no que diz respeito ao ponto principal: Podemos discriminar os turistas quando não há qualquer perigo público em jogo?" disse Veldman.
Recebendo milhões de turistas todos os anos, Amesterdão não tem os mesmos problemas relacionados com consumo de droga que as cidades junto à fronteira, sendo o consumo de marijuana nestas lojas visto pelos turistas como parte essencial da experiência que é visitar esta cidade libertina holandesa, a par de visitar o Red Light District, o museu Van Gogh ou os canais que percorrem a cidade. Isto foi mesmo reconhecido pelo presidente da cidade, Eberhard van der Laan, que, segundo a BBC , aponta que um terço dos turistas vai a Amesterdão para fumar canábis.
Caso a proibição aos turistas avance, os proprietários das coffee shops ameaçam levar o caso ao Tribunal dos Direitos Humanos por considerarem que não se deve discriminar ninguém com base no sítio onde moram.

Novo governo, novas políticas, novos turistas (mas não em idade)
A restrição e o controlo do consumo deste tipo de drogas é um passo já há muito pedido pelo Governo holandês atual, eleito há ano e meio, mas ainda não houve reação à decisão do Tribunal e ao suposto recurso que deverá ser interposto pela defesa. Em outubro passado o Governo conservador conseguiu alterar o estatuto da canábis mais forte para droga dura e em novembro a cidade de Maastricht (na fronteira com a Bélgica) impôs a proibição a turistas, com exceção daqueles que são oriundos dos países que mais turistas enviam: Bélgica e Alemanha.
Outras cidades apoiam a medida, como é o caso de Eindhoven e Dordrecht. Esta última quer mesmo assegurar a restrição a turistas mais cedo que o previsto dado o espectável aumento de estrangeiros até ao final do ano.
Apesar da incerteza em relação às consequências finais que esta medida trará, a certeza é que irá aumentar a venda clandestina nas ruas - e que na década de 1970 levou às políticas mais liberais neste país -, assim como um menor fluxo de turistas jovens para Amesterdão.
Visão

Facebook do sexo atinge os 130 milhões de utilizadores

por A-24, em 29.04.12
Descrito pelos seus criadores como "a maior rede social do mundo para conhecer pessoas novas", o Badoo ultrapassou recentemente a marca dos 130 milhões de utilizadores, ficando atrás apenas do Facebook, do Twitter e do Qzone (uma rede social chinesa).
Embora possa ser usado como uma rede social "normal" - o login até pode ser feito via conta do Facebook - pelo menos um terço dos utilizadores procura alguém para ter um encontro sexual.
Feito o login, o Badoo apresenta uma lista de pessoas do sexo oposto, com informação sobre a sua localização e idade.
Disponível em 30 línguas e 180 países, esta rede social não tem publicidade, sustentando-se com as verbas oriundas da venda de alguns serviços pagos.



Visão

O Partido Pirata é um vírus no sistema político da Alemanha

por A-24, em 29.04.12
Há um partido na Alemanha que desafia toda a lógica partidária instituída na Europa. Não está interessado em discutir a crise da dívida nem as intervenções militares no estrangeiro, mas pode tornar-se este ano numa das maiores forças políticas do país. O Partido Pirata alemão não foi o primeiro nem é o único a defender causas como a liberdade total na Internet e a transparência absoluta nas decisões políticas, mas os mais de 1300 militantes reunidos neste fim-de-semana em congresso em Neumünster, no norte do país, são um sinal do descontentamento de muitos cidadãos em relação aos partidos tradicionais.
O especialista em ciência política Alexander Hensel, do Instituto Goettingen para a Investigação sobre Democracia, considera que “muitas pessoas votam no Partido Pirata em sinal de protesto. Não é uma reacção contra a democracia, mas baseia-se no descontentamento com o funcionamento dos partidos estabelecidos”, cita a Associated Press.
O fenómeno do crescimento do Partido Pirata da Alemanha, que conta com 25.000 membros — nenhum deles político profissional — tem provocado várias reacções, nem todas favoráveis à ideia romântica de um mundo mais livre e transparente associada a este movimento, originado com a fundação do Partido Pirata da Suécia, em 2006.
O congresso deste fim-de-semana está a ser marcado por acusações de que o partido não tem conseguido lidar com a alegada infiltração da extrema-direita, o que pode ter algum impacto nas eleições de Maio nos estados da Renânia do Norte-Vestfália e Schleswig-Holstein, onde as sondagens apontam para uma votação na ordem dos 9%. Este resultado será suficiente para juntar mais dois assentos aos que o partido já detém em Berlim e Saarland.
A polémica sobre as tendências de extrema-direita de alguns dos seus militantes começou com a publicação no Facebook de queixas sobre a atribuição de subsídios a organizações judaicas, mas o momento mais marcante foi uma declaração de Martin Delius, um dos líderes do partido em Berlim: “O crescimento do Partido Pirata alemão é semelhante ao do Partido Nazi entre 1928 e 1933”, disse Delius numa entrevista à revista Der Spiegel. Outros destacados líderes do Partido Pirata, como Marina Weisband, consideram que a polémica só existe porque o partido mais à esquerda no Parlamento alemão, o Die Link, se vê ameaçado pelas mais recentes sondagens, tendo colocado cartazes nas imediações do congresso com a frase “Não dê o seu voto aos nazis”.
O especialista em ciência política Alexander Hensel considera que os problemas do Partido Pirata da Alemanha decorrem do seu próprio crescimento e antecipa o rumo que os militantes devem tomar : “O partido está a crescer de uma forma gigantesca. A integração de tantos novos membros deixa-o sob grande pressão em termos organizacionais. Precisam de criar estruturas adequadas e avançar para uma liderança mais profissional”.

Público 

El respeto a Guardiola

por A-24, em 29.04.12
Es conocida mi simpatía por los colores del Barça. Es un sentimiento que viene de lejos, pero que ha crecido en estos últimos años en la etapa de Guardiola, no tanto por los éxitos deportivos, los títulos o la brillantez de muchos de sus jugadores, como por el estilo de fútbol que han sido capaces de exhibir. Ese cuidado del toque de balón, esa idea de equipo trabado —incluso compacto—, el dominio del centro del campo, la precisión en los pases… han marcado toda una concepción del fútbol que ha merecido un reconocimiento prácticamente unánime.
Hemos disfrutado con el fútbol del equipo de Pep y nos ha enseñado que siempre cabe una nueva visión, un afán superior tanto en el fútbol como en el deporte y en la vida en general. Pero Guardiola no sólo nos ha demostrado a todos y a sí mismo que es un gran entrenador; también y sobre todo nos ha enseñado un saber estar ejemplar.
Este es su principal legado. Siempre respetuoso con el rival, siempre con reconocimiento a sus jugadores, contenido en los triunfos y sin invocar excusas en las derrotas. Su saber estar culmina con su marcha del Barça después de cuatro años brillantes y sabedor de que su continuidad era deseada por toda la familia barcelonista. Su decisión no me sorprende. Además de un gran deportista, Pep es una persona conocedora de los límites de las cosas y dotada de un profundo espíritu innovador, por ello desea abrir una nueva etapa en su vida que quizá aún no tenga definida. Pero va en su personalidad renunciar a que el tiempo marchite la creatividad y la energía de la ilusión. Respetemos su decisión de la misma manera que él nos ha respetado a todos.
Hace unos meses tuve la oportunidad de mantener una larga conversación con Guardiola en Moncloa. Fue un café privado y estimulante en el que quise mostrarle mi reconocimiento sin cámaras ni propaganda. Como es natural no pude resistirme a preguntarle sin descanso por el Barça, por los jugadores, por sus vivencias. Recuerdo bien los matices de sus comentarios: “Dani Alves es un portento físico, Messi es el jugador más competitivo que conozco, Xavi es la autoridad, Puyol es el líder, Iniesta es todo bonhomía, Busquets es majestuoso con el balón…”.
La conversación fue una permanente disputa por el centro del campo, él me preguntaba por Merkel, Sarkozy, Rajoy o por cómo llevaba la dificilísima situación económica del país, y yo volvía a preguntarle por Keita, por Abidal…, y él inquiría por la Unión Europea y por China. Fue un toma y daca agradable y enriquecedor. En aquellas dos horas largas de diálogo me di cuenta de que Guardiola era una persona llena de inquietudes y sensibilidad. La sensibilidad que le permite concebir los límites de la vida y de nuestros propósitos, la estricta dimensión de cada uno de nosotros.
Pep merece todo mi respeto y sólo quiero decirle, con la contención de la que él ha hecho gala, gracias.
Jose Luis Rodriguez Zapatero
in marca.com

Califórnia como reflexo do futuro

por A-24, em 27.04.12
Um dos principais temas da campanha americana será precisamente o papel que o estado deve desempenhar na sociedade e na economia. Vai ser aí que Obama e Romney vão centrar os seus discursos, sabendo à priori que o estado federal está prestes a falir, em virtude dos défices exagerados e da dívida  acumulada nos últimos anos. Com o crescimento previsível nas despesas sociais, como na Segurança Social e nos programas de saúde Medicare e Medicaid, os Estados Unidos no final da década estarão numa situação idêntica à dos países do Sul da Europa, onde infelizmente incluímos Portugal. Mas não é preciso perspectivar muito do que poderá acontecer se os Estados Unidos prosseguirem o caminho preconizado pela Administração Obama, que aumentou mais em três anos a dívida pública do que o também despesista George W. Bush em oito anos. Consideremos a Califórnia. 
A Califórnia, que apesar do vigor de Sillicon Valey e de empresas como a Google, Facebook ou Apple, encontra-se numa situação de pré-falência e decadência acelerada. As políticas progressistas, que engordaram o estado, distribuíram milhões de dólares pela dita "economia verde" e colocaram barreiras inconcebíveis às empresas,  empurraram o estado para o declínio. Pela primeira vez desde que está na União, a Califórnia tem vindo a perder população para estados com economias mais vibrantes, como o Texas, o Arizona ou o Utah, e na última década a criação de emprego estagnou e a pobreza aumentou. Segundo este artigo de Joel Kotkin, são cada vez mais os californianos que vivem sem pagar impostos e que estão dependentes dos programas sociais e do Medicaid (programa federal de apoio na saúde aos mais desfavorecidos). A taxa de desemprego é a terceira mais elevada do país. O estado que cresceu, demograficamente e economicamente, mais nos últimos 100 anos está em total declínio. E como isso foi possível? Seguindo uma receita falhada e que Obama persiste em estender a toda a América. Se os americanos quiserem saber como será o futuro este presidente? Que olhem para a Califórnia. 

Nuno Gouveia in 31 da Armada

A Europa impotente perante o regresso do fascismo argentino

por A-24, em 27.04.12
“princípio da História” de Luciano Amaral (Diário Económico)

Nos anos 90 e princípio do século XXI, a Europa transbordava de optimismo. A vitória sobre o comunismo, o euro, a riqueza, a “sensibilidade social” eram outros tantos sinais de uma superioridade que tinha por inequívoca. A Europa desse tempo era o fim da História. Nem sequer a América tinha lições para dar(…). Toda a gente devia ser como a Europa.(…)
Ouvir a retórica anti-colonial de Kirchner remete-nos para um tempo de que os europeus já não se lembravam. Pouco importa que Kirchner (de origem alemã e espanhola) e a própria Argentina sejam dos melhores exemplos do colonialismo europeu (que massacrou os verdadeiros argentinos originais, os índios de que lá há poucos vestígios actualmente). Importa que o nacionalismo da América do Sul não é apenas anti-americano, é também anti-europeu. E importa mais ainda que a Europa não sabe lidar com isto: porquê atacar quem só quer a paz, quem só quer um mundo de harmonia entre os povos?
Claro que estamos aqui de regresso a uma velha história argentina, a do peronismo, essa espécie de fascismo social e sindical que se afirmou contra os banqueiros, os fazendeiros e os ingleses (nem que fosse apoiando a Alemanha nazi). Cristina Kirchner não perde uma oportunidade para aparecer enquadrada com imagens de Evita Perón. Mas a Europa olha estupefacta. Noutros tempos talvez a Espanha enviasse uma expedição punitiva. Hoje, não consegue garantir um mínimo de protecção dos direitos de propriedade dos seus investidores ou uma condenação efectiva da Europa, essa entidade que pura e simplesmente não sabe o que fazer consigo própria.
Era o fim da História, não era? Afinal parece que está tudo apenas a começar.

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