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A-24

México - Manual de sobrevivência numa cidade em pé de guerra

por A-24, em 27.02.10
Maria (nome fictício) tem 48 anos, é portuguesa e mãe de três filhas, duas das quais vivem consigo. Saiu de Portugal há dez anos. Para viver em Ciudad Juarez, no México. A cidade mais perigosa do mundo, que foi fundada faz hoje 350 anos.
[Em 2008, a organização não-governamental mexicana Conselho de Cidadãos para a Segurança Pública fez as contas e chegou à triste conclusão de que a cidade mais perigosa do mundo, excluindo as zonas de guerra, ficava dentro das fronteiras do seu país. Mas, com uma taxa de 130 homicídios por 100.000 habitantes, quem disse que Ciudad Juarez não está em guerra?
Este ano, os números pioraram. Até 21 de Agosto passado, segundo contas divulgadas pelo jornal El Diário, tinham sido registados 1362 homicídios dolosos (voluntários e premeditados) em Ciudad Juarez - qualquer coisa como 159 por 100.000 habitantes, numa cidade com quase 1,5 milhões de pessoas. Há muito que a vida nesta fronteira (a texana El Paso fica mesmo ali ao lado) está amordaçada pela violência.
Centenas de mulheres têm sido mortas desde os anos 90 sem que as autoridades consigam explicar grande parte dos crimes. Mas a explosão deu-se nos últimos anos, quando os cartéis da droga entraram em guerra aberta pelo controlo do tráfico na região. Os habitantes habituaram-se a ouvir, diariamente, relatos de atrocidades e infâmias, raptos e assaltos, decapitações e execuções em massa. E a ver os mortos exibidos na via pública, com comentários jactanciosos escritos pelos assassinos...
Milhares de militares juntaram-se às forças policiais para tentar controlar a espiral de violência, alimentada pelos milhões do tráfico de droga e pelas armas que chegam em catadupa do outro lado da fronteira. O Governo mexicano considerou que o envio de uma força de paz das Nações Unidas para Ciudad Juarez é um cenário sem sentido e vários responsáveis locais já chegaram a dizer que a situação estava a melhorar. Não é isso o que dizem os números. Nem o que as pessoas sentem, como se depreende do testemunho de Maria, portuguesa.]Vim viver para o México há dez anos. Vivia em Setúbal e trabalhava numa fábrica de coberturas para bancos de automóveis entre Palmela e a Quinta do Anjo, perto da Autoeuropa. A empresa tinha capital mexicano e foi numa visita de alguns dos responsáveis vindos do México que conheci o que viria a ser o meu actual marido. Eu estava em processo de divórcio. Ao fim de uns 14/15 meses, ele regressou ao seu país e eu decidi ir com ele.
Hoje, ele trabalha na mesma empresa, mas num cargo superior, em contacto directo com a administração. Viemos viver para Ciudad Juarez, onde há muita pobreza, muita violência - contra mulheres, crianças -, muita fome. Isto está mesmo muito feio, muito difícil. Parece uma autêntica guerra.
O México tem 35 estados e este, o de Chihuahua, é o maior. Vem muita gente de outros locais, porque é uma cidade industrial, com grandes parques de empresas, aqui só não trabalha quem não quer... Nos anos 2000 começou a haver mais violência, roubos, violações. Quando cheguei, trazia comigo a minha filha, então com 11 anos, e ela começou logo na escola particular. Foi difícil, porque teve de se adaptar, teve de fazer um esforço, uma vez que era estrangeira. Mas, por outro lado, aqui o nível académico é mais baixo, a qualidade do ensino não se compara à portuguesa. Por isso, ela estava bem preparada.
Foi sempre muito boa aluna. Esteve cá até aos 15 anos, fez o secundário, sempre com 18, 19, 20 valores, seguiu para outra escola. Sabe falar quatro ou cinco línguas. Mas nessa alturafoi quando começaram as violações e os sequestros e eu tinha muito medo... O pai estava em Setúbal, queria que ela voltasse. E eu disse que sim, se fosse essa a vontade dela. Está agora com 22 anos, casou com um rapaz brasileiro e teve um bebé há pouco tempo. Vive em Setúbal, na mesma rua onde eu morava. Ainda não tem emprego, o sonho dela é entrar para a polícia.
Eu adaptei-me a Ciudad Juarez em dois ou três anos. Foi difícil: as ruas, as casas, os centros comerciais... tudo é diferente. Também adoeci nesse período e o apoio do meu marido foi fundamental. Começámos por viver em casa da mãe do meu marido, mas eu não estava adaptada. E tinha medo.
Medo, muito medo
Agora vivo num bairro (aqui chamam-lhe colonia) novo e o quarteirão (quadra) onde habito é muito tranquilo. Mas duas ou três quadras para cima ou para baixo na avenida onde fica a minha casa já há muita violência. Parece mentira, mas umas 12, 15, 20 pessoas são executadas todos os dias. Tudo por causa do mercado da droga. Os traficantes de rua são vítimas da luta entre os grandes barões para controlar o mercado.
É uma verdadeira guerra: há decapitações, cortam mãos, penduram os mortos das pontes, deixam cartazes com ameaças. Agora andam a incendiar stands de automóveis, bares e outro comércio - as milícias exigem uma quota, um pagamento mensal, e quem não paga arde. Quando vou ao centro comercial, procuro sempre ter o meu marido comigo. Há muitos casos de carjacking nos parques de estacionamento.
Tenho duas filhas que já nasceram aqui. Tanto eu como as meninas já fomos ameaçadas várias vezes - já tive de trocar de número de telefone três vezes, porque vêem o meu nome na lista e percebem que é estrangeiro... Pensam logo: "É estrangeira, tem dinheiro."
As meninas também já foram ameaçadas na escola. É claro que lá têm ordens para não as deixarem sair com ninguém a não ser comigo. As pessoas aqui são muito morenas e as minhas filhas são branquinhas, louras...
Logo na clínica, quando nasceram, ficámos cheios de medo que as roubassem. Se vamos ao passeio para elas andarem de bicicleta, nunca lhes tiramos os olhos de cima; se as convidam para festas, só vão se eu ou o pai pudermos acompanhá-las. Tenho medo, tenho muito medo.
A nossa casa tem um pequeno quintal atrás e à frente. Uma vez o meu marido estacionou o carro junto à porta da sala, no quintal, mas mesmo assim roubaram-no sem nós darmos por nada. Na manhã seguinte, quando se levantou por volta das 4h30 (aqui começa-se muito cedo, o horário de trabalho é das 6h00 às 15h30), o carro já não estava lá. É terrível.
Todos os dias há notícias horríveis. Há dias [25 de Novembro], um comando armado assassinou quatro pessoas numa avenida principal. Dantes procuravam o alvo quando estava sozinho, agora já matam também a família.
A fronteira com os EUA, a cidade de El Paso, no Texas, é mesmo aqui. E daí todo este tráfico de droga, imigrantes ilegais, armas. Vêm muitas armas dos Estados Unidos para o México. Há muitos mexicanos (e de outros países) a tentarem passar a fronteira. Os que conseguem são os que têm familiares do lado de lá. Há muito controlo, os americanos são muito racistas. Mas as pessoas boas daqui são muito trabalhadoras.
Voltar a Portugal
Existem aqui três corpos de polícia. Mas há muita corrupção. E agora a cidade está sitiada por militares. Aqui na nossa rua passam muitas patrulhas - eu ensinei as minhas filhas a não terem medo das autoridades, eles estão ali para nos ajudarem. A mim todos me ajudam, as pessoas gostam de mim, tratam-me bem e são receptivas, as autoridades, nos hospitais, etc... Eu digo que isso é por ser estrangeira, eles são racistas com os próprios mexicanos.
Há também patrulhas pelo ar. Helicópteros que passam à noite, com radar, habituamo-nos a eles. Eu vou pouco a El Paso, às vezes para comprar bacalhau (só lá é que se encontra...), saio pouco. Felizmente posso trabalhar em casa, mas agora nem vamos jantar fora, temos medo. Quando estamos dentro do carro, parados nos semáforos, estamos sempre alerta. É nesses locais que se juntam os traficantes e, se houver tiroteio, os inocentes também morrem...
Eu tenho uma casa boa, mas trabalho muito para a ter, o meu marido trabalha muito, faz horas extra. Só que por aqui há muitas casas onde vivem uma dúzia de pessoas ou mais. Há muitas meninas que engravidam aos dez, 12 anos; há bairros horríveis. E também há bairros ricos, com belas moradias, mas aí é onde se registam mais sequestros... As pessoas vivem fechadas atrás de muros, portões, alarmes.
A cidade está a crescer muito depressa. Tem museus, cinemas, escolas. Mas não é nada como no nosso país, os materiais das casas não têm nada a ver. Muitos recebem dinheiro de um fundo para construírem as casas, mas depois começam a não conseguir pagar as prestações e ficam na rua. E há aqui muita gente que não luta, baixa os braços e vai pelo mais fácil... Eu estou sempre disposta a lutar, sei que, se sair daqui um dia, terei de começar tudo de novo. Outra vez.
A última vez que fui a Portugal foi há quatro anos, para o funeral da minha mãe. O meu pai continua a viver no Poceirão, que é a terra onde nasci, e tenho muita vontade de voltar, desta vez com as meninas. É muito caro, mais de 4500 euros, irmos as três a Portugal, mas quero ver se vou no próximo ano. O meu pai diz tantas vezes que ainda morre sem conhecer as netas...
Por Luís Francisco (Público) A partir de uma conversa telefónica com Maria (nome fictício que o P2 optou por utilizar)

(Reino Unido) British passports to be given to a record 220,000 migrants this year

por A-24, em 22.02.10
British citizenship has rocketed almost 500 per cent under Labour

The number of British passports given to migrants is set to hit a record 220,000 this year.
In the first three months of 2009, 54,615 citizenship applications were approved - up 57 per cent on the same period in 2008.At that rate, the number receiving passports - and with them the right to full benefits - this year will smash the record of 164,540 set in 2007.Last year the total was 129,310, and when Labour came to power in 1997, just 37,010 people were given citizenship.It means approvals have rocketed by almost 500 per cent under the current Government.Officials blame the massive increase on the fact that ministers are introducing a 'tough' new system of earned citizenship next year.They say migrants are rushing to obtain their passports before they have to undergo an extra probationary period.Under the new system, obtaining a passport will take six to eight years from a migrant's arrival in most cases, rather than the current five.Critics said the rush shows just how lax the current system is.They also point out that, by handing out so many passports, the Government is changing the make-up of Britain without any public debate.Shadow home secretary Chris Grayling said: 'This is yet another example of the Government's incompetence in managing our immigration system.'They openly admit they are introducing a new system and that everyone is rushing to get in before it. It just smacks of ministers having no idea what they are doing.'Immigration minister Phil Woolas (left) said the new passports system for migrants will save taxpayers £2billion, but his shadow counterpart, Chris Grayling, branded Labour incompetent at managing the flow of migrantsGrants of settlement, the stage before citizenship, were also up in the first three months of 2009, running at an annual rate of 190,000.Sir Andrew Green, chairman of Migrationwatch UK, said: 'At this rate, grants of settlement will have trebled under Labour.'We are on course for a massive increase in the population which nobody wants and on which nobody has been consulted.'
At this rate, grants of settlement will have trebled under Labour'. 'No wonder people are so angry with the political class. It is not just fingers in the till, it is fingers in their ears when the public have a serious concern.'The top five native countries of those gaining citizenship in the past two years have been India, Pakistan, Iraq, Somalia and Zimbabwe.India and Pakistan are historic sources of migration, particularly via marriage to a British citizen. The large numbers of Iraqis, Somalis and Zimbabweans reflects the fact that asylum seekers who arrived at the start of this decade have now been in the UK long enough to receive citizenship.The introduction of the earned citizenship scheme was recently delayed by nine months, to Decemember 2010.Immigration minister Phil Woolas claimed yesterday that it would save taxpayers up to £2billion in benefit claims.He said the new rules will deter some migrants from travelling to the UK or staying long enough to obtain citizenship and benefits.Until a passport application has been approved, migrants do not have access to child benefit, council and housing tax benefits and income support.Mr Woolas insisted: 'The pull factor of coming to the UK is to be taken away.'The Home Office said last night: 'The increase in settlement grants reflects the success of UK Border Agency staff in clearing outstanding applications. It also reflects the Home Office's decision to tighten up the criteria for settlement.

População da Rússia continuará a diminuir (+ comentário assertivo)

por A-24, em 18.02.10
A população russa diminuirá durante as próximas décadas e o ligeiro aumento fixado no período de Janeiro a Setembro de 2009 não parece ser uma tendência durável, declarou hoje Alexandre Surinov, vice-director do Serviço Federal de Estatíticas da Rússia (Rosstat).
“Se não se operar nenhuma mudança radical no estado de espírito dos nossos compatriotas, a população do nosso país diminuirá nas próximas décadas”, disse ele numa conferência de imprensa em Moscovo.
Segundo Surinov, é necessário que cada família tenha, em média, 3-4 filhos e que os russos prestem maior atenção à sua saúde.
Pela primeira vez em muitos anos, registou-se um crescimento da população no país entre Janeiro e Setembro do ano corrente, tendo a população aumentado em 5.300.000 pessoas (0,004 por cento) e chegado às 141,9 milhões de pessoas.
Porém, considerou Surinov, é prematuro considerar estes dados como pertinentes, porque este período é insuficiente para se falar numa tendência.
O vice-director do Rosstat considera que só os esforços desenvolvidos pelo Estado com vista a melhorar o nível de vida e a qualidade da saúde pública poderão travar a tendência de diminuição da população russa.
“A esperança de vida dos russos é inferior ao fixado em numerosos países da África do Norte”, concluiu.


Italo Tavares disse...

“A esperança de vida dos russos é inferior ao fixado em numerosos países da África do Norte”
Cadê o anônimo russo pra cantar as maravilhas da sibéria?
Um país que abraça oficialmente a política abortista mais violenta do mundo não pode reclamar do que está ocorrendo.

Mil islamofobias

por A-24, em 17.02.10
Só quatro mesquitas na Suíça ostentam minaretes. A desproporção entre a banalidade dessa realidade e a constitucionalização de uma proibição de construção de minaretes no país dá bem a medida do pânico moral em torno duma fantasmagorização da presença muçulmana.
Nisto, a Suíça em nada se diferencia das manifestações paralelas de identitarismos exclusivistas que pela Europa e mundo fora se vêm repercurtindo na marginalização, exclusão e excepcionalização dos "seus" muçulmanos - residentes ou cidadãos de pleno direito.
Em cada um destes contextos a denúncia da suposta alteridade e inassimilidade cultural dos muçulmanos encontra a sua expressão própria, histórica, cultural, linguística e mitologicamente sedimentada, mas nevrálgica, porque nela se cruzam velhas questões: as tidas por acabadas, em que o islão e os muçulmanos aparecem por metáfora como regresso atávico do passado ultrapassado; e as inacabadas, que ressurgem na colonialidade, orientalização e racialização do islão e dos muçulmanos de carne e osso, agora a portas dentro.
Por trás do voto dos suíços está a campanha xenófoba do partido populista de extrema-direita, assim como em cada país e contexto da Europa estão os outros tantos partidos populistas de extrema-direita que vão assustadoramente ganhando terreno.
Mas a proporção de 57 por cento passa muito além dos partidários e mesmo simpatizantes do Partido Popular Suíço.
A responsabilidade na Suíça - como na Bélgica do Vlaams Blok, na Inglaterra da Liga de Defesa Inglesa e do Partido Nacional Britânico, da França da Frente Nacional, etc., etc., etc. - passa pela politização e respeitabilização do racismo cultural em torno dos "problemas" da imigração, do multiculturalismo e da diferença.
Os contextos políticos domésticos, por seu turno, articulam-se através da politização da insegurança e do "terror", financiada e factualizada pela indústria dos estudos do terrorismo, e governamentalmente espelhada no "arquipélago de gulags" e na banalização da tortura aceite como preço a pagar pela defesa do "nosso" modo de vida e da "nossa" segurança.
A proposição que os suíços foram chamados a votar é islamófoba. O resultado do voto é islamófobo. Nisto, em nada é excepcional a Europa de hoje. O que verdadeiramente interessa, porém, é entender criticamente o que esse voto representa: o que nele se traduz das articulações e cumplicidades entre as ideologias e retórica dos partidos e movimentos de extrema-direita populista e os partidos parlamentares; entre os actos de violência dos fascistas de rua e as "corajosas" opiniões prêt-à-porter dos comentaristas de imprensa e da blogosfera do espaço público liberal; entre as especificidades do enclausuramento identitário nacionalista em cada país e o todo (que é mais que a soma das partes) dos exclusivismos de uma identidade "europeia" e de um "Ocidente" que esquece e apaga o enredado global da sua história.
É islamofobia. Importa o nome; mas o que mais interessa é pensar e debater as continuidades ou a novidade da islamofobia e do racismo contemporâneo. É um pensaragir. Identificar e nomear um fenómeno como islamofobia faz parte de um processo de contestação pelo reconhecimento, pelo direito de cidade dos muçulmanos. Mas não é tarefa que cabe ou cumpre apenas aos muçulmanos, e sim a todos os cidadãos comprometidos em criar e conviver numa sociedade e num mundo mais justos. Professor no King"s College de Londres.
Público

O que ainda podemos aprender com as vitórias e derrotas dos romanos

por A-24, em 15.02.10
Adrian Goldsworthy é um apaixonado pela história clássica. Conversámos com o historiador a propósito dos dois livros que editou em Portugal e de como nos faz falta conhecer melhor a experiência da República e do Império romanos. Por José Manuel Fernandes
Júlio César? Vimo-lo, pelo menos, nos livros do Astérix. Porventura só aí. Não: com sorte talvez também saibamos citar uma das suas últimas frases, quando identifica entre os seus assassinos o filho adoptivo, Brutus: "Também tu, Brutus, meu filho?" Ou então que foi amante de Cleópatra, a belíssima rainha do Egipto.
Contudo poucas figuras como César influenciaram mais a história e a cultura ocidentais - e a poucas poderemos recorrer com facilidade à procura de paralelos que ajudem a resolver os nossos dilemas. Isso entristece enormemente Adrian Goldsworthy, o historiador militar que, depois de escrever Os Generais Romanos, lhe dedicou uma biografia monumental, César, a Vida de Um Colosso.
"Eu tive a sorte de aprender latim ainda no liceu, e ensinaram-me a dar importância à herança clássica", disse-nos o historiador. Porém, sabe que não é isso que acontece mesmo onde devia acontecer. Há umas décadas, nas academias militares ainda se liam os Comentários sobre a Guerra na Gália, o magnífico relato que o próprio Júlio César escreveu sobre os dez anos de campanhas de conquista, pacificação e ocupação, mas hoje a obra desapareceu dos currículos. O que é pena: "Era importante regressarmos à história clássica porque ela impregna toda a nossa cultura e instituições. As nossas grandes referências culturais, mesmo as mais recentes, ainda são figuras que conheciam a cultura clássica muito bem, mas isso está a acontecer cada vez menos. Em contrapartida, há muito para aprender, até porque há muitos paralelos com a vida política moderna", considera Goldsworthy.
Um deles, e que fascina o historiador, é perceber o tipo de qualidades que distinguem um líder, onde estão o talento que permite triunfar e as falhas que conduzem ao fracasso. Ora, como historiador militar, Goldsworthy nota que ao estudar a história das guerras e das grandes batalhas "é mais simples compreender porque é que um líder triunfa ou fracassa". Pelo menos é "mais fácil compreender as razões do sucesso e do insucesso do que quando estudamos o destino dos políticos".
Ora, na Roma antiga, a condição de figura pública implicava que se fosse ao mesmo tempo político e militar. Alguns, como o grande orador Cícero, poucas vezes se viram à frente das legiões, outros, como Pompeu, o Grande, passaram muito mais tempo em campanha do que no Senado romano, mas não era possível distinguir: "Os romanos não separavam a vida política da vida militar", precisa o historiador. O que nos permite tentar perceber mais facilmente "o que faz a diferença" dos que têm um talento natural para liderar.
Na verdade "há talentos que não são transmissíveis: mesmo os melhores comandantes, os que tiveram a melhor preparação, não podem julgar que têm talento só porque sabem estudar e copiar os grandes generais", considera Goldsworthy. Sendo que no tempo dos romanos não havia academias militares, pelo que nem a possibilidade de estudar existia. Os chefes militares aprendiam com a experiência.
Políticos e militares


César é, neste domínio, um caso exemplar. Ao contrário do que muitos poderão hoje imaginar, a figura mais determinante da história de Roma praticamente não pôs os pés num campo de batalha antes dos 40 anos. Originário de uma família da média aristocracia, sabia-se destinado a, um dia, integrar a elite de Roma, a pelo menos chegar ao Senado. Ambicioso, faz uma carreira como causídico, onde desenvolve os seus dotes de orador ao ponto de poder enfrentar, e bater, Cícero, e como político, não sem ter chegado a ser sacerdote de um dos muitos cultos da Roma antiga.
"A carreira de César rompe com todos os padrões", nota Adrian Goldsworthy. "Até à sua partida para a Gália, já com mais de 40 anos, tinha tido um percurso de certa forma normal. Militarmente, se o compararmos com Pompeu, o Grande, este é mais precoce e chega mesmo a chefe militar ainda antes de ser eleito para o Senado." Contudo, na guerra civil decisiva que permite a César tornar-se na figura dominante de Roma, depois da lendária travessia do Rubicão, as forças de Pompeu não resistiriam às de César.
Mas como é que conseguiu ser um comandante tão brilhante sem ter tido experiência anterior, pois antes só lidara com forças muito mais pequenas? Goldsworthy tem uma explicação: "O que é espantoso em Júlio César é a sua capacidade para lidar naturalmente com missões que a maior parte de nós teria antes de aprender a fazer e que ele intuitivamente desempenhava logo bem. Aprendia muito depressa com os erros, como sucedeu quando tentou um ataque de surpresa contra os helvéticos na campanha da Gália, e raramente cometia o mesmo erro duas vezes. Porventura o decisivo foi sempre a sua capacidade de, ao mesmo tempo que tomava decisões difíceis, ser capaz de criar uma enorme empatia com os seus homens: eles não tinham dúvidas de que César ficaria sempre a seu lado fosse o que fosse que acontecesse."
Personagem magnética, extremamente cuidadoso com a forma como se vestia e apresentava, era capaz de arrebatar com a mesma facilidade uma multidão em Roma e um corpo do exército, capaz também de fazer cair a seus pés as mulheres que lhe passavam por perto - e sem escrúpulos que o impedissem de trocar, com o intervalo de algumas semanas, o leito de Cleópatra pelo da rainha da Mauretania (área que corresponde ao Norte de Marrocos), se bem que preferisse seduzir as mulheres dos seus adversários políticos... - César era ainda, nas palavras deste seu biógrafo, "um maravilhoso oportunista". Como tribuno dirigia-se sempre ao povo de Roma tocando em pontos sensíveis que preocupavam as pessoas, por vezes num registo quase populista, mas mantendo-se fiel a causas que eram problemas reais, como a necessidade de uma distribuição das terras mais justa ou um melhor governo das províncias.
"Tinha a habilidade de criar a sensação de que estava sempre do lado do povo e dos seus homens, e fazia-o de forma consistente", sublinha Goldsworthy. "E o povo de Roma não via mais nenhum contemporâneo fazer o mesmo."
Mais: César sabia sempre onde estar no campo de batalha e, sobretudo, sabia transmitir confiança. O que, em última análise, é aquilo que faz um líder. Ou, como sintetiza este historiador, "há pessoas que fazem com que as coisas aconteçam". Como? Conseguindo fazer "com que os processos ocorram de forma natural, oleada e rápida, quase como se não estivessem lá: é aí que se consegue distinguir quem tem ou não capacidade de liderança, quem tem de impor as suas ordens ou orientações e quem é naturalmente seguido".
O talento de Sertório


Mas se César se destaca como a figura central, determinante, do final da República Romana, quando o sistema entra em colapso, se César, mesmo sem ter chegado a ser imperador - o primeiro imperador foi o seu filho adoptivo, Augusto - consegue que todos os imperadores passassem a chamar-se César, se deixou a sua marca em tudo o que depois seria o Império Romano, o seu exemplo está muito longe de ser o único exemplo de uma liderança forte. Ao estudar os grandes generais romanos, Adrian Goldsworthy encontrou personalidades muito distintas com histórias de sucessos e insucessos também muito variadas, pelo que vale a pena olhar para um outro exemplo de liderança: o de Sertório.
O general que comandou a revolta da província de Hispânia era "um grande comandante que conseguiu ganhar a maior parte das batalhas que travou", mas acabou por perder politicamente porque escolheu o lado errado numa das constantes guerras civis que sacudiam o Império. Isto apesar de ter conseguido trazer para o seu lado as tribos locais (incluindo os lusitanos) e organizar tropas que o viam como um "novo Aníbal", equiparando as suas proezas às do cartaginês que chegou a pôr em causa a hegemonia e o poder de Roma. Sertório morreria assassinado mas, antes, derrotou exércitos muito maiores, até os comandados por Pompeu, o Grande. Conseguiu resistir na Hispânia porque, além de militar, teve sempre a perspicácia política para ganhar as tribos para o seu lado. E teve-as, porque viam nele um homem justo.
"A diplomacia e a política marcham sempre a par com a força militar", conclui Goldsworthy. "Há que pensar no dia seguinte às batalhas." E, isso, tanto Sertório como Júlio César "sabiam fazer muito bem".
O historiador explica como este actuava: "Uma das coisas que César sempre percebeu foi que a vitória militar não era suficiente. Durante a campanha da Gália reunia todos os anos com os líderes tribais. O seu objectivo não variava: através das vitórias militares sempre quis criar uma situação em que os líderes locais se sentissem mais satisfeitos por estar dentro do mundo romano do que lutando contra ele."
Os romanos tinham perfeita consciência de que isso nunca aconteceria de geração espontânea, pelo que os territórios que ocupavam eram governados como províncias e os que lá viviam podiam aspirar a ser, também eles, romanos. De resto, Goldsworthy nota que o fim do Império romano não ocorreu - como sucedeu com os impérios europeus - porque tivesse havido movimentos de independência: "Ninguém queria ser outra vez lusitano ou gaulês, queriam ser romanos. Era melhor, viviam melhor, tão melhor que quando o Império se desmoronou devido aos ataques exteriores, o nível de vida baixou dramaticamente."
Guerras assimétricas


Falar destes temas está, contudo, muito longe do espírito dos tempos de hoje - "talvez seja por não estar na moda falar de impérios que haja alguma relutância em conhecer a história dos romanos" -, apesar de líderes políticos e militares como Júlio César ou os grandes da República e, depois, do Império nos poderem ensinar muito sobre um dos maiores dilemas dos conflitos contemporâneos: o de como ganhar uma "guerra assimétrica". É que muitas das guerras que os romanos travaram eram isso mesmo: "assimétricas", uma vez que o poder das suas legiões era muito superior ao das hordas que enfrentavam.
Ora, de acordo com Goldsworthy, em pelo menos dois domínios os romanos revelaram-se especialmente competentes - e ambos são mais políticos do que militares.
O primeiro foi terem a noção de que era necessário que o adversário acabasse por perceber que Roma iria sempre sair vencedora, mais tarde ou mais cedo, porque era imensamente mais poderosa. Para que essa percepção fosse clara não se permitia qualquer recuo, mesmo que pequeno, mesmo que justificado militarmente, pois este podia ser sempre visto pelo inimigo como uma vitória e dar-lhe mais força. O que é que isto nos ensina? Que "temos de perceber o que o adversário pensa, o que deseja, porque o mais provável é que pense de forma muito diferente da nossa. Se insistirmos em vê-lo como parecido connosco, a grande probabilidade é que falhemos os nossos objectivos. Depois, nunca podemos dar um sinal de fraqueza. Os romanos nunca davam, eram extraordinariamente persistentes, iam até ao fim, levavam o outro lado a desistir".
O que nos leva ao segundo domínio: como convencer as opiniões públicas de que as guerras que travamos são necessárias? "Os romanos eram muito bons a convencerem a opinião pública de que as guerras eram justas, pois tinham a preocupação de tornar claro o que era a guerra, o que ela implicava, o que ela custava", explica Goldsworthy. Que desabafa: "É pena que os nossos políticos saibam tão pouco de história e não compreendam sequer isto."
Não surpreende por isso que, ainda de acordo com este historiador militar, "hoje ninguém esteja disposto a lutar até ao fim. Na Europa, sem dúvida. Mas também começa a sentir-se isso nos Estados Unidos. E nas batalhas que hoje se travam, no Iraque ou no Afeganistão, se o adversário percebe que não se quer permanecer muito mais tempo, então o seu raciocínio é simples: basta-lhe esperar. É por isso que os Estados Unidos deviam provar que são capazes de lutar o tempo que for necessário, mas isso não está a acontecer".
Mas com isto não estaremos apenas a tentar copiar tempos irrepetíveis? Não, até porque muito mudou, e para melhor: basta lembrar que em Roma se apreciavam espectáculos que terminavam com a morte de seres humanos. Mas ao mesmo tempo sim, pois o ADN da nossa espécie não se alterou e o mesmo César que ia ao Coliseu escrevia cartas onde "encontramos a mesma humanidade que ilumina tantos escritos contemporâneos".
Escritos e experiências que, diz Adrian Goldsworthy, muitos começam a sentir que devem voltar a ser estudados. Ou que, de certa forma, já recomeçaram a suscitar curiosidade, pelo que o historiador tem sido frequentemente convidado para falar a líderes políticos e militares. Talvez tarde de mais.

Tenis - Com o adeus de Safin chega ao fim a geração dos "bad boys"

por A-24, em 13.02.10
Génio desperdiçado ou talento sobrevalorizado? Uma pergunta que fica sem resposta na despedida de um jogador carismático do ténis.
Paris foi ontem testemunho da despedida oficial de Marat Safin, aos 29 anos, mas o ponto final na sua promissora carreira no ténis data do jogo das meias-finais do Open da Austrália de 2005, em que deslumbrou toda a gente ao interromper a série de 26 vitórias consecutivas de Roger Federer na rota para o seu segundo Grand Slam e o último título individual.
Não, não estamos a exagerar. Depois disso o russo perdeu a motivação, mentalizou-se que não tinha mais nada a provar, arrastou-se nos courts, lembrando apenas pontualmente por que era a cara mais emblemática e promissora da campanha New Balls, Please. Tão pontualmente que o seu último grande momento foi mesmo a presença nas meias-finais de Wimbledon 2008, presença essa que o tornou no quinto jogador em actividade, a par de Roger Federer, David Nalbandian, Novak Djokovic e Rafael Nadal, a atingir as "meias" nos quatro Slams.
Noctívago convicto e confesso, polémico q.b. dentro (mais do que uma vez festejou pontos baixando os calções) e fora do court (são conhecidas a sua fama de playboy e a atribulada vida sentimental), crítico dos colegas (desde Andy Roddick a Gustavo Kuerten, passando por Thomas Berdych) e das organizações que regulam o ténis (o excesso de torneios do calendário merece-lhe críticas desde 2004), impulsivo e inconstante no court, oscilando entre a genialidade e a mediocridade, um pesadelo para os árbitros, Marat encerra a geração de bad boys do ténis, germinada por Ilie Nastase, John McEnroe e Jimmy Connors e herdada por Andre Agassi e Goran Ivanisevic.
Por isso, não estávamos à espera de um final assim. Na sua tournée de despedida pelos torneios mais importantes da sua carreira, o "Leonardo DiCaprio do ténis" (nome dado pela revista norte-americana Tennis Match) não partiu raquetes (foram cerca de 700 as destruídas nos 12 anos como profissional), não olhou para o céu em busca de respostas (a sua imagem de marca) enquanto vociferava em russo, não perdeu a cabeça. Não mostrou qualquer emoção, simplesmente porque deixou de se importar com as derrotas e, sobretudo, porque o ténis para ele perdeu todo o encanto: "Estou cansado do circuito, cansado de ficar em hotéis, cansado de viajar... para mim, chega!"
Jogou esta época, não por honra, mas por dinheiro - "Por mim tinha terminado logo em 2008, mas recebi uma oferta irrecusável" -, mas foi como se não tivesse jogado. Sucessivas derrotas nas primeiras rondas de quase todos os torneios em que participou, raros momentos do ténis bonito que derrotou Sampras na final do US Open de 2000 (o primeiro dos seus dois Slams), que ajudou a Rússia a conquistar duas vezes a Taça Davis (2002 e 2006), que se traduziu em cinco Masters e sete semanas como número um mundial. Nem na despedida gosta de recordar: "Detesto falar das minhas conquistas. Sim, ganhei esses dois Slams. Foi o que fiz. Toda a gente parece pensar que mudei o mundo. Simplesmente fiz o meu trabalho e recebi uma bonita taça e um bonito cheque."
A frieza demonstrada no adeus herdou-a da infância difícil: "Não é uma história bonita, ser proveniente de uma União Soviética a sair de 70 anos de comunismo. Não havia dinheiro, nem raquetes, nem bolas, foi terrível." Mas um patrocinador viu nele potencial e um investimento seguro. Seguiu-se Valência aos 14 anos, onde treinou com Juan Carlos Ferrero, vários satélites em Portugal, uma ascensão meteórica nos rankings (aos 20 anos, chegou a número um), algumas lesões e um final de 12 anos de poucos altos e muitos baixos. Um regresso ao ténis? "Não. Quero fazer qualquer coisa completamente à margem do ténis, algo que me dê muito dinheiro."
Ela será sempre a irmã mais nova de Marat

Há cinco anos, o diário desportivo L"Équipe lançou um desafio a Marat: entrevistar a irmã Dinara. Desafio aceite, o mais velho dos Safin (o "a" da mana mais nova explica-se pela tradição russa, que distingue os sobrenomes de homens e mulheres) terminou a sessão perguntando "o que pensas de mim?".
A resposta é reveladora da admiração excessiva que se prolonga até hoje. "És o meu Deus. Quando jogas, adoro ver-te. Quando perdes, fico ainda mais triste do que quando perco. Quando estás lesionado, sofro. Quando falas comigo, bebo as tuas palavras. Quando assistes a um jogo meu, fico nas nuvens. Detesto ouvir ou ler algo mau a teu respeito. Para mim, és o jogador mais talentoso e não tenho metade do teu talento."
Cinco anos depois, nada mudou - é a própria Dinara que admite ainda ouvir vozes da bancada a identificarem-na como "a irmã mais nova do Safin". A mesma veneração, a mesma emoção, a mesma síndrome de inferioridade, alimentada durante anos pelo ego de Marat, que nunca se escusou a revelar publicamente a falta de empatia com a irmã, que nunca se mostrou interessado em ver um dos seus jogos, que prefere passar o seu tempo livre em festas com a número dois russa, Svetlana Kuznetsova, a conviver com a "mana" mais nova.
Até este ano. Até Dinara, que chora cada vez que revê o triunfo de Marat no Open da Austrália, ter chegado ao topo da classificação mundial, igualando o feito do seu "ídolo" (são os únicos irmãos na história do ténis a terem ocupado o primeiro lugar nos rankings ATP e WTA), e ser duramente criticada por ser líder sem ter conquistado nenhum Grand Slam. "Deixem-na em paz", repetiu, vezes sem conta aos jornalistas, um protector Marat. "Não tenho tanto orgulho em mim como tenho nela. Ela é mais profissional do que todos os outros jogadores juntos."

Madeira foi quem mais cresceu em termos de PIB

por A-24, em 12.02.10
PS: Antes do buraco das contas públicas em 2011.

Em relação ao ano de 2008, o INE destaca que em termos nominais, o PIB da Madeira cresceu 2,6%. Em 1995, revelam ainda os dados do INE, o rendimento da Madeira estava 11% abaixo da média nacional. Actualmente está 28% acima dessa mesma média.
O maior crescimento registou-se, no entanto, na região Norte, com 2,7%. Já a região de Lisboa cresceu 2,1%, região Centro 2%, no Algarve 1,3%, nos Açores 1,6%, o mesmo crescimento registado no Alentejo. Refira-se, porém, que neste última região verificou-se um decréscimo 0,2%.
Os dados avançados pelo INE revelam também que a região Norte foi a que mais empobreceu nos últimos treze anos. Comparativamente às restantes regiões portuguesas cedeu terreno para o Alentejo, Açores. Actualmente a região Norte é aquela que apresneta o rendimento per capita é o mais baixo de Portugal.
No período em análise, Lisboa, que manteve o estatuto de região mais rica do país, simplesmente marcou passo. Ao longo dos últimos 13 anos Lisboa apenas subiu alguns pontos entre 1998 e 2005. Contudo, em 2008 (último ano para os quais há dados disponíveis e ainda provisórios), Lisboa acabou por regressar ao mesmo patamar de 1995, registando um rendimento 38% acima da média nacional.
O Algarve foi outras das regiões que se destacou pela negativa. De acordo com os dados do INE, entre 1995 e 2008, o Algarve caiu em termos de PIB per capita, tendo mesmo sido ultrapassada pela Madeira. O Algarve ocupa agora a terceira posição do 'ranking' nacional.
O Alentejo, que cresceu mais um ponto percentual, e os Açores, que subiram dez pontos percentuais, viram também as suas posições relativas melhoradas, com PIB per capita. Apesar deste crescimento continuam 6% e 11%, respectivamente, abaixo da média nacional.
Finalmente, e em relação ao Centro, os dados do INE revelam que o PIB desta região permaneceu praticamente inalterada ao longo de todos estes anos. No final do ano passado acusava um PIB per capita 15% abaixo da média nacional e muito longe do crescimento verificado na Madeira.

como os russos viram as eleições legislativas Portuguesas

por A-24, em 09.02.10
O Partido Socialista Português venceu as eleições legislativas, mas, desta vez, sem a maioria absoluta, escreve hoje a imprensa russa.
“O Partido Socialista, força de centro direita que actualmente governa, venceu nas eleições para a Assembleia da República de Portugal, mas não recebeu a maioria absoluta”, escreve Andrei Poliakov, correspondente da agência ITAR-TASS em Lisboa.
Depois de calcular as “perdas sensíveis” do PS em número de votos e assentos, Poliakov considera que o PPD/PSD obteve “praticamente o mesmo resultado das eleições anteriores” e sublinha “o melhor resultado em 25 anos” do CDS/PP, o que, segundo ele, “surpreendeu muitos.
Quanto aos partidos de esquerda, o correspondente da TASS é da opinião de que “ambos, particularmente o “Bloco de Esquerda” teve “melhor participação” do que há quatro anos atrás.
“Ao contrário das eleições de há quatro anos atrás, desta vez, os socialistas, embora tenham vencido, não conseguiram uma maioria absoluta e serão obrigados a formar um governo de coligação”, noticía a agência Ria-Novosti.
O diário governamental russo “Rossiskaia Gazeta chama a atenção para o facto de uma coligação entre o PSD e o PP não ter “a maioria necessária no Parlamento de Portugal”.
Da Rússia (Outubro/2009)

Discriminação contra muçulmanos está a aumentar na Europa

por A-24, em 06.02.10

O voto contra os minaretes na Suíça é só um sinal. Dos palcos políticos à Internet, por toda a Europa emergem manifestações de medo ou desconfiança em relação aos muçulmanos. Há indicações de que a discriminação está a aumentar, dizem especialistas ouvidos pelo PÚBLICO.

Dario Bianchi /Reuters

O que aconteceu na Suíça podia acontecer em qualquer país da Europa.

E um estudo inédito que será apresentado dia 15 em Londres, Muçulmanos na Europa - Um Relatório em 11 Cidades da União Europeia, aponta nesse sentido, recomendando a líderes locais, nacionais e europeus que contrariem a segregação nas escolas, na habitação, na política. O melhor caminho é a mistura. "Cidadãos ou migrantes, recém-chegados ou nativos, os muçulmanos são uma população variada e em crescimento que se apresenta à Europa como um dos seus maiores desafios", lê-se nas conclusões.Para este relatório, levado a cabo pelo Open Society Institute, foram entrevistados 2200 muçulmanos e não muçulmanos entre Janeiro de 2008 e Fevereiro 2009 em Amesterdão, Roterdão, Antuérpia, Berlim, Hamburgo, Copenhaga, Leicester, Waltham Forest-Londres, Marselha, Paris e Estocolmo.O resultado desmente três mitos. Primeiro, que os muçulmanos não se querem integrar. Segundo, que as necessidades dos muçulmanos são diferentes. Terceiro, que os muçulmanos não se envolvem na vida política e cívica. As percentagens dão uma realidade oposta (ver texto nas páginas seguintes).Em síntese, as respostas apontam para "um aumento das experiências de discriminação", diz Nazia Hussain, a directora do projecto. Também parece claro que a preocupação com muçulmanos e minorias étnicas em geral "aumentou nos últimos cinco anos, no público em geral, e nos media, o que conduz a estereótipos".Como judeus nos anos 30?Se os mecanismos da democracia suíça se pudessem repetir noutro país europeu, "teríamos resultados semelhantes", diz Martin Rose, director do projecto A Nossa Europa Comum, para a coexistência de muçulmanos e não muçulmanos na Europa, recentemente lançado pelo British Council. O referendo na Suíça foi "um sinal alarmante" de como "há um sentimento muito mais forte do que esperaríamos, um medo do outro". Rose diz que "preferia não usar a palavra islamofobia, mas é difícil encontrar outra". Uma forma de racismo? "Aquilo a que antes chamámos racismo, mas em que a raça agora é substituída pela religião." 
Além das frentes nacionais que há anos disputam o poder na Europa, os britânicos puseram no parlamento "os quase fascistas" do British National Party. E a bandeira anti-imigrantes, agora concentrada nos muçulmanos, alastra para o centro do campo político. "O problema existe em cada país europeu. Quando os tempos são maus, a competição por habitação social, desemprego e assistência é maior, há um "nós" e um "eles", que agora se tornou muçulmanos e não muçulmanos."Nos anos 30, havia o binómio judeus e não judeus. A proibição dos minaretes pode ecoar as proibições anti-semitas e várias associações de judeus fizeram questão de protestar contra o referendo suíço. É possível comparar? "Por um lado, podemos até pensar que a situação é pior do que nos anos 30, porque se passa em toda a Europa", diz Martin Rose.
"O quadro de dificuldade económica é o mesmo, e surgem bodes expiatórios. Se combinamos crise com ignorância, e com o facto de que há gente que se diz muçulmana a fazer-se explodir, os muçulmanos são um alvo óptimo, quando estamos à procura de alguém para odiar."Há uma diferença essencial. "Na Europa dos anos 30 havia um país a encorajar o racismo, a Alemanha. Agora, os governos europeus estão desesperadamente a tentar impedir a discriminação." Mas se parte da Suíça acordou em choque, foi a outra parte que ganhou. "Uma vitória maciça", sublinha Rose. "Temos de nos preocupar."

A Turquia poderá integrar-se na União Europeia?

por A-24, em 04.02.10
Poderá um país não cristão ser considerado europeu?
A Turquia, em 1964, firmou um acordo de associação com a Comunidade Económica Europeia (CEE), com impacto sobretudo no campo económico. Desde então, recorrentemente, vem à baila o tema da sua integração como membro de pleno direito. Mas esta ideia tem encontrado oposição de sectores influentes, incluindo responsáveis da União Europeia (EU), não apenas de sectores abertamente conotados com o racismo e a extrema direita.
Com efeito, a oposição à integração da Turquia é bastante forte e variada. A mais significativa é sem dúvida a dos sectores tradicionalistas. Um das figuras proeminentes desta oposição tradicionalista é com efeito o recém eleito Presidente do Conselho Europeu, o belga Herman Van Rompuy. Este político democrata cristão, profundamente católico, que ocupou durante um ano o cargo de primeiro ministro do governo do seu país, quando estava ainda nas bancadas da oposição terá afirmado ser impossível a integração da Turquia na União Europeia, por ser um país maioritariamente muçulmano, e a Europa ter uma matriz cristã. E responsáveis turcos dizem que foi a proximidade das suas posições com as do presidente francês Sarkozy e da chanceler alemã Ângela Merkel, incluindo no que respeita à admissão da Turquia, que fez com que apoiassem a sua nomeação para o cargo1.
É sabido que nos sectores mais tradicionalistas da sociedade em geral, mesmo na Europa, são fortes o preconceito e o temor à diferença. Mas há que ir mais fundo a analisar esta questão. A Turquia tem cerca de 780.000 quilómetros quadrados de área, e perto de oitenta milhões de habitantes. É um país extenso e populoso, com um vivo sentimento nacional, cuja força (incluindo a força militar) torna receosos os países vizinhos, nomeadamente os dos Balcãs, durante muito tempo subjugados pelos turcos. Ainda não se completou um século sobre o desmantelamento do Império Otomano, consumado no Tratado de Sèvres (1920), após a derrota na I Guerra Mundial, e sobre o Tratado de Lausana (1923), que reconheceu a independência da Turquia. Mantém-se o conflito com a Grécia, por causa da partilha de Chipre. E outro problema de peso é o da importante minoria curda2, que forma cerca de um quinto da população do país, e periodicamente manifesta tendências autonomistas, chegando à prática de actos de violência, fortemente reprimidos. Só recentemente a Turquia e a Arménia encetaram conversações, no sentido de melhoraram as suas relações, muito afectadas pelos massacres efectuados antes e durante a I Guerra Mundial, e continuados depois por extremistas turcos, que terão aniquilado grande parte da população arménia que vivia sob o Império Otomano.
Mas a Turquia conheceu uma modernização notável, sob o governo de Mustafa Kemal Ataturk Este foi eleito presidente da república em 1923, e iniciou um processo de separação da religião e do estado (o islamismo deixou de ser religião de estado em 1928), de generalização da instrução e do que se pode chamar, para simplificar, de uma ocidentalização dos costumes. As mulheres tiveram direito ao voto em 1930 (antes de Portugal) e foi introduzido o alfabeto latino, em vez do árabe. Depois da Segunda Guerra Mundial, a Turquia integrou a NATO, e durante a guerra fria alinhou com o lado ocidental. Subsistem é verdade grandes diferenças entre as zonas urbanas rurais, há que assinalar, a agricultura tem um grande peso na economia, ocupando ainda há pouco tempo metade da população activa, e a emigração é muito grande, sobretudo para a Europa. A população é jovem e tem uma vitalidade demográfica considerável. Ultimamente o ressurgimento do islamismo também tem afectado o país.
Mas a população turca parece maioritariamente favorável à aproximação com a Europa. Os sucessivos governos têm-se esforçado por reforçar os laços com a União Europeia3. A adesão da Turquia será sem dúvida um teste, mas que vale a pena levar em frente. Fala-se muito de uma Europa envelhecida, pouco estimulada, com pouca coragem para lutar pelos seus valores e para não se deixar dominar pelas outras potências, nos mais variados campos. Que melhor teste do que a integração de uma população mais jovem, numerosa, com características diferentes daquelas que tradicionalmente se atribuem aos europeus? Estes terão assim uma oportunidade única de demonstrar que a tolerância, o gosto pela liberdade e o respeito pelos direitos de todos, princípios que procuraram transmitir ao resto do mundo (com grandes contradições, é bom não esquecer), suportam perfeitamente uma aproximação entre povos diferentes, mesmo quando essa aproximação é numa escala tão grande. E a integração da Turquia na Europa, não é ousado prever, granjeará mais respeito e admiração por parte de outros povos, do que a participação na NATO, ou em aventuras como o ataque ao Iraque ou em guerras como a do Afeganistão.
1 Ver The Guardian, de 21 de Novenbro de 2009.
2 Os curdos são um povo cuja origem é milenária. Os seus antepassados foram povos que habitavam as cadeias montanhosas a norte e nordeste da Mesopotâmia, nomeadamente os medos. Os curdos hoje em dia são cerca de 40 milhões, e possuem língua e cultura próprias. São maioritariamente islâmicos. Vivem sobretudo na Turquia e no Iraque (onde têm preponderância no norte do país), mas também têm presença importante na Síria e no Irão. Contingentes menores habitam outros países da região. Muitos curdos emigraram para a Europa e também para os EUA. Em 1978 fundaram o Partido dos Trabalhadores Curdos (PKK), responsável por várias acções violentas. O seu chefe Ocalan encontra-se detido na Turquia.
3 Vejam-se no Público de 2 de Fevereiro as declarações do primeiro ministro Erdogan, quando do lançamento da estação de televisão Euronews em turco, em Istambul.
João Machado, membro da Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira pelo Bloco de Esquerda
Público