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A-24

Índia: Barragens versus religião

por A-24, em 23.06.12
Eu não sei se as mais de 50 barragens previstas pelo governo indiano para o rio Ganges são, ou não, um bom projecto em termos globais e há relatórios de especialistas que apontam no sentido de ser aconselhável desistir de uma parte delas por razões ambientais. 
Algumas barragens da Índia
A polémica está lançada, há quem acuse os Estados Unidos de fomentarem esta contestação porque a construção das centrais eléctricas provocará um forte decréscimo da venda de urânio à Índia e o governo indiano vem agora dizer que está disposto a reduzir em 50% a produção de energia prevista, de modo a salvaguardar a sobrevivência da vida aquática e o débito do rio. 
Mas não é só, nem sobretudo, este tipo de contestação que está em curso, mas sim a de carácter religioso: centenas de sadhus insurgem-se, indignados, contra o «assassínio da mãe Ganges», afirmam que as barragens serão construídas sobre os seus cadáveres e que podem misturar o seu sangue com o cimento. 
Todos os anos, há milhões de hindus que vão em peregrinação a locais que acreditam terem a função de purificar a alma, dissolver os pecados e garantir uma vida melhor depois da morte. Banham-se e bebem a água de um dos dez rios mais poluídos do mundo, não apenas por causa de resíduos industriais, mas principalmente por lançamento de esgotos não tratados. São queimados em crematórios instalados nas margens do rio e neste são lançadas as cinzas. 
Já me cruzei com o Ganges mais de uma vez. Mas nunca como em Varanasi, que guardo como símbolo de horror, e onde não voltaria nem que me pagassem fortunas. 
Numa cidade enorme e miserável, ao nascer do dia vêem-se velhos ex-leprosos estropiados a pedirem esmola, banhos de multidões na tal água indescritível, crematórios em pleno funcionamento (poupo a descrição dos cheiros…), eventualmente corpos de crianças mortas a boiarem – as crianças não são queimadas, mas sim atiradas ao rio sem que, por vezes, a pedra ao pescoço, que é suposto afundá-las, tenha sido devidamente colocada. Eu vi uma que deveria ter seis meses (está nesta foto). 
Não me falem de crenças religiosas e de diferenças culturais dignas de respeito porque não aceito, pura e simplesmente. Tudo tem limites. 

Que venham as barragens!

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